quarta-feira, 1 de abril de 2009

PAPO DE PAPAS, NA LÍNGUA - Beto Petry premiado pela Nestlé

PAPO DE PAPAS, NA LÍNGUA.

Eu lendo. O que é isso? A saúde da alma ocupa médicos? Eu deveria acho montar hospícios! Vem aquele homem pulando da página e me fala: cálculos não são precisos! Onde se viu meter todos os loucos juntos na casa? O único louco aqui é você, eu grito. Ele responde calma, o louco não sou eu, mas o Joaquim Maria pai amado dos livros em minha frente, como no poema de Mário velhos parentes a tirar a chapa para comer.
Acho que seria bom dormir, que dias! Internam-me, mas nesse mundo hospício quem agüentaria ser normal? Ah, seu poeta! O sono é meu, oras, TV e apresentadores dão sono. Melhor ler ou duplas sertanejas? Personagens vêm ter comigo. Machado pássaro, batia asas e ainda bate. Respondo? Eles são que tipo? Criança, acordo ao canto do passarinho.
Tomar chimarrão e cuspir verde no chão. Um pássaro? O ciúme satisfaz-me, poema. Que conto! Canto! "Dizem que sou louco..." em mim, canções. Contorço em lirismo a gozar o amor!
Descreio dos homens, dos escritores, dos... Bispo vem lá de Jesu Ouro falar que exagero. Não e nunca! Viraria prefeito, perfeito D. Evarista! Eu, bom homem na política dos pecados do mundo? "Mamãe não quero ser prefeito..." claro, Raul! Papo do Papa pop... Pra falar a verdade, nem cem Papas. Papar? Papa só essa: moça bonita, daquelas na rua a atrair olhos. Venancinha!!
Amor à vista? Dê prazo! Machado louco! Ele a criou, qual louco criaria lindo assim? Mas Van Gogh… Fiquem quietos! Deus meu, contos! O alienista vem intrometendo-se, louco é quem tem idéia; não quem está dentro. Na teoria do medalhão, um medalhão completo não tem idade. Há infinitas carreiras diante de mim. Mal entendo. Já vem D. Paula desesperada: todos separam! Não mais separação. Escorre-me o nariz: imagens de despedidas derramadas... Mamãe, papai, vocês tiveram-me; e eu? Lennon en-canta Mother ainda, lá de suas cinzas. Dança, caos atônito!
Quando tudo desaparece, acalmo. Cantigas loucas sem fim, o céu perto, arco-íris, poesia-luz... Homens célebres, sinfonias: Beethoven, Mozart... pianos, anos! Parem de linguar, as idéias confundir! Seus ambíguos! Conto: primavera em poema é melhor, e pessoa amando.
Pergunto-lhes: estão preparados? Respondem sim. Solto o verbo: ouçam contos e poesias, os casamentos vão mal, os casais sem versos não se amam já mais, o dinheiro prevalece, a juventude prostituída decai, mortes de doenças, abortos... As pessoas tiram-se a vida como eletrodomésticos da tomada. Religiões 10%, sem Deus! Vergonha de quê? Desemprego, fome, carência. Retrucam-me: nem Deus tem o direito de tirar vidas. É mentira! Poupe-nos! Pudesse eu sumia. Tristeza! Vocês estão seguros, sem riscos de tiros na rua, nas favelas, no Iraque, MST...
Não levamos tiros? Temos finais trágicos. Loucos escritores a realidade descontam em nós também. Quem vive sofre mais, na real idade mal dita! Tudo e todo mundo passa certas situações, até a lua no céu só, em cantiga de roda a chorar. Pessoas nos lêem; molham-nos lágrimas. Viveram algo parecido ou pensam que são felizes, e tocados pela poesia de vida vêem: “Não há remédio às dores da alma”. Na razão clássica das faculdades, viva o sonho sem insânia!
Acordem! A corda! Acordemos, mundo de ignorância! Realidade dura; coração mole! Não se vive sem os sonhos dos outros também, cada um leve a vida como achar, na moral-mor. Neste mundo as pessoas querem ser muito “iguaizinhas”... Ah, eu adoro a diferença de ser feliz!
Felicidade, quem vai nos separar? Quem mais se interessa por nós? Anos em prateleiras, bibliotecas. Nos pegam pela capa e nome, muitos nem querem saber que somos palavralma.
Ai que sono, aí é de noite? Respondem não. Sonho? Visão? Poesia de romances? Louco falo com verso? Rimo bem, meu, bem! Jaz zen, paz faz querer bem... Conto um, apareça! Dois? Medalhão, dialogar com papas na...? Bate-papo e papa. Pá lavras na terra: linguagens. Verdade ou não, alimento do espírito, a Palavra! Nós textos, coração! Sorrir real mente mesmo sem cem papas. Einstein, que língua! Rio, ... , ria!!!

(Texto classificado entre os 50 MELHORES do Brasil, por BETO PETRY & alunos da 1a série D, tarde, C.E.E.C de MATELÃNDIA/PR – Viagem Nestlé Pela Literatura – texto semifinalista entre mais de 13.000 concorrentes – ANO 2005. )

MANIFESTO À BURGUESIA - Beto Petry em defesa do Planeta

MANIFESTO À BURGUESIA


A burguesia está sim acabando com o planeta
A burguesia bota enfim a vida mais em risco
A burguesia quer também ainda mais dinheiro
Mas a burguesia já detém todo o dinheiro que tem
(onde ela vai encontrar mais dinheiro então?).

Ela expele fumaça e intoxica
Ela esquenta a atmosfera e a cabeça
Ela derrete os pólos com seu clima
Em seus tão estranhos clímax!
Ela libera icebergs para Titanics
Ela levanta os mares em fúria
Ela inunda mundos continentes
Ela afoga cidades inteiras
Ela incendeia florestas e gente
Ela enche o mar de lixo e óleo
Ela infecta praias de xixi e dejetos

A burguesia já tem tudo o que quer
Mas a sua canção é “I can’t get no... satisfaction”,
De “Rolling Stones” na onda do marketing
E ela não é Rock, nada rock, ela é lucro,
E quer mais, muito, além também...
Nem ela sabe aonde quer chegar nem
Ou o que mais quer indo na sede insaciável
De todo o tanto seu querer

Ela quer mais sexo?
Ela tem todo o sexo que quer
E revistas com falos e “falas” bem molhadas
Ela quer mais drogas?
Ela tem todas as drogas que quiser, e farmácias.
Ela quer mais gasolina?
Ela tem muita gasolina, e “petrolinas”.
Que mais quer na sua boquinha pintada
Essa gulosa menina?

Burguesia, burguesia perfumada,
Cabelos preparados, arranjos coloridos,
Hora marcada, sapatos engraxados!
Eu sei bem dos burgos de onde você veio
Para querer ser alguém no mundo e crescer na vida
(Antes ainda de Gutemberg e a “mídia animal” ser parida).

Agora estou com pedras, chega ó imunda que inunda!
Alto lá, burguesia de conservantes, trans e azia!
Confesse? – Alto! Tô de funda!
Sempre na Tela, né elegante pilantra?
E você nunca confessa!
Contigo no poder e o mundo em salobra fria
Afunda!

Burgos, anúncios, negócios e expurgos: ó burguesia!
Chegou a hora de se redimir, códigos rever!
A barra aliviar...
Ou a civilização poderá sucumbir de vez, desta vez.
E tudo virar, queimar, oxidar, “dar pau”,
chafurdar@elegantemente.com, e eu também então, snif buá! – Rrruuah!
Como você!!!!

sexta-feira, 27 de março de 2009

TRÊS OITO BEIJOS (D AMOR) - Letra Inédita de BETO PETRY, CD impiedoso amor

TRÊS OITO BEIJOS (D AMOR)
deixar de amar jamais


Eu canto a você, a canção mais linda!
Acordes de sonhos palavras
Linguagem de flor em batom
Orquídeas de brincos vestidas de luz

Eu canto a você, rimas em tons de blues
Versos doces perfumes
Cristais brilhosos azuis
Emoção cor de rosa feliz!

Saudades ao vento e eu tento não ligar!
Vagos ecos à noite e o tempo a dançar rolar!
No prazer de vir ver o calor ouros do sol
Ter você é o bem que o meu dia apraz

Eu beijo você TRÊS OITO vezes, amor!
Sem parar sem jamais
O querer-te aparar
E a cor do céu meu no meu, seu olhar...

Acordo o mar para lhe ver passar assim
A lhe adornar na fantasia de amar enfim
Sempre só a lhe dizer sim, sim, sim, sim...
Sem querer jamais deixar de amar assim, sim, sim, sim
Sem fim...

Na onda azul da imensidão de ser lhe ver
A navegar, a flutuar, a voar alar!!!
Amar pra sempre e sem jamais deixar de amar
A cantar, a sorrir, a lhe tocar!!!!
Ah, amar!
Ah, mar: amar você, sentir você, você sonhar!!!



BETO PETRY – em 16/08/2006

terça-feira, 24 de março de 2009

DESVAIRADA MENTE CONTEMPORÂNEA - BETO PETRY - inédito - Premiado em CONCURSO na EUROPA TÃO SONHADA

DESVAIRADA MENTE CONTEMPORÂNEA

BY BETO PETRY


(desvario um)

Não cantarei apenas as minhas dores – que são tantas (oh frágil que sou-estou!),
Mas também outras, idem alegrias, pesadelos, purezas & orgias.
Imagine-se o mesmo tratando-se de cores em flores;
Tremule a “bandeirona” da novidade imprevisível con(s)ciência, emoção e Cia.
A outrinha, do oculto mercenário ideal, com antigas verde-amarelas digitais
Já jaz na grama (sob o azul borrado anil) Fora com o banal!
O espírito deve requerer legítimas coerências-ocorrências agora no papel
Neste tempo global sem ideologia, a não ser a dos miau-miaus a faturar.
...E é por isso bicho Leminski. E é por isso bicho Pessoa
Afinal, “para quê é que há gente no mundo?”.
Ajudem-me a enversar poemas com poesia dando ênfase maior à criação
Que tanto todos apenas hoje apregoam e na média-Mídia bem pouco fazem mostram,
Além dos acordos acorde$-Cifrõe$$$$$$$$$$$$$$$$$
Desde a Academia à televisão da urbacidade selvagem, cabresto das multidões.
Berro grito: – Levantem-se do túmulo, ó poetas vivos – mortos!
Nesta insaciável sociedade insociável, de esquecidos talentos de todo,
E escreva-se o que se queira, para que se leia e dê morte de inveja na pontícula da língua!
... Asas à imaginação, sentimento, sonho e beleza! Mais levedura e menos leveza nisso: – Poéticos tragos! A liberdade absoluta e o requinte que reinem pelo menos na arte
Já que todos somos naturalmente escravos da organização
Quer para a vida ou para a morte, mui além de todo e qualquer suspeito Vento Norte.

(desvario dois)

Marketing: etiquetas, marcas, ofertas! Editoras alheias, revistas&jornais “superdesinteressados”
Poderes e empresas, prefas – feiras, mega-bananas-shows.
Privilégios, publicidade, vendagens: cartas - ídolos marcados!
Tudo isso é escandaloso (toda a inspiração, desse jeito indo, vai parar aonde?).
– Levantem-se do túmulo, poetas mortos!
S. O. S.!!! Venham do nadalém socorrer (“Ei, Drummond, só pedras no caminho!”)
Pelo menos um “bíblio “da hora que preste, Cadê?
... Vamos romper com tudo isso na moral! Walt Whitman venha transar com o Bilac,
Na metáfora futurista Matrix, entre computadores agora. Quero diante do nariz
Aquele orgasmo verbal (ou mesmo que seja oral) Boca a boca febril pra liricar
(Delírios de Alves Dias Azevedo: noites tabernais para gozar!)
Um hipérbato parnasiano atravessado no reto das coisas, ah! Qua quááááá!
E alguém gozando zuumvlumm sinestesicamente... doces cores sensações simbolistas
Que venha! Se for para fazer com arte eu em essência me apronto
Deixem que eu abstraio e programo: – Dá-me o diskete!
(E é só enfiar sem vírus na boca aberta: “driver” cultural para o povo!)
Trocadilhos quentes na língua em sussurros, para cuspir fora ou dentro,
Tanto faz, o melácteo pólen de uma nova relação
Amor sem fim! Embora sempre em seu clipe final.
... Entre musicalidades, cheiros, cores, abismos...
Absurdos reais na linguagem de perfumes saborosa (E por tudo o mais saberosa)
Incluindo mensagens-visagens-filosofagens-versagens
Céus e terras, espíritos e corpos, clímax desvairados e chega!
(Tudinho em nova e bela anticomercial postagem). Desentupir-varrer artérias!
Blém, plim, ... plim, plim, blémmmmm!!!! Páscoas sem Ovos e Natais sem Noéis trans!

(desvario três)

Desde os anos 2000 ao 3000, ou ainda mais no virtual dos HDs
Poemas quase elétricos, mas da alma, porém (Vamos clicar sem dó!),
E nunca somente pra vender, o que seria barato demais
Convoco os absurdos concretos para retratarem o abstrato
Num realismo absoluto evidente, “fantástica-mente”, de tremer!
Pelo menos, já que pouco há de novo para se ler-ouvir e viajar-ver
No expresso da atualidade escrota impressa indecente: Pílula de adormecer!
... E seja feita a nossa sagrada vontade na escritura
Hora de abstrair, horas de medir ou mesmo mentir a orar
Mas sempre de dizer e ser o que for na tintura tessitura liter ata que a vida atura
(Vocabulário em manejo inteligente-sentido que o existir apura)
Litera séria, cria e atividade, escrita bela: literatura!!!!!! Para ser viventada e vivida
Ououu, sem outras formas: versinventar tudo com vergonha e apuro!
E fora a Besta antiarte dos mercados! Sim! (Na estética de um beijo na boca,
palavra a palavra, em arrepios da sílaba, na própria saliva e nuca). Isso fundo, ou nada!
... Ascendência literal, dourada arca da palavrartetura
Literaturar: abaixo lavagem cerebral e formação política para nefasto controle!
Não!!! – com as mãos na cabeça – (Não como un$ aí, ai de mim, com quem agora mexo em “nobre horário honorário”?) – Zé do Patrocínio, adeus!
Altos faturamentos – gravatas falantes – em cima da simples fácil ignorância
(E sempre goela abaixo cada vez mais desinformantes literaltices
Desde vilas, bairros e escolas – diretamente via ação de “pedabobas” chopins)
Tudo pela plena e conveniente dominação dos “alguns”
Mas, sem a cédula-força dos contrataços da receita pró-anúncios,
(Do suor tributo da torcida massa despojada pagante por detrás)
E quem ia querer ainda ver esdrúxulos apresentadores do canal
Com seus astros “artistificados” da desarte? Triste nacional desastre em cartaz!

(desvario quatro)

Sem outras Reformas Ortodoxas, e nem terços de Contra-Reformas também nem
Para se ter uma “bela” noção da bruta dominação
E dos abusos eternos do poder conchavado com cleros e Deus
Blá, blá, blé; blá, blá bl’amém! Que seja contada a contradição disso tudo – Quem vem?
Qualé???????
(Pauta do dia: a falência dos Sistemas num todo: rombos permanentes)
Apesar da esperança de justiça sempre e a certeza natural dos sonhos de toda a gente
... Chantageados pelas igrejas, escravizados em sociedade, rechaçados,
A vida toda dizimados, “seguem imos” todos enfim amordaçados... e ainda sem amor.
Quem se atreverá a mostrar o sonho-realidade?
Alguém rabiscará as inerências fundas e rasas de nossas almas
Condenadas ao nada e sempre afoitas de tudo
Como se fossem espíritos fulgentes sedentos no mundo?
... Ah, calma criança! Alguém abrirá o Evangelho e é só crer para ver no nunca mais “despois”.
(E mesmo em revolta prefiro até bíblias podres nos sovacos
ao lixo da antiarte ovacionada no ar, se quer saber!)
Lulu Luluia Senhor! Novos Evangélicos em convertido esplendor!
O resto é apenas o mundo, luxúria, sexo e dinheiro para quê?
(Deixe para os outros, eh eh!) Depois será servido, de graça, um folhetim de auto-ajuda a você.
Encontro de orações por três dias para esquecer-espairecer. Um “psicô” resolve por cem
Ou planos de saúde também. Terapeutas, bruxos, religiosos-santos: auto-estima!
Novas ciências metafísicas otimistas modernas: – Fui mal, passe bem!

(desvario cinco)

E eu aqui vendo isso e aquilo ainda (e +, como se Anjos já antes me dissessem... mães Dinás!)
Na antítese busco sem mais penas no maior peso a tese para a mais leve pena
Sem que se queira agora tornar a ser barroco apenas
E nem só ser o inverso, mas no verso o “in” e o “u” por trás juntos: universos!
... Tudo prol criar somente: liberdade absoluta reinante (Mesmo sem originais românticas),
Rimando até algo com Dante, inferno e sofrimento,
E não ficar no isolamento (Por “impressos” preconceitos)
Como esquecido na taberna Pessoa, Sousândrade, ou mesmo Álvares em seu tempo ficou,
(qual o pobre Papa Seixas do Rock, ou Camões do mar); Van Gogh, o gênio pintor a se balear
Ao ser e sentir-se gigante completo, mas só muito só, em seu toque artístico libertador.
... Nada é eterno e tudo o é (E é muito complicado)
Acontece que nada e tudo, está provado, ambos não andam iguais, e nem de terno,
Sem nem serem assim às vezes por sua vez tão ternos
São diferentes demais para serem considerados também
Assim iguais como podem por aí dizer filósofos - padres
E de tão diferentes que são passam a ser até parecidos
Por último, pelo que são, e não pelo que dizem ou fazem, ou não?
Valha-nos Shakespeare: “ tudo é muito além que filosofias vãs”
Nada é tudo e tudo é também nada. Que salada!
Corvos, amigo Poe, caro Edgar, vêm nos umbrais dizer: – Vida, “never more!”
Se soubéssemos lá da morte, quem ia querer cá viver?
Veja, mestre Baudelaire de Paris, você que sabe e traduz tudo de cor
Que carniça não se pode fazer com o saber ou conceitos embasados só de teórico teor?
E tudo, mesmo agora ainda, sempre “era uma vez!”.
... Sigo inexistente na ilusão do eu, que já não me convence (ainda mais em tempos de Coelhos=Zezés=Leonardos=Nhambus da cidade&outros “mala mados” literatiços empossados)
Ah, por favor, podem fechar a livraria. Alguém desligue o rádio! A Telinha Q fique falando a toa (depressa, antes que ela desencoraje nossas mentes e para o consumismo nos arregimente!).
Gorjeiem pássaros soltos nas antenas galhos de cidades e campos dourados.
Pelo menos paz e boa voajem, já que nem mais há o que a gente sintonize e encoraje:
Flapt flapt...zzzzzzzzzzzzzzzzz!!! (Em asas de libertinagens.

(Desvario seis)

Oh caros meus quase que Irmãos Andrade, no meio de tanta lavagem!
Eu jamais esqueceria da Augusta fachada de vocês (Século depois até falta hoje me fazem!).
Obrigada mente pelas penas e pernas da modernidade! Deus lhes pague por este espelho.
Isso tudo eu de coração agradeço com’um beato ou beata
(no “Sertão Canudos” de Euclides antes do Floriano holocausto).
Sim, sou “persona” imensamente grata!
Neste meu desvario poético anônimo, necessário embora, e aqui dentro Imprescindível nato,
No rascunho desta minha continuidade imprevista, mas escrita... (E o imprevisto é o que sabe).
... Coisa é certa: as horas passam na incultura, em meio a toda a estupidez boquiaberta Enlatada ou declarada (Global é o cerco: civil ditadura – covil de imposturas).
Vida, país e mundo se esfacelam em baixas alturas. (E aqui já foi até pior em éfesHC Leilões!).
Os encantos das gentes despojadas não passam de anedotas
Ou violetas baratas sem bilhetes com versos, murchas e mortas
E admitam ou não os culpados – do caótico mau “imprenságio”,
(Gentes de bem pouco achado e que nunca mais serão achados)
Onde está a poesia? A poesia despoetou. Onde está a música? A música desmusicou
Onde está a prosa? A prosa desliterou “E agora José”, o que fazer, se a criatividade incriou
(ou encruou?)... E é por isso, caros Andrade, ajudem-me a peneirar nossa escrita!
Vamos! Enviem-me do Céu Vazio inspiração e força ao combate. Ah, estou fraco!
Nesta guerra contra a Mídia enganosa.
Para o bem de descobertas, da arte e do resto! (Ou pelo menos do rosto?).

(desvario sete)

Aiou! Não vagar é preciso, pois viver é preciso, e sentir, crer-criar é precioso, pelo mal ou bem!
Propostas em movimento: não só uma Semana Contemporânea: mas mobilização vida a vida!
Engggrrrrrrrrrenagens-máquinas-serviços-jornais-canais-satélites – Olho neles!
E todos os demais descendentes de Gutemberg. Repórteres a postos! Um, dois!
... Máquinas de xerox, ofsetes, flash-fotos! Internet das gerações, filmagens - clipes – cópias!
De hoje em diante, definitivo basta à cultura de massa! Hora e vez da gentalha aprender bem
Para crescer também!
Marcar passo, em frente: definitivamente, desmarchar!!! Upauolá! Por tudo ou nada,
Urgem novas medidas! Não geral à mera divulgação, à deturpação e à escamoteação!
Para a imprensa ser redimida pelos seus estragos até hoje
Séculos e séculos de quarentena, com cultura de primeira! Nem que tenha que ir aos museus!
... Todos agora comigo: viva a autenticidade! Identidade cultural na mão!
Fora alguns da Academia Brasileira: desdiplomados tarde, mas no ato! (Tenho Q dizer quem?)
Desvairadamente, como isso é lindo! Imagine de fato?
... Vamos juntos, poetas novos velhos vivos e mortos! Narradores-dramaturgos... versáteis.
Quero aplausos nas filas. Em frente! Cantos afinados sem dublagem no Programa!
Músicas com letras no rádio, locutores cultos in-formados: – Pra rua os desinformados!
No teatro, suspiros fundos: dramáticas rosas clássicas, e das ruas, atiradas do palco
Bocas puras risonhas escarlates, belas musas putas virgens do dom + ousado (não “lousado”).
Liricamente, para beijar e tirar todo o batom... antes que o meu nosso todo o tempo se finde.
Na taça: bálsamos verdadeiros às denúncias épicas terríveis cotidianas
Revelações completas sentidas desta vida acelerada (e celerada), e vire-se a página policial!
Desejos cumpridos, sem mais amor com preservativos
... Art’riunfante, todos à pena sem pena! Vida nova na largada!
Abaixo a “nheca gloriosa” dos “artistas” promovidos! Almas nuas desvestidas, de rigor trajadas! Ah, assim bem! Qual Andrades&amigos quiseram uma vez:
– Vivi va vi viva em múltipla única ecoante voz – Vivavoooozzzz! Chuá chhhhuuuaá a ulular! Rio – Brasil, impostores e “impastores”, em debandada! Rrrrooda jaz! Ascendam-se coragens!
Eixo-Mundo-Oceano-Foz: viva a vida (a)present(e)ada nos quilates da mais vivaz linguagem!


(este poema futurista vai para todas as mentes esclarecidas do mundo, as outras não entenderão nada. Grande abraço do BETO PETRY)

segunda-feira, 23 de março de 2009

BORDADOS DA ALMA - Letra inédita - CD IMPIEDODO AMOR, de BETO PETRY

BORDADOS D’ALMA

Harmonia única: G, D7, C, D#º



Você pode me dizer
Eu lhe dou mais que o meu corpo,
Pode vir-me a sussurrar que entre nós há algo irreal
Pode me falar: lhe gosto sim, com ou sem rosas!
Que é meu o mel de seus desejos,
E é por amar-me demais!

Pois digo-lhe também: – Sinto, ah sim, somos felizes!
Mas é enquanto, Oh CÉUS, a nós
Lumiar o SOL de um sonho lindo!

Olhos meus olhos, de viés, haja emoção!
Casar poema e flor, coser bordados corações!
Olhos meus olhos, fios-cor, mãos de cetim!
Bordando a alma à LUZ sentir G, D7, C, D#º
Um BIG-BANG D amor sem fim!

FIAR na vida a rir! A gente a sós, brindar!
Febris só de beijar! Em laços doces ir!

Além dos VIRTUAIS! Tão ternos a fulgir!
Gemer a se afagar! Nus LOVE a nos ungir!

De incrível níveo encantador sorriso, vem!
De malas feitas chamo vindo, ó rapte-me!
Das dimensões boçais do nada, leve-me!
Olhos nos olhos venha a mim, eleve-me!

É o sal da vida amar e então seguir na paz!
Dos chãos da solidão se há chama vamos ascender
O mundo é um vôo no azul a quem souber alar!
Que SER é bordar pôr dentro um encanto a mais! G, D7, C, D#º

Solo: G, D7, C, D#º

BETO PETRY

Em minha casa, só em 22 – 02 – 2007. E agora tenho que gostar + de futebol do que dela para não morrer de sofrer. Bandida!!!!! Bam bam bam bam bam, bam bam bandida!

DIA D FLOR - letra inédita - CD IMPIEDOSO AMOR - BETO PETRY

DIA D FLOR

(Beto Petry)

Quando você estiver comigo
Eu vou ver o sol
Todo dia, a noite toda, cada segundo
Quando você estiver comigo
Eu vou tocar a luz
Num vôo todo vou incandescer
Aquecer a minha alma trêmula e gelada
Da tua ausência
E da falta que só você me faz
Todo dia, a noite toda,
Cada segundo!

Quando você estiver comigo
A ilusão de Deus de ser feliz
Vai tomar assim
Vai tomar conta de mim!

E vamos ver o sol
Me chama
Que a chama
Faz a noite
Em luz sorrir
E o dia D
Em flor luzir!

Quando você estiver comigo
Eu vou ver o sol
Todo dia, a noite toda, cada segundo
Quando você estiver comigo
A ilusão de Deus de ser feliz
Vai tomar assim
Vai tomar conta de mim!

E vamos ver o sol
Me chama
Que a chama
Faz a noite
Em luz sorrir
E o dia D
Em flor luzir!

ENCANTO DE AMOR - Letra de BETO PETRY inédita, CD IMPIEDOSO AMOR

ENCANTO DE AMOR
(BETO PETRY) INT: D7+(2x), A (2x), A7+, F*m, Em7, A7, A7#*, (D+)
D7+ A A7+ F*m Em7

Amor da minha vida
Alguém já disse tão bem
Mas amor de mim na minha vida
Eu vou repetir meu bem

Você é o meu destino
O Paul Anka já dizia
Mas você é meu desatino
Não sei se você sabia

Eu e você em nus lençóis
Sedas d’inesquecível amor
Tanto e ardentes tão demais!
Que ao morrer esse amor
Já ele nem vai / Já ele nem vai
Nem vai morrer mais!

Mais detalhes de nós dois
Rei Roberto já cantou
E de nós tantos detalhes
Ontem, hoje e depois...

Em todo o nosso caminho
Tanta coisa a cantar
E é na flor, céu de você,
Aonde eu vou me encantar

Eu e você em nus lençóis
Sedas d'inesquecível amor!
(...)

quarta-feira, 18 de março de 2009

SOL CATARATAS - Poesia - BETO PETRY - Segundo Lugar - PRÊMIO CATARATAS 1998

SOL CATARATAS
BETO PETRY

O céu pincelou e o belo se deu
O amor de Naipi a se enfeitar
Bordados nem tintas
Telas de Deus

Show verdazul e o toque das águas
Cataratas do Iguaçu

Bela esplêndida coisa mais linda do mundo
Verso do Cone Sul
Bela clássica coisa mais linda do mundo
Jóia do Cone Sul
Viva a divina coisa mais linda do mundo
Luxo do Cone Sul
Encanto iguaçu

É o sol ir ver
E é o sol ver posar
Cataratas ao sol
Arte ao vivo
Postal:

Garganta do Diabo
Arco - Íris Mirante
Passarela Fotos Lazer Cinco Estrelas
Santos Dumont e o Parque do Iguaçu
Indios Saltos Neblina
Cabeza de Vaca - S A N T A
M A R I A !

RECORDAÇÃO VIVA - BETO PETRY - Conto - Sexto Lugar - PRÊMIO CATARATAS de 1998

RECORDAÇÃO VIVA

Beto Petry


Eu aqui hoje, antes ainda de ficar mais velho ainda. Aqui sem nem eu e nem quase mais nada. Anormal, um tremendo animal diante de eu mesmo. Eu aqui, brutamontes onde me espelho vendo a silhueta do universo atra¬vés dos meus olhos.
Aqui eu, uma autenticidade já sistematizada e distorcida, e nem sequer compreendida ou discutida na comunidade com alguma chancezinha de não ser superada ou vencida, sem nem mesmo lutar. Eu aqui e nada mais além do grande sufoco ou alívio, nem sei mais o que é, de estar na para¬da.
Eu, um ser sem dúvida quase especial, pelo menos, senão por que a mesquinharia me notaria(do jeito que me notou)desde as fraldas? Sem nem me dar tempo de mamar direito na velha teta, não tão velha na época, da minha mãe?
Era uma vez o sossego da criança quando viram-me aquela vez no colo do meu pai, numa “festa de Deus":
- Ah que olhos azuis! Que bebê saudável!
- Que vontade de morder a bochecha dele, meu Deus!
E lá me morderam e me beijaram e logo me passaram um resfriado. Logo uma pneumonia preocupou bastante minha manhe mãe. Minhas irmãs cho¬ravam porque eu ia morrer. Tive pena, acho que, e não morri. Na segunda, aos quatro anos, também não morri, com pena acho da minha mãe manhe.
Eram umas injeções enormes para o meu bum-bum inocente de cheirosíssimos puns. A última seria mesmo desnecessária e eu esperneei; e lembro bem que não aceitei ir de carroça pra cidade. Depois me arrependi de ter saído correndo e feito aquela desobediência ao meu pai e às minhas irmãs, que deixaram de capinar para me levar.
Depois vieram as feridas nas pernas, nas costas, por todo o meu então corpo bonito. Seriam os mosquitos? Ah!, foi um tempo difícil. Só que eu não poderia morrer, porque aquilo não matava; só judiava. Ah, mãe manhe!
Cinco anos e já sem feridas. Que medo do coaxar dos sapos! Que medo da noite! Meu choro e meus gritos entravam no bosque na boca da noite daqueles dias chuvosos; e devem estar lá até hoje:
- Ai, não me abandone mãe manhe!
Pesadelos de criança e o sonho debatendo-se na manhã seguinte na realidade. Havia também delírios de febres e nem termômetro. Um dia, o cachorro, sendo espiado através da janela da cozinha, se transformou numa Lua igual à lua.
Era o "javali" vira-lata dentro do meu estado febril e seqüelas até hoje, creio, no meu cérebro.
A apendicite velo bem no tempo em que lá em casa eles chamavam “apênis”. Estourou em dois dias, entre vômitos e olhos assustados de todos. Doía, doía, e um curandeiro hoje morto graças a deus receitou..........................um negócio. Ah, lembrei! “Cristé” eles chamavam, mas era clister. Seria intestino, segundo o velhote. Ora, é o tanto que "apênis" precisa pra estourar.
Bum!
E o velhote:
- É o cristé.
E eu lá cagando, com meu pintotinho que nem um passarinho encolhido, que nem um pãozinho branco, sentado no pinico do quarto da minha irmã do meio e da mais novinha. Alguém, acho minha mãe, enfiava o “cristé” lá atrás de mim. Uma lavagem intestinal sem dúvida sentimental.
Bum!
E o velhote:
- Mais cristé.
E a minha morte espiando minha dor aguda por debaixo da fresta. Eu era um anjo e ia morrer no silêncio da minha inocência. Eu era bem gordinho, fofura, diziam; e ia morrer com meus olhinhos azuis e os meus medos de sapos à noite. Se iria para uma tumba o meu sonho de criança, que era ser alegre e livre; e correr com meus Irmãos (éramos em dez ao todo) no gramado das pastagens. Claro que sem as meninas. E aprender a masturbar como eles na barranca do riacho, pensando em alguma dona solteira ou mesmo casada, às vezes na professora, em turmas de sete, oito até.
Também caçar, mas eu tinha dó de passarinho.
Eu ia morrer bem quietinho, de dor que doía, e eu ia morrer na cama de acolchoado de penas da minha irmã. E ela chorando de pena, me beijando a testa e o rosto; e eu nem veria.
Ah! Eu continuarei!... Quando é verdade, sabe. Desculpe...
Alguém então disse antes de eu morrer:
- É preciso levar para a farmácia.
E lá o meu pai foi procurar um carro e eles com gelo na minha barriga. Era a farmácia do compadre da família. Um deles.
- Ai que frio!, gelo na minha barriga.
Triste, tristemente a tarde esfriava mais, mesmo sendo verão. O carro não vinha, não tinha. Era preciso ir pro hospital da cidade vizinha. Veio mais tarde uma carona, por acaso a caminhonete dos porcos pro frigorífico.
E eu ia morrer loguinho. Levaram-me antes e doía nos solavancos. Lá atrás a criação, até lembro:
- Róc-róc-róc...
E eu:
- Ai!
Minha camisa branca, bem limpa, curta, de volta-ao-mundo. Deitado na cama do hospital. Alguém dizendo na minha cara, insensível! Como recordo:
- Vai entrar pra faca.
O que seria? Ah, assustei meus olhos e minha mãe manhe, ah, coitada! Ela mentiu então até:
- Não é nada, o doutor vai te curar.
Ah ah ah! Se eu fosse ela eu morreria de chorar. O filho morrendo antes de ver ainda o mundo, com os olhinhos azuis inocentes, perguntando o que era a morte.
A faca.
O bisturi.
A cirurgia.
Ah, eu não sabia o que era a morte e ainda não sei.
Ah, apagaram-se as luzes durante a operação. Escureceu tudo. Mais ainda aquela injeção no meu braço.
- Mãe manhe!
Não tivessem aplicado e eu talvez ainda poderia ter ficado olhando umas horinhas para a cara enrugada um tanto e piedosa de manhe mãe. Ah, não tivessem aplicado, dizendo:
- Vai passar a dor, dorme dorme, anjo!
Ah, e minha mãe ficou ali olhando o meu rosto adormecido. É só se pôr no lugar.
Ah, e eu ainda vi ela passando a mão na minha cabeça de sonhos.
Ela, ela:
- Dorme meu anjo.
E eu ainda tentei me segurar nela:
- Manhe mãe!
O que seria a morte? Escureceu e eu lá, no escuro e manhe mãe no claro. No escuro da minha inocência .Na certa meus irmãos me esperavam em casa para brincar. Eu estava no escuro e eles me esperavam no sítio. Os sapos:
- Rum rum rum.
A casa talvez toda pensando em mim. Uma vela queimando a escuridão sobre a mesa da cozinha. Alguém animando a sombra na parede e mexendo a polenta sagrada de todo dia. Alguém lavando os pés na gamela com àgua morna cheia de esperança, decerto. Minha irmã bebê chorando embaixo da mesa ou num canto. Ah, e eu no escuro!
Uma vaca mugindo. Um porco-espinho assustando os cachorros. Uma coruja assistindo a noite lá do pé de pitangueira. Ah, o riacho lá embaixo riachandochando, gorgolejando o meu nome de dentro de si, sussurrando pra minha outra irmã que chorava na janela detrás, a maninha que eu amava demais, e sempre juntos nas brincadeiras...
Eu lá, um "pitoquinho" na mesa de cirurgia. Meu coraçãozinho aos trancos e barrancos, judiado:
- Tum, tum, toc ,toc , toc , tum, toc...
E podia até loguinho parar, que ameaçava, para desesperos dos meus queridos e das pessoas próximas.
E os meus bichinhos do sitio? Branco geral, sem nenhuma lágrima igual assim. O cardeal não cantaria mais para mim. O meu cão, o Violento, ficaria me esperando a vida inteira no quintal, perto do pé de primavera florido, onde sempre eu e ele contentes e distraídos próximos das borboletas.
- “Apênis” estourou ainda no sábado?!
Alguém lá se exclamando com manhe mãe e pai.
Era segunda-feira e ouvia-se, por certo, "padres nossos" e "ave-Marias” chorados por todos e em súplica por manhe mãe e pai mais. Lágrimas puras sobre o Salmo.
Tudo escuro mesmo, tão escuro que podia até transbordar uma reversão no estouro da lâmpada e ficar claro de repente. A luz do dia já também se fora embora, fugindo do temporal daquele início de noite.
Um pavor e providência. O médico me olhava de lanterna e operavam-me no desespero.
- Oxigênio, mais!
Alguém na certa comandava.
Estava escuro. Eu não sabia o que era a morte. Minha mãe chorava e eu não sabia o que era morte. Continua escuro e eu ainda não sei o que é a morte. Continuará escuro e eu nunca poderei nem saber mais o que é a morte.


FIM

ELA (dona) - BETO PETRY - Terceiro Lugar - Contos - PRÊMIO CATARATAS - 1993

ELA
(dona)
BETO PETRY
I

A um canto da rua, entre o perambular das pessoas bem no turbilhão da cidade grande. Foi lá que Zé Líbero da Pereqrinação sentiu-se horrivelmente mal pela primeira vez. Vertigens e uma ânsia. Retiravam-se de dentro de sua pessoazinha conformada e simplória os alívios, avolumando-se um trem de mal-estar nos seus eixos. Uma sensação circular de tonteira e o vazio amoleceram-lhe o queixo.
Amparado no pilar do prédio julgou-se perdido, já no inferno. Não sabia se gritava pela vida ou procurava fugir dela para livrar-se ligeiro. amava ainda um pouco as coisas desse mundo. Se amava! Mas seriam desse mundo as coisas que via no seu mundo? Não seria tudo uma grande fantasia, as pessoas à luz do dia e o resto? As construções ousadas de cada lado da rua? As palavras como símbolos para a comunicação, os códigos da mente?
Tudo simbólico, simbólica existência, eterna fantasia de tudo. Não seria assim pelo menos aparentemente?
O que poderia existir de real sem algum outro referencial por de¬trás? O que estaria na frente vibrante, decisivo como colunas de um edifício? Forte como um aço duplo. O quê? Nada à vista até o final do corredor do pensamento. Só o mistério daquele buraco lá no fundo.
Mas e aquela dor, aquele mal-estar insuportável? Ah, aquilo também devia de ser mais outra brincadeira do grande sistema de sinais, referências e simbologia na re1ação das coisas com um certo ambiente, coisas ou mercadorias que poderiam ser, por sua vez, frutos da mente que pra si mente.
Não quis mais pensilosofar. Algo chamara sua atenção, um rosto, alguma coisa estranhamente revigorante, um esboço quase perfeito e meio familiar. Beleza em superlativos derramada.
Todas as pessoas, como em todas as cidades pântanos bárbaros, passam pelas outras automáticas, sem percebê-las. A preocupação, antes, seria desviar, evitar o choque. Ninguém se percebe nem. Mas eles se perceberam...aqueles olhos encararam os de Libero num instantâneo e ele melhorou de súbito, esqueceu como que a dor enorme, a crise ou o que quer
que fosse.
Abandonou como que por total desencanto a coluna daquele prédio do velho cinema e por um instante moveu-se, como que conduzido, rumo a dona do olhar aquele e do lenço vermelho no cabelo. Fora tudo rápido. Tarde demais! Ela desaparecera tragada pela multidão boçal.
Era um sonho, algo assim inexplicável. A súbita melhora, a mu1her do lenço vermelho de aspecto familiar, porém bela e desconhecida, somente.
O vendedor de chinelos, chegado de uma pequena vila de um interior há poucos dias, voltou ao trabalho na sua banca instalada nas proximidades:
– Chinela du norti! Couro i corda. Couro i couro. Bagatela, ué, oxê! Bom memo da peste. Viggi! Produto barato e duradouro, ia falando e gesticulando pros q u e circulavam por ali, ainda pensando na aparição durante o mal-estar, ói a folga nu pé, sinhá, sinhô. Ó! Acabi cuo maistá du danadu du seu pé im casa ou na istrada. Frescô, aliviu pu mixaria. É dado!
Uns olhavam os chinelos de Zé Líbero, outros passavam indiferentes. O camelô pensava que até o troco ou a nota recebida pela mercadoria e os chinelos que vendia, tudo era fantasia. Um dia no colégio, na adolescência, um colega lhe dissera que tudo era i1usão, tudo era mentira. Agora ele desenvolvera o raciocínio da questão, sem falar a ninguém. Ele próprio era uma i1usão, segundo ele próprio.

II

No segundo dia, o mal atacou-lhe no ponto da lotação. Súbita cegueira, enjôo insuportável, vertigens, uma sensação de círculos e um tombo sobre o saco de chinelos quase vazio. Amparou-se nos cotovelos e os cotovelos no chão. Uma velhota e um rapaz de olhos ingênuos ajudaram-no a sentar-se:
– Está passando mal! Pobre homem! Quem tem amor pelos filhos que tem, ajude em nome de Deus. Aqui! Isto, meu rapaz. Eh, eh! Isto! Obrigado! Tem gente que em vez de ajudar é capaz de carregar-lhe o saco com as coisas, e ela de dedo dava quase.
Sentado no chão pela velhota e pelo mancebo estudante, Libro pôde erguer os olhos e lá estava ela, num dos ônibus, numa das janelas, sorrindo um riso de filme americano. Lá estava a dona a acenar-lhe, ainda com o 1enço vermelho nos cabelos negros 1ongos. O carro arrancou e ficou-lhe aquela mão diante dos olhos, aquele sorrir, o rosto bem feito no ar; o nariz.
Quem dera fosse possível correr-lhe ao enca1ço. Nenhum táxi ao redor.
Nada à vista em tempo. Entre ir e ficar deu de si. Estava acenando, entre os olhares de todos ali, para os lados que engoliram “zaspeglug” o coletivo amarelo em instantes, extraviando-o em mano¬bras entre os prédios.
A ca1ça toda empoeirada , apesar da cor 1aranjada , e o saco com os chine1os no meio das pernas. Ao lado a transeunte:
– Deus me ouviu! O senhor tinha desmaiado. Procure um médico, se puder, quem sabe resolva.
– Bença, mãezim! ele disse com aquela sinceridade das mãos juntas, então, pra velhota e levantou-se estabanando pó das pernas.
Pó pra cá; pó pra lá!
A anciã não quis nem saber da nota que Líbero ofereceu e nem deixou lá o mancebo estudante pensar no assunto em tempo.
– Guarde! pegando a cédula e enfiando de volta no bolso da camisa de Líbero, compre um remédio antes, meu filho, e lá se foi subindo num dos carros que encostavam sem parar.
Libro entrou em casa pensando na mu1her desconhecida recém-reconhecida entre tantos desconhecimentos.
Tudo já era mistério e ilusão, só que agora vinha mais.
Preparou a farofa do jantar, lavou o próprio prato, enfiou-se até pensativo na Camarade. Sonhou a noite toda com a bela de cabelos negros e lenço vermelho acenando.
Que espécie de fantasia seria aque1a? Entre sonhar e acordar, o que seria não estar sonhando? Acordou intrigado e tornou a dormir intrigado. Até que, sentindo a boca seca, levantou, bebeu alguns goles de torneiral e deixou a vida seguir pelos canos da existência.

III

O sol estava amarelíssimo no bairro, até que uma nuvem ficou de pé entre ele e Líbero. O céu estava azul ao redor das nuvens. As pessoas se aglomeravam no ponto. Não tardaria o carro.
Zé Líbero, sentindo-se tão simplesmente o Libro descalibrado nas poucas libras de si, entrou na 1otação entre recordações lá do seu interior, o sonho de ser alguém, conhecer um amor, alimentar-se em felicidades. Entre todas as fantasias boas e ruins da vida seria difícil um bocado tudo sempre.
Deixara a noiva Mariazim Lavadê Simpló da província Fim de Mun, porque ela o deixara primeiro, pelos tecidos em cores de outras fantasias, segundo matutara.
A do lenço vermelho era mais bonita, de qualquer forma. Ali sim, ah! Ela não estaria brincando com ele? Sempre ouvira palestras das velhas da sua terra de que as damas da cidade, metidas em granfos, gostam de zombar dos bichos do mato. Não, ela não! Ela era uma outra pessoa, boa e diferente visível já num primeiro avistar.
Sentou no número sete, sempre firme nos movimentos do corpo, olhando para baixo. Sentiu um perfume sereno agradável estranho, porém continuou sem reparar no passageiro do banco ao lado, ocupado que estava na tarefa de organizar e conferir a mercadoria do seu saco estampado com plebéias do sertão.
Logo, numa curva, depois da travessia do túnel, veio-lhe uma sensação circular violenta com formigamentos. Enjoou. Começou a passar mal pela terceira vez. Dor no peito e vertigens desta vez mais fortes. Faltou-lhe ar.
Abrindo a boca em espasmos tentou num esforço desesperado abrir a janela; apenas conseguiu esbarrar no passageiro ao lado. Este percebeu-lhe a intenção e a aflição, abriu sem nenhum esforço a janela, sorrindo. Era ela! Ela ela ela ela, a dona, e o sorriso dela! O lenço agora era preto, os cabelos os mesmos, negros. Que sensação vê-la de perto.'
Ela abriu-lhe os braços com uma expressão terna e compreensiva no rosto que parecia dizer sussurrando: "f i n a l m e n t e ". Ele endoideceu diante de tal expressão. Esqueceu a janela como se nunca tivesse precisado dela e atirou-se de encontro ao ser total que, no impacto daquele momento, lhe oferecia o que nuncantes tivera na vida: a magia, a luz, o encanto, alívio e segurança. Ela que o conduzisse agora para onde qui¬sesse.
E foram.
Depois ele poderia avaliar até a situação e as sensações. Só uma coisa não podia acontecer naquela hora: desgrudar dela, “nunca mais”!
Numa esquina qualquer desembarcaram, pois os passos, no frevo daquilo, estavam por si já no ritmo certo. Passearam de mãos dadas e almas.
Colheram algumas flores roxas e lilazes, também tulipas no passeio. A cidade não era mais a mesma. As pessoas agora abriam caminho... e ela sempre bondosa, máxima, sorrindo risos jamais explicáveis neste mundo carrancudo. Dançaram entre as sombras das árvores da praça.
O sol benzia-os e eles em pleno galope passaram então por cima de tudo. A totalidade do ser, a totalidade do existir. Ela e ele. Ah e como amaram! amaram e amaram-se sem palavras, numa sintonia completa. Jamais seria triste a existência daquele jeito, naquelas luminosidades.
Afagando-lhe os cabelos entre o compasso daquele ilimitado sentir, ele pressentiu aqueles lábios afrouxarem então o sorriso, rendendo-o por uma expressão que delata desejo, paixão, um cuidado profundo. Ela iria beijá-lo, a boca ressequida e sedenta dele e a dela úmida e viçosa se uniriam naquele momento. Líbero da Peregrinação sentiu então o corpo todo tremer e um arrepio percorreu-lhe, no antegozo, as colunas de todo o ser.
Ela vinha decisiva, sedutora, irresistível, completa, resoluta. Agora não haveria nem na imaginação mais quase a possibilidade de um possível recuo.
O medo instantâneo de Libro, instintivo, deu-lhe naquele último momento um distintivo de curiosidade a declarar. Perguntou assim então à irresistível dona do lenço:
– Dona, infiná quem vem a ser ocê memo?
E enroscou-se, encantado, como um menino desprotegido, naquele pescoço de miss; como que desculpando-se por importuná-la com tal ansiedade. Seria hora de querer saber algo? A indagação, assim naquela afobação, não ia estragar tudo? Mas, o Senhor piedoso dos Justos, milagreiro, não haveria de, por tão pouca coisa, retirar-lhe a graça concedida. Amparou-se em firme fé.
Ela apertou-o nos braços e suspendeu por uns instantes o impulso do beijo, em longo suspirar, encarando-o profundamente nos olhos castanhos com os olhos negros injetados de noite; e assim murmurou donamente num tom inigualável em ternura aquele eu sou a sua morte que encheu-lhe os ouvidos todos para sempre.


- F I M -

segunda-feira, 16 de março de 2009

RECICLAGEM - Poema de BETO PETRY, vencedor do PRÊMIO CATARATAS

RECICLAGEM

(Por BETO PETRY)

Sinto a falta de Rosa e Flores Belas
Drummonds latejam dentro de mim
Poesia de Pessoas que me comovem
Dostô e Stendhal para sentir
A estampa de Deus e o Diabo nas palavras
Aqui e longe daqui


Maupassant nas estantes delira ainda
Um Baudelaire agoniza entre Oswalds
E Mários ousados da vida
Uma e outra pitada: irreverência e niilismo
Andradamente
Na independência dos nossos tempos


As graças de um Graciliano: Ave, São Bernardo!
Ter ou ser, eis um dilema
Vidas Secas nas desgraças da Etiópia Brasileira
Mazelas latentes e a evidência: Poderes sempre
Incompetentes
Um espectorante e Lispector
Botando pra fora incandescências efervescentes
Das coisas do fundo sem fundo das gentes


Sou-me e sei-me
Ginsberg, Maiakóvski, Leminski e outros Pablos
Whitman, Johns e Rolling Stones trouxeram-me
Até aqui também (apesar de)
Nestas esquinas versejo
Reforço-me e “revivoluciono”
Com e sem ti mim


Caetano e Mil tons me despertam
Em Travessias e Outras Palavras
Já morri Cem Anos de Solidão
Shake e Machado têm uma paranóia comum:
Desconfiam que são desconfiados, e gosto mais assim
O Allen e o Allan também apresentam algo
Lances de imaginação
Só que na ironia do pousar dos Corvos
Um não faz rir
E o outro não


Não só a felicidade e o sonho
As dores, pesadelos e sofrimentos
Também são criações humanas
Mente
Eternamente mente
Perto de uns e outros anônimos
Bocage é apenas boca gemente falando bocagens
Só que do anônimo não se sabe
No Brasil, antes Bilacs e assemelhados
E no Paraná “parnasos contemporâneos"
Anti - literatura (quem, a tura?)
Infelizmente mente
Publicitariamente (na Globobalização dos sentimentos)


Aqui, ali e lá
Há grandes indústrias de lixo
E isso é normal nos labirintos
Das amazônias de concreto
Tudo e nada de concreto
Refiro-me a realidades capitais



Lixos em série
Lixos luxuosos para o rádio
Lixos para a TV
Jornalixos lixuosamente para as gráficas
Tudo e para tudo
Toda sorte de artigos
Menos a verdade ou antes bondades e sinceridades
Ou o que é mais preciso


E eu
Dormindo ou acordado
Sempre vendo antevendo tudo
Ou quase
De fora ou de dentro
Raso ou abstrato
Coeso eu absurdo
Eu sempre atento
Nesta hora que é a minha hora de ver profundo


Tudo o que disseram
O que “vivejo” e me mostraram
O que fizeram e criaram
Tudo o que disso se salva
Deve somar-se em mim comigo
Para a posteridade


Não Preciso ser cristão
Tampouco cético, “muçuamorfetico1mano”...
Fanático seria, se quisesse
Mas não me adapto
(apenas rio dessas igrejinhas sonsas
com caras – de - privada e pastores incestos)


Não preciso ser nada assim digamos bastante restrito
E nem tão amplo que não caiba nos próprios estreitos
Sucintamente que eu seja a síntese
A essência de todas as partes expostas
(e pontos de vista e algumas quase que verdades)
E que isto sim resida em mim e dê certo
Para que eu consiga burlar as outras vontades
Eliminar os limites
Me aproximar de ser completo


Negação “absosurdaluta”
De tudo que é irrelevante, mesquinho e “restringidoto”
Como por exemplo a arrogância
De certas elites egoístas
Não sistemas corruptos!
Latifúndios improdutivos monoculturais!
Imprensas marrons !
Carros de US$ milhões para uns
E molambosos chinelos para a maioria
Eleições compradas por bananas
Ou a qualquer preço


Não!
Tributos em excesso para manter classes altas!
Não a tudo que é pequeno (apesar do tamanho) na vida!
A ambição impiedosa e desmedida!
Não não aos pretensiosos anseios de uma sociedade bandida!


Também no amor, não aos nãos!
Não às pretendentes e pretendentes americanizados!
Não não aos mercadores de sentimentos
E a todas as futilidades!
Não à discriminação dos artistas e dos justos e dos
bons!
Um não geral a ignorância!
Peneira nisso tudo!
Mãos à palmatória para os íntegros!
Separar os ouros dos joios
( E pelo menos agora uma vez na vida: )
- Trigo para todos!

domingo, 15 de março de 2009

MÁSCARA DA ALMA - BETO PETRY - Prêmio Nacional da VIAGEM NESTLÉ PELA LITERATURA - com alunos do CEEC de Matelândia/PR.

MÁSCARA DA ALMA

(BETO PETRY)

Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? / Talvez mesmo eu já esteja usando uma para evitar conflitos mais amplos, como o de Nova York, atchimm! / Mesmo que ela em meu rosto sorridente choroso não se ajuste (e nem na personalidade) / Posso ser um judeuzinho que se acomoda ó ó ó! E aceita tudo o que lhe é tirado ou dado como no livro / Em pêlo com a Iracema, balançando-se na loja “pra balanço fechada" / Então serei um lojista assim na Paulista, ok? / Ou em Foz do Iguaçu em meio aos papa-mandiocas do Paraguai / Eu aquele ah ah ah! E que pensa só no que poderia ter sido, no Noel Nutels, (ou no Che Guevara?) / No que poderia viver no livro-vida que passa / Enquanto diante da Telinha novelando à noite apenas passam ... / Me alugo viajo assim (da Rússia ao Brasil fugindo de mais outro Pogrom, do Nordeste pro Sul / Da Itália, de Portugal, do Rio Grande do Sul pro Paraná, atrás de futuro como os pioneiros) / Penso não vivo, ou será? Como o Noel Nutels que burlou inconvenientes / E dos índios foi solidário cuidar (e eles, como hoje, a sucumbir por lá) / Em plena Ditadura Militar, antes de acabar como o Brasil: “ na merda e cercado de Generais" / Brasileiro, que máscara quereis que eu use? Ai ai ai meu coração! Melhor tolerar / Selvagem manso sou, com a vida roubada pelos da Esquadra-Igreja desde Cabral: / Anchieta escrevendo poemas na areia! Anchieta o grande e eu o pequeno sem poemas / E fingir ainda estar de bem e adotar o mesmo Deus, logo eu, panteísta discípulo da natureza / E sendo a minha música sagrada “ Amor de
Índio" - do Beto Guedes, mas com o Milton / Axé, Aleluia, Tupã seja louvado!... e Jesuscrissantambém!

Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? (depois de queimar índios vivos na praça) / Saio então na rua de cara-de-pau pintada / Peço a cabeça de um político meu parente metido a bonito / Tudo pela vontade popular sagrada, que votou e elegeu o safado / E o povo quer ir para o Céu neste Brasil mesmo assim / Segue tilintintim dizimando R$... / E deve morrer para isso, e se morrer não pode mais ser escravo da própria estupidez (ou da elite dominante?) / Destino triste! (“ todo mundo quer voar nas costas de um homem bom") / Vôo e na hora de explodir apareço de máscara (senão as crianças-anjos se assustam) / Deixem-me então aqui falante (como o paciente delirante amigo do Nutels) / Ai essa minha Pátria tão ampla e cheia de exploradores (que fisgada no peito!) / Nação, que será de ti nas mãos de um Poder eqüidistante? (máscara já nisso tudo!. .. e no Congresso junto reunido!) / A liberdade pode acontecer na esperança de tanta espera no país-continente / A pobreza que se acumula um dia vai sim ser contemplada sei / Todos livres da fome em sonhos e o Renato Russo sem mais motivos para morrer down / Abaixo a burocracia tropical! / Máscaras, papéis e agora essa de projetos (para não se perder tempo com ações, quá, quá, quá!) / Eis-me à mercê de quem governa por eleição para si mesmo / Más caras, haja máscaras nisso! O negócio é conviver, pois na guerra é bem pior! / Eu estou de bem com a Cúpula de vez, pois sou um mascarado / De bem com a liquidação de minas, florestas, energias, terra, ar e água potável ( fora com o discurso da esquerda!) / Com quem não está de bem eu fico de mal, e até xingo / Sim, somos livres, liberdade à vista no mundo de mascarados! / Prazer imenso isso: fingir que não vejo o que vejo, não assisto o que assisto / E que nem cito o que cito (fingir robusto atrás desta minha máscara, senão Mão Negra... (ou Verde Amarela?) zapt!

Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? “ Navegar já não é preciso; conviver é que é preciso" / Alô alô todo mundo: “aquele abraço!“ / Não minto, apenas omito, mas se “ eles" quiserem, sei fazer / Roubar talvez, para casar, roubar uma santa para ser feliz com a minha santa / Felicidade falsa? Não digo, pois não ouso de máscara / Para evitar o choque ligo-me: de fato, os mandantes estavam certos / Mas que devo fazer para ganhar uns trocos? / Tudo pode ser apenas fantasia, mas e o bucho? Fantasio a vida para não cair na real / Serei mocinho ou vilão ou mocinho-vilão: um santo carregando a sua cruz / Em pleno padecimento para acabar depois Callado o romance em final feliz / Roubo a Madona e o coração do meu amor, simples como um aperto de mão, né? Ôba!! / E quantas mãos terei ainda que apertar? (para convencer o mundo terei que a roupa tirar?) / Pois é lá que posarei de Adão, em frente ao P do planalto / Não me censure, são apenas máscaras, escondem-me de sofrimentos / Perdoe-me!, apenas eu, quem sou eu? Mostro a minha cara e ninguém mais reconhece, nem eu / Rei demente povo tirano favelado: / Presidente, ainda te respeito, apesar de... serei o que preciso for; mas cuidado com a minha dignidade, por favor!

Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? / Viver por uns segundos e sofrer eternidades! Brasil, tenha pena de mim! Não quero ser outro “ Kome quase" / Ter ou ser, nesse dilema? A máscara amarga da ambição que Paulo Honório movia e move mundos / A máscara das injustiças, da assombrosa tristeza que rodeava Madalena em sua impotência / Eu junto nisso tudo como em romance, e que máscara? / A máscara da corrupção que não pára, da fome, da miséria; calo-me sem reivindicar ou para? / Devo acabar com "corujas" que nos ameaçam, como na Fazenda São Bernardo? / Ah, para ter poder mascaro-me e depois busco-me no espelho / Em meio a tantas máscaras nem sei mais qual, mas uma escolherei para sobreviver a mim / Devo aceitar a ambição como coisa normal? Sim, senão fuzilam-me sim / Que máscara? A de um doentio ciúme? Devo matar-me, como Madalena, vítima do ter nesta vida? / Por não ver o triunfo do ser? Isso ou o quê, para conviver? / Não, apenas evito o choque, digo e rezo mil vezes: que fazer?! !

Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? / Brasileiro, que máscara quereis? A máscara da impunidade, da mentira, da corrupção? Pois bem! / Onde a máscara perfeita? Onde a perdida? Perfídia! Em que espelho minha face tão doída? Eu sem eu aqui, e os meus sonhos em que noite? Afundando como Titanics em mar alto / Ou barcos, que ondas levam para nunca mais, como nos poemas de Cecília a naufragar / Devo deixar de sonhar? Rendo-me então ao Sistema e pena / Para conviver sem fazer cena, faço como no poema e sem nem valer a pena / Pergunto ao eu outro: máscara perdida onde estás? / E mal me avisto na revista / Escondido dos pensamentos: só mascarados à vista! / Busco em sonhos respostas: tormentos! / Máscara encarnada, intacta ao vento / Máscara perdida, em música embalada, máscara má, morta ou viva achada? / Não, ressuscitada! / Encarnada em sonhos-lamentos, paro e penso exclamo: / Oh, máscara perdida encontrada da vida que levo para poder ser, vir ver e dizer que amo!





Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? / Máscara para ver e não / No Sul, Norte, Nordeste, Sudeste: máscaras para conviver e arejar / "Minha Pátria é minha língua", vamos juntos cantar! / Defendo o Tupi-Guarani no "latim em pó" da "Lusamérica", e daí? / Nacionalista agrícola dou uma de Policarpo, conformado já com a traição do Marechal / Claro, para não ser fuzilado ah ah ah! Finjo-me de louco, assimilo injustiças / Sou agora da TV de coração, fã de anunciados: futebol e secos & molhados (ligo e dôo risadas) / Rodo feito pião na realidade a rodar, mascarado claro, sempre! / Chispa da frente! Vou honrar o país, e que ronque a barriga! / Para evitar que se levantem falsos testemunhos, uouooouuuuu! Haja máscaras nisso! / Em continência: "Pátria amada, Brasil!" / Um dois, um dois,... ninguém agora me fuzila mais e nem cogita, sou do Clube / Faço-me de Padre para concordar com a hipocrisia: “a paz do Senhor! “ (sou bispo do xadrez eh eh eh!) “Nomdopaidofidospritosantamém!" Viva Guimarães Rosa! Viva Jorge Amado e Lima Barreto amado seja / Mulato humilde que leio e decoro, pois nele a realidade vibra brilha, além do preconceito / Viva as igrejas e o Governo juntos em oração na mesma trilha! / Para exorcizar todo o mal, porca pipa!, e para tampar o sol com a peneira / O que mais eu farei? Já sei! Sou agora um vampiro, como políticos por aí, sugo riquezas e pimba! (para ilhas)

Más caras, mas cara doeu, máscara do eu; mas cara, que máscara agora uso eu? / No fundo-alma eu queria mudar o mundo; não assistir de cima do muro, como em Ideologia Cazuza / Espelho-me em Robin Hood, em plena máscara / Furto dos Reis e Príncipes para dar a pobres, e extermino os antibem / Elimino num poema o terror e a inveja / Formulo hipóteses utópicas ao Novo Mundo de Imagine: Ei, ei John, dedo em V in the world! / Esclareço desesperos e teimosias / E sigo ereto como um falo no cio do macho e falo: - Sou Golias para demonstrar força, e não calo! Pssiu! / Dói o calo, e na própria exposição de máscaras todas renuncio se preciso, viu? / Tiro a máscara da alma sem um tiro e sorrio preciso / Em nome nem que seja de lampejos da verdade por aí! / Desde que esta sobreviva no destino da raça humana em seu universo $ocial corroído / "Ne dali konchit! “

FIM


(Poema premiado NESTLÉ - ano 2001 - por BETO PETRY & Alunos do Ensino Médio – C. E. E. C – 3ª Série C – Período: Tarde)


PAPO DE PAPAS, NA LÍNGUA.

Eu lendo. O que é isso? A saúde da alma ocupa médicos? Eu deveria acho montar hospícios! Vem aquele homem pulando da página e me fala: cálculos não são precisos! Onde se viu meter todos os loucos juntos na casa? O único louco aqui é você, eu grito. Ele responde calma, o louco não sou eu, mas o Joaquim Maria pai amado dos livros em minha frente, como no poema de Mário velhos parentes a tirar a chapa para comer.
Acho que seria bom dormir, que dias! Internam-me, mas nesse mundo hospício quem agüentaria ser normal? Ah, seu poeta! O sono é meu, oras, TV e apresentadores dão sono. Melhor ler ou duplas sertanejas? Personagens vêm ter comigo. Machado pássaro, batia asas e ainda bate. Respondo? Eles são que tipo? Criança, acordo ao canto do passarinho.
Tomar chimarrão e cuspir verde no chão. Um pássaro? O ciúme satisfaz-me, poema. Que conto! Canto! "Dizem que sou louco..." em mim, canções. Contorço em lirismo a gozar o amor!
Descreio dos homens, dos escritores, dos... Bispo vem lá de Jesu Ouro falar que exagero. Não e nunca! Viraria prefeito, perfeito D. Evarista! Eu, bom homem na política dos pecados do mundo? "Mamãe não quero ser prefeito..." claro, Raul! Papo do Papa pop... Pra falar a verdade, nem cem Papas. Papar? Papa só essa: moça bonita, daquelas na rua a atrair olhos. Venancinha!!
Amor à vista? Dê prazo! Machado louco! Ele a criou, qual louco criaria lindo assim? Mas Van Gogh… Fiquem quietos! Deus meu, contos! O alienista vem intrometendo-se, louco é quem tem idéia; não quem está dentro. Na teoria do medalhão, um medalhão completo não tem idade. Há infinitas carreiras diante de mim. Mal entendo. Já vem D. Paula desesperada: todos separam! Não mais separação. Escorre-me o nariz: imagens de despedidas derramadas... Mamãe, papai, vocês tiveram-me; e eu? Lennon en-canta Mother ainda, lá de suas cinzas. Dança, caos atônito!
Quando tudo desaparece, acalmo. Cantigas loucas sem fim, o céu perto, arco-íris, poesia-luz... Homens célebres, sinfonias: Beethoven, Mozart... pianos, anos! Parem de linguar, as idéias confundir! Seus ambíguos! Conto: primavera em poema é melhor, e pessoa amando.
Pergunto-lhes: estão preparados? Respondem sim. Solto o verbo: ouçam contos e poesias, os casamentos vão mal, os casais sem versos não se amam já mais, o dinheiro prevalece, a juventude prostituída decai, mortes de doenças, abortos... As pessoas tiram-se a vida como eletrodomésticos da tomada. Religiões 10%, sem Deus! Vergonha de quê? Desemprego, fome, carência. Retrucam-me: nem Deus tem o direito de tirar vidas. É mentira! Poupe-nos! Pudesse eu sumia. Tristeza! Vocês estão seguros, sem riscos de tiros na rua, nas favelas, no Iraque, MST...
Não levamos tiros? Temos finais trágicos. Loucos escritores a realidade descontam em nós também. Quem vive sofre mais, na real idade mal dita! Tudo e todo mundo passa certas situações, até a lua no céu só, em cantiga de roda a chorar. Pessoas nos lêem; molham-nos lágrimas. Viveram algo parecido ou pensam que são felizes, e tocados pela poesia de vida vêem: “Não há remédio às dores da alma”. Na razão clássica das faculdades, viva o sonho sem insânia!
Acordem! A corda! Acordemos, mundo de ignorância! Realidade dura; coração mole! Não se vive sem os sonhos dos outros também, cada um leve a vida como achar, na moral-mor. Neste mundo as pessoas querem ser muito “iguaizinhas”... Ah, eu adoro a diferença de ser feliz!
Felicidade, quem vai nos separar? Quem mais se interessa por nós? Anos em prateleiras, bibliotecas. Nos pegam pela capa e nome, muitos nem querem saber que somos palavralma.
Ai que sono, aí é de noite? Respondem não. Sonho? Visão? Poesia de romances? Louco falo com verso? Rimo bem, meu, bem! Jaz zen, paz faz querer bem... Conto um, apareça! Dois? Medalhão, dialogar com papas na...? Bate-papo e papa. Pá lavras na terra: linguagens. Verdade ou não, alimento do espírito, a Palavra! Nós textos, coração! Sorrir real mente mesmo sem cem papas. Einstein, que língua! Rio, ... , ria!!!

(Texto classificado entre os 50 MELHORES do Brasil, por BETO PETRY & alunos da primeira série D, tarde, com as meninas geniais do convento, C.E.E.C de MATELÃNDIA/PR – Viagem Nestlé Pela Literatura – texto semifinalista entre mais de 13.000 concorrentes, segunda vez que BETO PETRY é contemplado neste concurso nacional – ANO 2005. )

A VIDA DE QUEM NÃO MORRE - EDIÇÃO sobre Machado de Assis - PELO DR. ILDO CARBONERA - UNIOESTE.

Caro amigo e colega

eis a revista, no original

grande sorte

Ildo




Foz do Iguaçu, setembro de 2008



CENTENÁRIO DE MORTE DE MACHADO DE ASSIS



Ensaios de Pensadores Livres






A vida de quem não morre











2008


100 anos da morte de Machado de Assis (1908)

100 anos do nascimento de João Guimarães Rosa (1908)

400 anos do nascimento do padre Antônio Vieira (6.2.1608)

120 anos do nascimento de Fernando Pessoa (13.6.1888)

60 anos da morte de Monteiro Lobato (1948)

90 anos de Antonio Candido (1918)

90 anos da morte de Olavo Bilac (1918)

40 anos da morte de Manuel Bandeira (1968)



***

Colaboração: Claimar Granzoto

Apoio cultural: Fundação Cultural de Foz do Iguaçu

Organização, idealização e revisão: Ildo Carbonera

***


Parte do material produzido para o Centenário será doado ao curso de Letras da Unioeste, Campus de Foz do Iguaçu, inaugurando seu Acervo Cultural e Artístico.



NO DEVIDO TEMPO


A presente revista, a primeira de uma série, apresenta textos de autores leitores e admiradores de Machado de Assis (RJ, 21/06/1839 – RJ, 29/09/1908), emocionados, motivados e inspirados pelos 100 anos de falecimento do Autor.

Os textos não seguem um Modelo, as idéias não observam uma Linha e os autores não constituem um Grupo de Pesquisa. Não haverá Conselho Editorial, nem Grupo de Nobres Revisores para declarar o Nihil Obstat e autorizar o Imprimatur.

Subjacente às palavras, sobrevive um pedido, uma súplica, que pode ser uma ordem: alunos de Letras que não amam a Literatura, não lêem e não sabem escrever não podem continuar dando aulas de Literatura, Língua Portuguesa, Leitura e Prática de Produção de Textos.

Diante de um romance, conto, crônica, novela ou poema, duas perguntas simples podem proporcionar grandes descobertas: a) Esse sujeito (ficcionista ou poeta) está escondendo alguma coisa, o que será? b) Esse sujeito quer revelar algo, o que será?

Quando fizermos a segunda revista – em 2009, no lugar de Centenário de Morte de Machado de Assis, colocaremos A vida de quem não morre; no lugar de A vida de quem não morre (revista número 1) colocaremos o “título” da motivação maior para aquela revista (a número 2). Uma revistinha por ano, já basta!

Assim, A VIDA DE QUEM NÃO MORRE será o título geral de tudo o que fizermos, de hoje em diante, em prol das Artes, das Letras, da Literatura, da Criatividade e da Liberdade.



SUMÁRIO

Priscila Yamany Medeiros, DECIFRANDO O FASCÍNIO
Robson Fagundes dos Santos, O FAZER-SE ESCRITOR
Flaviana Demenech, POR QUE CONHECER MACHADO DE ASSIS?
Celso Garcia Paula Junior, A SUBLIMAÇÃO DOS IMPASSES NA BIOGRAFIA E A OBRA DE MACHADO DE ASSIS
Carmen Barudi, A UM BRUXO [E UM GAUCHE] COM AMOR
Thiago Benitez, MACHADO SHAKESPEARIANO
Maria Carbonera Boschin, MEU QUERIDO, MACHADO DE ASSIS
Beto Petry, UMA QUESTÃO DE GÊNIOS

José Afonso de Oliveira, O RIO DE JANEIRO DE MACHADO DE ASSIS

Márcio AF Souza, A ESCOLA DO FUTURO, ANTEVISTA POR MACHADO DE ASSIS

Martha Ribeiro Parahyba, O LEITOR DE JORNAIS EM QUINCAS BORBA

José Nami Sobrinho, OBSERVAÇÕES, DIVAGAÇÕES, RELIGIOSIDADES: MACHADO DE ASSIS E OUTROS GÊNIOS

Clara A. Suarez Cruz, MACHADO DE ASSIS, O MELHOR CAMPO DE COMBATE
Humberto Guido, O QUE PODE O SENTIMENTO: A SUPERAÇÃO DA FINITUDE EM MACHADO DE ASSIS
Antônio Gouveia, RELAÇÕES DE JOAQUIM COMIGO E OUTROS LEITORES
Ildo Carbonera, A VIDA DE QUEM NÃO MORRE



Ensaios


DECIFRANDO O FASCÍNIO

Priscila Yamany Medeiros
Ainda lembro que no colégio eu fugia dos livros clássicos da Literatura Brasileira, mas não por vontade própria, não porque os odiasse, mas simplesmente porque não os conhecia. Apesar do que meus colegas diziam, e da imposição dos professores, eu tinha uma imensa vontade de lê-los. Mas como ir contra meus amigos e a favor dos professores? Isso era uma traição... Mesmo assim, às escondidas, comecei a descobrir um mundo novo: a Literatura Brasileira! Comecei pelos que hoje eu considero básicos. Lia um, depois o outro, depois o outro... E assim foi até o dia em que conheci Machado de Assis.
No começo, talvez por falta de leitura mesmo, não compreendia o que estava escrito ali. Entendi menos ainda quando a história começou de trás pra frente, em um velório e era o próprio velado quem falava! Isso me intrigou, e demorei algum tempo para compreender o que se passava. Agora entendo, talvez não da melhor maneira, mas sei que aquela história que, se começava de trás pra frente, como eu pensava, na verdade era uma inovação, algo que somente um autor do nível de Machado de Assis poderia escrever. Depois, li contos, crônicas, poesias, outros romances... E fui descobrindo que Machado era um ‘multiuso’ da Literatura Brasileira; até peças teatrais o cara escreveu. Hoje, eu sei que meus amigos estavam errados e meus professores também; meus amigos porque não sabiam o quão prazeroso é uma leitura de Machado de Assis, e meus professores porque não souberam demonstrar esse prazer em tal leitura.
Machado de Assis é fascinante por si só. Mas as pessoas sentem o fascínio de maneiras diferentes, ou por motivos diferentes; o mesmo ocorre com o prazer durante a leitura. Fascínio e prazer são sentimentos particulares. E mesmo assim, Machado de Assis consegue despertar esses dois sentimentos em muitas pessoas, pessoas diferentes, cada uma com suas particularidades, cada uma com o seu jeito É devido às diferenças entre as pessoas que surgem as preferências, as obras prediletas, aquelas que mais fascinaram e aquelas que foram mais prazerosas de ler. E é por isso que escolhi uma obra em especial, para tratar aqui, aquela que mais me fascinou: Quincas Borba.
Esta obra não é a das mais famosas de Machado, mas é a de que mais gostei. Trata-se da história de Rubião, ex-professor, que deixou a profissão para se tornar enfermeiro de Quincas Borba, um velho filósofo. É com o filósofo que Rubião conhece a teoria Humanista, mas não a compreende, sem saber que ele seria um fato que comprovaria tal teoria, caso alguém a tivesse levado adiante, pois Quincas Borba morre antes de conhecer o fato, ou melhor, antes de Rubião tornar-se o fato. Com a morte de Quincas Borba, Rubião herda toda a sua fortuna, com a condição de cuidar do cachorro, também chamado Quincas Borba. Rubião resolve ir embora de Minas Gerais com sua herança e com o cachorro. Durante a viagem, conhece um simpático casal: Cristiano Palha e sua belíssima esposa, Sofia. Logo no primeiro encontro, devido a sua ingenuidade e empolgação, Rubião conta ao casal a felicidade que teve ao receber a herança. O casal se comove, e assim fica selada uma grande amizade, que mudará totalmente a vida de Rubião - É exatamente essa amizade que tornará possível a compreensão e comprovação da teoria Humanista de Quincas Borba. Rubião sente uma atração por Sofia desde o primeiro encontro, transformada num grande amor não correspondido, apesar da bela dama demonstrar o contrário, quase tudo com segundas intenções.
Não pretendo fazer um resumo da obra toda aqui, mas sim explicar o fascínio por ela e por Machado de Assis. Acontece que “o cara” se utiliza da teoria de Darwin, aquela da seleção natural da espécie que todos conhecemos, para escrever um romance! Quem pensaria nisso? Somente ele, o 'multiuso' da Literatura Brasileira. E é esse o motivo do meu fascínio por Machado e por esta obra, em especial. A obra é simplesmente um primor. E é a capacidade de transformar tudo, até a própria Ciência, em Literatura, que me fascina nos escritos machadianos. Vale a pena conhecê-lo!
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O FAZER-SE ESCRITOR...
Robson Fagundes dos Santos
Como traçar um estilo, uma personalidade, uma forma de escrita capaz de cativar através dos tempos, de fazer parte da vida das pessoas, de transformar mundos? Seria um estilo totalmente arrojado, revelador, cheio de sutilezas segredadas que somente quem sabe o que escreve as utiliza sensatamente, não dando importância aos maus agouros, preconceitos, nível social e todas as adversidades que possam surgir. Pode-se dizer de uma nova percepção; um novo ideário que havia começado na Europa, podendo ser presenciado em Gustave Flaubert, Fiódor Dostoievski, Leon Tolstói, Charles Dickens e Eça de Queiroz; uma visão que um homem fisicamente muito distante da Europa também passa a ter.
São as leituras e o amor pelas letras que faz o jovem mestiço e simples empregado de tipografia explodir para os ares do mundo literário. Das Memórias Póstumas; do amor de criança à casmurrice da vida; do ingênuo Rubião e seu cachorro Quincas; das disputas de Pedro e Paulo aos sensatos conselhos do Diplomata que mais tarde mereceria uma memória a ser contada. Temos aí um tipo sutil e irônico de reflexões profundas dos fatos corriqueiros, um causador de impacto ao se ter na reflexão dos fatos.
Tivemos também o Machado poetando no mundo literário, e poetando seguiu as tendências que se manifestavam. Um Machado romântico que não se fez de rogado ao querer adquirir sua intelectualidade, que não encolheu na leviandade dos loucos e nem se deixou menosprezar por traduzir obras da língua-berço da literatura ocidental; língua que ele dominava com perícia e excelência.
O Mundo em que viveu é o mundo em que muitos ainda vivem. O preconceito na pele, o querer apresentar-se crítico e debater como todos quando sua aparência e classe social não permitiam. A superação com a insistência em acreditar que há uma possibilidade de se manifestar e se agarrar a ela porque nela estava a oportunidade de mostrar que tudo era possível, de que a gagueira e a epilepsia eram pequenos empecilhos que faziam cócegas diante da sua vontade de criar.
Mais que um simples homem do século XIX, trata-se de um ser totalmente além do seu tempo e que os anos, por serem caridosos, o presentearam com a imortalidade.
Quanto leitor, tenho como dádiva o gosto e o prazer que me levaram a apreciar o vasto mundo criado por Machado e a herança que perdurará às gerações futuras.
Do Mundo Machadiano que me fez sonhar um dia ser escritor, sou admirador, seguro do que sou e, seguramente seguro do que sempre serei.
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POR QUE GOSTAR DE MACHADO DE ASSIS?
Flaviana Demenech
Joaquim Maria Machado de Assis foi um romancista, contista, poeta e teatrólogo brasileiro; é considerado um dos mais importantes escritores deste País. Em suas obras, Machado utiliza um texto articulado, rico e uma linguagem complexa, com isso, muitos ousam criticá-lo. Por experiência própria, posso afirmar que no ensino médio não lia obras literárias, por não gostar dos escritores brasileiros; uma mudança houve comigo ao iniciar uma leitura das obras de Machado de Assis, pois, na literatura, mais importante do que o que se fala, é o modo como se fala. Há quem discorde.
A genialidade de quem sabe escrever aparece até numa simples frase, como esta: Eu só amolarei a maioria dos meus semelhantes, quando não der por isso; de propósito, nunca (Machado de Assis).
Ao lermos uma história deste autor, entramos em um mundo que permite viajar através das portas da fantasia, um mundo onde se realizam todos os desejos imagináveis; este mundo não tem fronteiras.
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A SUBLIMAÇÃO DOS IMPASSES NA BIOGRAFIA E A OBRA DE MACHADO DE ASSIS

Celso Garcia Paula Junior

O papel da literatura muitas vezes ultrapassa as fronteiras da expressão artística, tornando-se uma ferramenta valiosa para entendermos não apenas o mundo literário, mas também as dificuldades enfrentadas por grande número de literatos.
Podemos citar vários nomes de escritores que suportaram com bravura os impasses encontrados, e um deles foi Machado de Assis.
Joaquim Maria Machado de Assis é considerado um dos maiores escritores de nossas letras e uma referência quando tratamos de Literatura Brasileira. O que nos surpreende não é apenas a vasta e qualificada obra que o mesmo produziu, mas também as adversidades com que se deparou.
Um homem que nasceu de pais humildes, perdendo a mãe já cedo e tendo muitos problemas de saúde como epilepsia e gagueira, tinha tudo para ser um entre tantos indivíduos que se limitam por sua condição de vida.
Essa conduta do escritor de não se deixar levar por uma série de impasses que atrapalhariam qualquer pessoa, era algo que ele tentava passar, inclusive para seus companheiros de aspirações.
Ao analisarmos sua biografia, percebemos que o escritor soube como poucos, o significado da palavra “perseverança”. Desde cedo, trabalhou incansavelmente e se não conseguiu a fortuna material, a que muitos buscam de maneira obsessiva e até mesmo inescrupulosamente, Machado de Assis acumulou amigos por sua personalidade discreta, prestativa e, principalmente, transmitiu à posteridade um dos maiores legados literários produzidos por um escritor.
É dessa forma que Machado de Assis angariou para perto de si um grande número de pessoas que nossa história as elegeu como marcantes. Dentre eles estão Quintino Bocaiúva, José de Alencar, Manuel Antônio de Almeida e Castro Alves. Conseguiu ser respeitado nos jornais em que colaborou e tornou-se uma voz constantemente ouvida, tratando-se de critica literária.
Mas toda essa maturidade intelectual e respeito alheio, fora fruto de muito talento e, principalmente, muita transpiração. Teve que sobrepujar as adversidades, e o fez com incrível maestria, sublimando-as e escrevendo obras imperecíveis.
Quando falamos em “sublimar” as dificuldades ou os impasses encontrados, é necessário remetermos a algumas postulações existentes na psicanálise freudiana. Sigmund Freud postulou que o indivíduo é acometido por muitas situações de ansiedade e o aparelho psíquico humano possui mecanismos para sanar ou minimizar algumas situações ansiogênicas, existindo para isso as “defesas do ego contra a ansiedade”. Dentre essas defesas, constatamos a existência da sublimação, muito utilizada no meio artístico e valorizado no meio literário.
Possuidor de uma enorme criticidade, todavia sempre moderado, nunca se deixou levar por energias instintivas que poderiam fazer dele mais um entre tantos pseudo-revoltosos-pueris, pois ele sabia que sempre haveria impasses, mas maior do que eles foi a sua dedicação ao trabalho e, provavelmente, a certeza de que apenas a Literatura poderia fazer dele uma pessoa capaz de responder com grandeza às limitações que encontrava.
Como é possível um indivíduo que nunca teve uma família sólida, uma situação financeira estável e uma saúde vigorosa, conseguir ter tantos amigos influentes e escrever obras que são um elogio à intelectualidade humana? Como pode uma pessoa que se sentiu muitas vezes desprezada por inúmeras pessoas, amar a tantas como ocorreu com Carolina?
Em 1906, Machado de Assis escreve um de seus mais profundos sonetos. Ele que sempre fora muito apreciado por sua narrativa, alcança, nessa poesia, a expressão sintética de o quão vasto fora Carolina para ele, elogiando-a em uma poesia que só poderia conter o nome de sua grande amada. Mas também podemos dizer que além de ter amado Carolina, ele teve uma verdadeira relação de afetividade com a Literatura, e mais do que se vislumbrar com ela, encheu-a de atributos que fizeram nossa literatura se solidificar e ser cada vez mais respeitada.
O ano de 2008 ficará marcado na Literatura Brasileira por ser o ano do centenário da morte de Machado de Assis, um verdadeiro mestre na arte de sublimação dos impasses. Mas o que importa nessa comemoração, é que Joaquim Maria Machado de Assis nos prova, por sua biografia e por sua vasta obra, que um homem pode morrer e ao invés de ser enterrado, ser plantado; ser plantado, germinar, crescer e verdejar eternamente através da Literatura - a sua fecunda existência.
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Machado de Assis

Machado de Assis
Quando nascestes
Lançastes
No preconceito, agruras e incertezas
Autênticas “machadadas”
E ajudastes
A aprofundar a raiz
Da Literatura Brasileira
E quantas pérolas encontradas...

E quantas pessoas ajudadas
Direta e indiretamente
Por ti, que fizeste existir
E projetar escritores diversos
Dificuldades sublimadas
Tudo podia ter sido diferente
Um simples fim
Mas te transformaste em eterno

Deixando-te de ser mais um “coitado”
Escolher uma palavra para te qualificar?
Prefiro um singelo “obrigado”
Que me fizeste a Literatura, amar.
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A UM BRUXO [E UM GAUCHE] COM AMOR
Carmen Barudi
Você disse que alguns leram da vida um capítulo
e que o Bruxo leu o livro todo
E eu me pergunto:
e aquela pedra?
Ela parou na porta da ABL,
onde você nem entrou...
O que pensaria o Bruxo disso,
que você é um imortal sem fardão?
Alguns que lá repousam,
Nem um capítulo leram
E outros talvez leram e não entenderam
Agora por lá existe outro
Que chamam bruxo
E eu me pergunto:
O que pensaria você, gauche, disso?
Conheço um poeta,
Como disse um amigo
um homem simples,
que tem algo do Bruxo
e dizem que ele lembra um pouco o bruxo
Ele me fez refletir
Se bem que com métodos nada convencionais,
A diferença de bruxos e Bruxos
E daqueles que como os sapos gritam
Não Foi! Foi! Não Foi!
Pé ante pé, estou chegando lá
Percebendo qual é o enigma [claro!]
Já que você me deixou uma pista,
Hoje sei que o Bruxo resolveu em você muitos deles.
É ele que deu volta à chave?
[agora com crase!]
Mas a capa não é do Verne?
Isso me lembra o verme que ganhou dedicatória...
Saiu pela janela? Qual delas?
Itabirano, gauche, você também é Bruxo!
C&>

MACHADO SHAKESPEARIANO

Thiago Benitez
É difícil ler Dom Casmurro e não pensar logo em Hamlet. A dúvida que ambos os personagens sentem durante o decorrer da história é claramente visível. Bentinho sente-se inseguro pelo fato de não saber se sua mulher, Capitu, o traiu ou não, e se Ezequiel é verdadeiramente seu filho. Hamlet, assim como Bentinho, tem a insegurança e a dúvida corroendo seu pensamento: não sabe se seu pai aparece de fato para si mesmo, ou o fantasma que ele vê é apenas fruto de sua imaginação. Aí é que surge a dúvida que tira o seu sossego: sua mãe matou mesmo seu pai, ou o que o fantasma lhe diz são apenas imaginações, criadas pela sua mente?
Além do talento incomparável de Machado para criar metalinguagens nos textos – nesse aspecto percebe-se sua inspiração e apreciação por Cervantes – ele também usa, a todo o momento, aspectos intertextuais que deixam a escrita infinitamente mais culta e envolvente, demonstrando assim seu talento – talvez dom – para uma escrita rebuscada, crítica e fiel à realidade; sem comentar a respeito do conhecimento de Machado ao falar de música, política, arte, ciência, cultura, filosofia e religião. Percebe-se, na maioria de seus romances, sua apreciação por Shakespeare e seu talento para a intertextualidade, como é visível, em seu livro Memórias Póstumas de Brás Cubas: “Era o caso de Hamlet; ou dobrar-me à fortuna, ou lutar com ela e subjugá-la. Por outros termos: embarcar ou não embarcar. Esta era a questão”.
Ainda no mesmo romance, Machado cita a peça Otelo: “Abençoado uso que nos deu Otelo e os paquetes transatlânticos!”, demonstrando sua grande admiração por Shakespeare. E como se não fosse o bastante, ainda refere-se a Macbeth, uma das obras mais consagradas do dramaturgo inglês: “... com o fim de saber de um modo positivo e concludente por que razão Aquiles passeia à roda de Tróia o cadáver do adversário e lady Macbeth passeia à volta da sala a sua mancha de sangue”.
Segundo Caldwell: “Os brasileiros possuem uma jóia que deve ser motivo de inveja para todo o mundo, um verdadeiro Kohinoor entre escritores de ficção: Machado de Assis. Porém, mais do que todos os outros povos, nós do mundo anglófono devemos invejar o Brasil por esse escritor que, com tanta constância, utilizou nosso Shakespeare como modelo, e devemos nos sentir lisonjeados de sermos os únicos verdadeiramente aptos a apreciar esse grande brasileiro”.
Machado de Assis e Willian Shakespeare conseguem brincar com o pensamento dos indivíduos, colocando problemáticas que são visíveis na sociedade, mas que jamais alguém ousou escrever sobre tais. Derrubam uma teoria inteira em apenas um sintagma. Criticam os costumes sociais da sociedade da época: Shakespeare ironiza e mostra a face mais cruel do ser humano do século XVI e XVII, Machado, do século XIX e XX. Entretanto, ao ler as peças do primeiro e os romances do segundo, imagina-se que tanto um quanto o outro viveram no mesmo século. Mas qual? Impossível responder. As obras de ambos são tão atuais e criticam costumes e problemas tão recentes que não se pode estabelecer uma data de vida e de morte para eles.
Logo, as influências de Shakespeare sobre Machado de Assis devem ser consideradas válidas e importantes para podermos entender a “Emboscada Machadiana”, entretanto, não se deve pensar em cópia, plágio ou linhas de pensamentos idênticas. Shakespeare e Machado viveram em épocas diferentes, com sociedades e costumes distintos. Assim, dizer que as obras de Machado são simples cópias de Shakespeare, passadas para a linguagem do, século, XIX e XX, é brecar sobre conceitos e estudos detalhados referentes à produção machadiana, admirada no mundo todo. No entanto, não podemos negar que Machado de Assis deveria ter gostado muito da idéia de ter colocado em Dom Casmurro duas frases a respeito de Capitu: “Traiu ou não traiu? Eis a questão”.
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MEU QUERIDO, MACHADO DE ASSIS
Maria Carbonera Boschin
Hoje é sábado, e feriadão de Páscoa. Por falar em Páscoa, domingo passado foi dia de Ramos; sempre me comove este dia. Fui à missa. Como não sabia o horário exato, fui às 8h. A igreja do falecido Guido ainda estava fechada; achei o cúmulo do desleixo com o pobre povo que ainda tenta ir à Igreja. Fui para a do Coração de Maria, e por sorte uma mulher estava abrindo a porta. Perguntei sobre a missa, já que só agora estavam abrindo a Igreja. A mulher respondeu que o padre resolveu rezar só uma missa na praça, às 9h30m. Sinceramente, eu não estava acreditando; em dia de Ramos, às 8 e 30, domingo, um dia lindo de doer! e eu sozinha numa igreja, nova, aliás, sem acabamento ainda porque de tão grande, não conseguem terminá-la nunca... Salões, uns dois, e mais o sub-solo... Fiquei pensando: pra que sub-solo se estou aqui sozinha? Esteio sempre foi uma cidadezinha chinela em matéria de igrejas católicas...
As outras, cada semana, abrem uma nova com nomes que desafiariam Machado de Assis, em matéria de imaginação... em qualquer barraco, e no mês seguinte, já estão em outro casebre um pouco melhor, prometendo fortunas, saúde e milagres absurdos para pessoas humildes, desinformadas, desassistidas e pobres de fé (como disse o escritor): “Pessoas parecendo cachorro faminto que corre para qualquer lado, atrás de comida, não importando quem a ofereceu”.
Bem, voltando à missa de Ramos, como já disse, são 8 e 30 e a missa às 9 e 30, na praça. Rezei tudo o que pude e para todos, e o tempo não passava, fiquei observando aquele lugar tão grande e também tão vazio! Da porta da igreja, dei uma olhada para a praça que fica em frente, e que tem fama de tudo, menos de local para missa campal. Vi uns caras, mal-encarados, com garrafas na mão, andando de um lado para o outro, sem camisa, com umas cuecas ordinárias um palmo acima de umas bermudas mais ordinárias ainda... Fiquei imaginando o espetáculo que ali me aguardava. Fazia um calor infernal! Hão de convir que a essas alturas já devia haver mais alguns pobres fiéis esperando pela Missa de Ramos. Começou a missa. Contando com o padre e eu, umas cem criaturas, mais ou menos, se dispuseram a ir à cerimônia de Ramos. O calor era tanto que o pessoal se abrigava na sombra de algumas árvores, um bolinho de gente aqui e outro ali, e o padre, se achando o máximo!
Chegou a hora da Bênção dos Ramos. Umas duas ou três meninas e eu estávamos praticamente no sol. Elas subiram em umas pedras, para ver melhor por onde andava o padre. Quando o bendito chegou perto de nós, eu dei uns passos para frente e as meninas me seguiram. Devo informar que ninguém combinou nada. Eu estendi as mãos na esperança de apanhar algumas gotinhas de água benta, nem tanto para mim, mas pata as meninas que imitaram o meu gesto. O padre viu, mas não se comoveu e não jogou água benta nenhuma em nós; não fez sequer um gesto, uma expressão de afeto, e seguiu em frente. Fiquei com vergonha de eu ter sido incapaz de sensibilizar o padre a jogar umas gotinhas de água, nem tanto em mim, mas nas meninas que confiaram em mim. Uma delas olhou para mim, fiquei sem jeito! Me senti um lixo! Deu vontade de dar um chute nas canelas daquele idiota de padre e dizer: vai benzer tua vó... Peguei as benditas “ramas não bentas” e fui para casa.
Essa foi a minha missa de Ramos de 2008, depois de esperar uma hora e meia por ela. Com certeza, não foi a “Missa do Galo”, de Machado de Assis, mas também tenho certeza de que ele teria escrito um ótimo conto, contando com toda aquela sutileza que lhe é própria... Amém.
Agora, o meu querido Machado de Assis, escritor, morto há 100 anos. Ah! Machado de Assis, meu escritor preferido, quem sou eu para me atrever a rabiscar algo sobre este gênio das letras e que me faz apaixonada por tudo o que escreveu. Já li quase toda a obra e reli sei lá eu quantas vezes, os romances e contos que mais me comoveram. Em toda parte, tenho alguma coisa escrita, que anotei das tuas obras. Como morei um bom tempo no Rio de Janeiro, e a maioria das obras foram escritas pelos bairros daquela cidade que amo tanto - Engenho Novo, Catete, Cosme Velho, São Cristóvão, Andaraí, Lapa, Rio Comprido, Glória etc. - cada obra que leio, aliás, eu não leio, eu vivo o que leio, e ando por esses bairros de um século atrás, vou acompanhando e imaginando como teriam sido os teus rascunhos, tuas anotações, tuas andanças pelas ruelas do Engenho Novo, a pé, num tílburi, de charrete, onde preparaste Dom Casmurro. Não sei se já na tua época o Brasil ameaçava criar alguma raiz em matéria de memória.
Pergunto, porque hoje o Brasil é considerado um país de memória curta, por não lembrar de fatos, acontecimentos, mesmo que tenham ocorrido num tempo não muito distante... É claro, Machado, que isto envolve educação, cultura. Tu não imaginas como dói na alma, eu precisar dizer que o Brasil é um país pobre em educação! Contudo, todas as homenagens que te forem feitas neste ano, não serão o bastante para agradecer, considerar, retribuir e recompensar o Legado que nos deixaste. Este Legado são os teus Papéis Avulsos, as tuas Histórias sem Data e as tuas Relíquias de Casa Velha. Mas tu, Machado de Assis, és a nossa maior Relíquia, o nosso maior Tesouro, camuflado em cada palavra que deixaste no papel das tuas obras. Até hoje, ninguém conseguiu superá-las, porque cada uma delas traz, além do prazer da leitura, uma lição de cidadania, de bons costumes, de ética, enfim, de vida... Ah, minha Capitu dissimulada...
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UMA QUESTÃO DE GÊNIOS

Beto Petry

Em verdade, eu recebera um convite do Ildonera (Dr. Ildo Carbonera da UNIOESTE, pela UFRGS), para escrever, discorrer sobre Machado de Assis, o maestro das palavras de todos os tempos. Sim, pois, imortalizado, vive além-túmulo. Ele ri de nós em suas páginas abertas da vida, e eu aqui tentando escrever sobre ele ainda hoje, e quantos ainda? Ora, o mundo todo ensaia por aí.

Dessa maneira, acato sugestões e estou somando tudo aqui para escrever. Quem mais poderá me dizer alguma coisa sobre o mulato das laranjeiras neste Sertão do Iguaçu? Serão os mestres das citações sobre citações das academias? Aqueles que copiam um trecho de alguém para justificar outro trecho de alguém que tinham copiado? Jocosa copiação! Ou seriam esses professores da academia, nos lábios-penas de Bakhtin, nada mais que sujeitos assujeitados? (acho que é com dois Ss sim, mas o PC Word diz que não).

Pensei, pois bem, também em contar como foi que descobri Machado de Assis, assim, antes de alguém me falar qualquer coisa, por conta, nos meus 17 anos próprios, nos próprios livros... Meus professores, ah queridos, formados onde e em quê? (com exceção do Juvêncio, claro). Não, não poderiam saber me falar nada sobre Machado, não liam Machado na época... acho até que achavam que era machado de cortar lenha, mas que não cortava suas caras de pau de educadores sem leitura (de meia tigela); nem suas cabeças duras cheias só de morfemas e lexemas, em dogmas teóricos de (im)perfeita ortodoxia gramatical.

Não disseram nem mal, nem bem de Machado de Assis, afinal, lá onde estavam e de onde tinham vindo... de tradicional militar educação de enxada e sem ainda nem a foice; e de literatura (sem tura alguma na cola) o que poderiam me dizer? Poderiam pelo menos ter pesquisado alguma “cousa” para me dizer na escola nas aulas “e não nas ulas” de Português, como apontamentos que seguem:

Se analisarmos a sua carreira intelectual, verificaremos que foi admirado e apoiado desde cedo, e que aos cinqüenta anos era considerado o maior escritor do país, objeto de uma reverên¬cia e admiração gerais, que nenhum outro romancista ou poeta brasileiro conheceu em vida, antes e depois dele. Apenas Sílvio Romero emitiu uma nota dissonante, não compreendendo nem querendo compreender a sua obra, que escapava à orientação esquemática e maciçamente naturalista do seu espírito. Quan¬do se cogitou de fundar a Academia Brasileira de Letras, Ma¬chado de Assis foi escolhido para seu mentor e presidente, posto que ocupou até morrer. Já então era uma espécie de pa¬triarca das letras, antes dos sessenta anos. Patriarca (sejamos francos) no bom e no mau sentido. ¬Muito convencional, muito apegado aos formalismos, era capaz, sob este aspecto, de ser tão ridículo e mesmo tão mesquinho quanto qualquer presidente de Academia (Antonio Candido).

Tudo bem que Machado pudesse até ser ridículo como presidente de Academia (e quem não seria nestes cargos de mofas azedas?); mas nem isso me disseram lá nos Matagais do Iguaçu. Lá onde eu limpava chiqueirões e ia às aulas quase de pé no chão. Ora, roc roc eu lá entre os porcos-leitões, por cada lição curioso sempre; e nem me disseram... os tais, nem me informaram que havia no Brasil um tal Machado que não era machado.

Estavam pagos para me ensinar, dólares talvez do FMI. Mas aí me deixaram passando M.de Assis em brancas nuvens. O cara não tinha nascido para eles meu, nem sido presidente da Academia Nossa de Letras Mor; então eu achei um livro jogado lá, quase no lixo da escola, ou na casa de um parente, nem lembro onde; e que ninguém lia.

Comecei num zapt a ler por conta e gostar da prosa, abstrair, ‘sacar’, entende? Pelas sacadas e tocadas filosóficas, claro, parecia eu ali falando comigo, de repente, num outro. Aí houve uma identificação, para azar geral de todos os milagreiros, sacerdotes sem outros dotes, analfabetos regionais da imprensa marrom, religiosos e acéfalos do lugarejo. Foi então meu nascimento, meu batismo, meu puro ‘alfabatismo’ nas letras... Depois fui saber que Machado de Assis era o tal etc. e senti-me orgulhoso demais, bah, que genial!

Bem, pensei algo assim, disse então ao Ildonera num e-mail, e incorporo tudo numa espécie de artigo agregado de idéias, da história real minha; e com as sugestões do meu jeito, entende? E falo sobre Dom Casmurro, que ninguém quase lê nem na escola e nem fora dela. Bem, esta obra depois fui saber que é um livro omisso bem a rigor, ao estilo machadiano, uma obra aberta, que nos engole em cheio: glug! Vamos lá! Era muito chocante ser da escola do Euclidão, ser mandado para fora da aula se tinha problemas de ler os eres por uma questão de descendência francesa, ou para casa em dias de frio se chegava lá sem uniforme; e o pior: ser da época contemporânea e nem saber nada de Machado, ou algo ao menos como as citações que seguem.

Esta circunstância parece chocante porque, nos seus contos e romances, sobretudo entre 1880 e 1900, nós encontramos, disfarçados por curiosos traços arcaisantes, alguns dos temas que seriam característicos da ficção do século XX. O fato de sua obra encontrar atualmente certo êxito no Exterior parece mos¬trar a capacidade de sobreviver, isto é, de se adaptar ao espírito do tempo, significando alguma coisa para as gerações que leram Proust e Kafka, Faulkner e Camus, Joyce e Borges. Entran¬do pela conjetura, podemos imaginar o que teria acontecido se ela tivesse sido conhecida fora do Brasil num momento em que os mais famosos praticantes do romance, no universo das literaturas latinas, eram homens como Anatole France e Paul Bourget, Antonio Fogazzaro e Émile Zola, que, salvo o último, envelheceram irremediavelmente e nada mais significam para o nosso tempo (Antonio Candido).


Bem, caro Ildonera, digo então, Machado de Assis era enfim ‘o cara’, imortal, grande mais que qualquer Alexandre... desde o seu tempo até agora; e nada me diziam dele, assim tive que ir descobrir. Mas fui; outros jamais.

Quem é Machado para mim, hoje? Ora, ele é aquilo que é ‘indivíduo’ se fosse uma personagem; mas é real. Sujeito sim e bem sujeitado, autêntico escritor-pensador-leitor-pessoa; é vida em alta escala de radiação e percepção.

O gênio da literatura na verdade é um ser dotado de sensibilidade, mordacidade, um cérebro preparado e de pronto eficaz em prontidão para sempre ver mais de si mesmo, e daí o seu ver, através de si, dos outros. Os teóricos que o digam hoje.

Mas onde estavam meus professores do 2º Grau da época? Em que escolas tinham estudado, deveriam chorar até hoje, e para sempre, se um dia soubessem, mas eles jamais saberão (pois não é pra qualquer um mesmo) o que ignoraram, fizeram ignorar e perderam de todo em suas vidas insípidas e rasas de cultura sem vanguarda e nem Jovem Guarda e seus ‘Blue Caps’.

Que educação havia em minha cidadezinha oestina do Paraná? Cada vez que pesquiso mais, desespero-me mais. Ninguém me falou de MACHADO DE ASSIS na escola. Erro irremediável! Ildonera, eu grito aqui que nem você, eu fico cada dia mais indignado! Este artigo nos 100 anos de Machado, o bugre, o nosso mulato de ouro, é sim a minha vingança aos pseudos educadores da deseducação do faz-de-conta de ensinar que tive, e de tantos outros, gente do nosso admirável devoto cristão beato povo em sua ‘vida de gado’ pelo Brasil a fora.

Salas cheias e todo mundo para a escola! Cursos de Língua podres e sem linguagem, sem nenhuma definição de Literatura, nem de Linguagem, sim, baixíssima linhagem de aprendizado real, algo ‘irreal’. Escolas públicas de pedagogia contraditória (falam de conhecimento real, processo amplo de ensino objetivo e integrado permanente socializador para a nata aprendiz; e vem quase só com pegadinhas nos vestibas: pedabobos por toda parte!); ensino privado da indústria do ensino para a privada; desde antes e pior ainda nos anos ‘generais’ do nosso Brasil imenso país de romântico e metafórico hino, mas que jamais saiu das palavras... ou dos versos de Dias, Gonçalves; ou ensaiou sair nos anos ‘Vargas’?

Sabe cara, e agora eu falo com o sempre vivo Machado de Assis, o que me deixa louco é um aluno formado em Letras que nunca leu um livro seu de cabo a rabo! Na minha sala tinha só quatro que ousaram. A obra de um homem revela a sua cultura; quem ele é, o que foi, qual o seu país, quem devem ser seus pais, em quem ele vota, quais suas músicas mais lindas. Assim é só olhar o que toca no rádio, ou o que a TV mostra no horário nobre. Ah, Machado, que triste, isso sim que é pecado!


Está claro, pois, que o homem pouco interessa e a obra interessa muito. Sob o rapaz alegre e mais tarde burguês comedido que procurava ajustar-se às manifestações exteriores, que passou convencionalmente pela vida, respeitando para ser respeitado, funcionava um escritor poderoso e atormentado, que recobria os seus livros com a cutícula do respeito humano e das boas maneiras para poder, debaixo dela, investigar, experimentar, descobrir o mundo da alma, rir da sociedade, expor algumas das componentes mais esquisitas da personalidade. Na razão inversa da sua prosa elegante e discreta, do seu tom humorístico e ao mesmo tempo acadêmico, avultam para o leitor atento as mais desmedidas surpresas. A sua atualidade vem do encanto quase intemporal do seu estilo e desse universo oculto que sugere os abismos prezados pela literatura do século XX. E a este propósito é interessante dar um repasso nas diferentes etapas da sua glória no Brasil, para avaliar as suas muitas faces e o ritmo em que foram descobertas (Antonio Candido).


Vá que lá vá! “Rir da sociedade”, acho que foi isso. Os meus professores tiveram medo de se sentirem ridículos demais! Cândido nos descreve agora aqui como a sua atualidade e perspicácia é poderosa. Que era o homem? Ah, mas nas escolas em que estudei o homem era o dono da verdade, o diretor tinha, decerto, para uso e abuso, a verdade absoluta que Machado rebatia com os seus negaceios. Por isso talvez tiveram medo de apresentá-lo a mim.

O importante, no entanto, é que eu fui de encontro à vida, ousado que fui e sou, e assim o encontrei. Deixe-me Machado de Assis, neste seu Centenário, beijar a sua testa e curvar-me à sua frente beijando a capa de Quincas Borba, e ao ‘vencedor as batatas’, assim sou vencedor porque o conheci!

Aqueles contos tiravam-me da casa lá do sítio, tiravam-me do meu quarto, da minha cidade... eu com Machado viajava louco até os abismos do fundo de minha alma de piá-rapaz. Antes foi com Ressurreição, depois a Mão e a Luva, e aquela garota que nascera para mim e tirara as luvas para lavar as mãos; depois, ah aqueles contos diabólicos, de tremer e fazer tremer, como “O alienista”, “A cartomante”, “O enfermeiro”, e todos até hoje vivos em mim, e viva!!!! Adeus professores cruéis da minha terra, dei meu passo à frente!

Depois veio Dom Casmurro, e até hoje sempre, que paranóia, quase desisto de meu casamento por causa de Machado de Assis. Depois a minha esposa, antes bela virgem, foi a Capitu da minha própria história. Ironias do destino ou uma questão de gênios? A Carolina dera também motivos ao nosso mulato mestre das palavras?

No caso de Capitu, penso que ele foi quem antes traiu, ou anteviu a traição e suas possibilidades. Nessa parte Machado apenas, ou muito, entendeu e foi um entendedor da natureza. A possibilidade de superação do protocolo patriarcal, a libertação em Capitu numa traição perfeita; mas ‘crimes perfeitos não deixam suspeitos’, como canta alguém.

E se ela traiu mesmo, e deve ter dado sim, por que não achar lindo isso, em vez de querer punir? de fazer suspense? Ora, a mulher tira as vendas impostas pelo machismo, e as calcinhas baixando as anáguas, e abre os olhos em Capitu: a vida corre e está aí. Bentinho pode querer matar-se, pode sofrer comparando-se com Otelo, pode jurar Capitu de morte, mas não é a voz dele; é a sociedade patriarcal engolindo os seus protocolos e a sua opressão à mulher de 1900. Mulher que era submetida à sociedade das tradições medievais.

Está a questão até mais para Nietzsche do que para os filósofos do mundo das idéias puras... ou para professores e pedabobos retrógrados. Vai sim além, e aqui está o gosto de poder ler Machado de Assis.

Podemos dizer que Ele, o nosso imortal autor, poderia ter desenvolvido outra arte ou coisa, em seu potencial perscrutador da vida e das coisas da vida; mas quem lhe deu espaço à alma, pela habilidade de escrever, foi a Literatura, e soube em sua época perceber que com ela se tornaria imortal.

Por quê? Ora, porque escreveu, e teve seus motivos para ir ao papel: ele quis ser, ousou, e tornou-se assim imortal. Com certeza pela importância que deu à vida, apesar de seu senso crítico e mordacidade para com a sociedade, e pelas traições, M. de Assis era apegado e amava a vida acima de tudo, para desejar em sã consciência a imortalidade alcançada. Isso nega um pouco o pessimismo quanto à existência que lhe é atribuído muitas vezes, em muitas passagens de seus livros poderosos.

Bem, meu caro, eu digo aqui... estive em curso e lendo um pouco, também pensando no M. de Assis e trabalhando seus textos de Dom Casmurro em sala de aula. Assim descubro cada vez mais que ele é inesgotável... saber lá quanto!? Nos livros dele a gente nem percebe que não havia computador, nem automóvel, nem TV, é assim de uma introspecção tal e atualidade, que o atualiza, que parece que o mulatinho irônico está vivo e escrevendo hoje. Não fosse o contexto histórico e M. de Assis seria contemporâneo. Mas logo eu provarei que ele vive e é ainda maior.

Pois, então abaixo o contexto histórico. Outro dia, indo para a casa de minha amante, tive assim a sensação de ser fuzilado pelo seu marido no quarto dela, ao tirar as cuecas e ir com ela em seus lençóis. Claro, foi apenas uma paranóia de “A cartomante”, pois a Terezinha da Tenda de Umbanda tinha me dito, e medito, naquele dia, que estava tudo bem no amor comigo.

Vejo, revejo, releio e coloco o ensaio para esquentar nas brasas-palavras da minha pena e penas. Afinal, não é sempre que temos a satisfação de poder contribuir com uma revista que publica ensaios sobre não os cem anos da morte; mas OS CEM ANOS DE VIDA eterna de Machado de Assis.

Se ele é para mim mais importante que Jesus Cristo, posso fazer um negaceio, se sou cristão, torturado ou não (como Dostoievski, por Bertrand Russel); mas posso agora, para comemorar os seus 100 anos conjeturar: Jesus para ser famoso teve que ressuscitar após a morte (e eis que é bem difícil provar esta questão, sendo gênio ou não); no entanto, Machado de Assis, sem comparações, claro, ele, embora passem anos, décadas e século, não morreu e... parece que perece jamais! (mesmo sendo crucificado por tantos milhões de cidadãos comuns e também por tantos protagonistas da nossa história e da nossa (des)educação). Enfim, digo com o coração e com a razão: – Com o mulatinho amado do Rio e Suas Palavras, que + valem que a Palavra, a crítica brasileira literária pode dispensar a Ressurreição. Palavra!
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O RIO DE JANEIRO DE MACHADO DE ASSIS


José Afonso de Oliveira

Escrever sobre Joaquim Maria Machado de Assis é mesmo um grande privilégio. Viveu, com grandes dificuldades e enormes realizações, os seus 69 anos de vida. Nascido em 1839, no Rio de Janeiro, falece na mesma cidade em 1908.

Menino pobre, morador no morro do Livramento, mulato, epilético, tinha tudo para não ter dado certo na vida. Se um dia estudou, foi por muito pouco tempo. Aprendeu sozinho, tanto o Português, do qual é grande mestre, como também Francês, ciências, enfim tudo o que sabia, o que não era pouco. Portanto, do ponto de vista pessoal, Machado de Assis é um grande vencedor, pois que, tendo tudo para dar errado, tornou-se um grande homem.

Seu nome está imortalizado, não só na Academia Brasileira de Letras, da qual foi idealizador e fundador, como também, através de sua vasta obra literária, ainda utilizada por nossos alunos. Nesse aspecto, talvez possa residir um certo distanciamento dele, pois que nossos adolescentes sendo obrigados a ler Machado de Assis, não o reverenciam como ele merece. Erro de todo um processo educacional que busca obrigar o aluno a fazer coisas que não deseja, pior ainda, sem nenhum conhecimento.

Machado de Assis viveu toda a sua vida, que foi longa para os padrões da época, unicamente na cidade do Rio de Janeiro. Era uma cidade relativamente importante, pois era a capital do Brasil. Ele vai viver o Brasil imperial, escravocrata, atrasado, onde éramos uma imensa fazenda de exportação de produtos agrários para o mercado internacional.

Vivendo essa realidade ele vai imortalizá-la em sua vasta obra literária, onde ele, muito bom observador, trabalha, muitas vezes, o quotidiano das pessoas dessa cidade. É um relato elegante, bonito, de toda uma época que hoje já não existe mais. Restam alguns e poucos vestígios do Rio de Janeiro antigo.

O fausto das grandes casas no centro do Rio de Janeiro e da Cosme Velho deu lugar aos atuais espigões, figuras muitas vezes disformes, esteticamente de muito pouca beleza, se é que existe alguma.

Machado de Assis freqüentava o centro do Rio de Janeiro onde se reunia com intelectuais em algumas livrarias famosas, especialmente na rua 7 de Setembro. Tudo isso hoje é passado.
Ele viveu na cidade que não tinha rede de esgotos, cujos dejetos eram carregados em grandes pipas pelos escravos e depositados no mar. Praias eram sinônimos de lugares indesejáveis, dada essa realidade. Banhos de mar eram entendidos como terapia para determinadas doenças, pode-se perceber que nada se assemelha aos dias atuais.

Ficou o carnaval com os corsos, as brincadeiras, o jogar água nas pessoas, assistir a tudo isso no centro do Rio de Janeiro. Talvez seja essa a única tradição daqueles idos tempos que ainda temos na atualidade, por sinal, no centro da cidade.

Machado viveu nesse Rio de Janeiro, mal cheiroso, que tinha uma enorme quantidade de ratos, transmissores da peste bubônica. Não havia recolhimento de lixo, o que possibilitava o bom viver dos roedores.

Grassava na cidade a varíola, além da dengue e febre amarela. Morar no Rio de Janeiro, dessa época, era risco de vida certo, dada a possibilidade de contaminação de várias e diferentes doenças sérias.

Tudo isso fazia com que navios estrangeiros começassem a evitar o atracamento no porto do Rio de Janeiro, causando grandes prejuízos à aristocracia reinante no país. Isso também preocupava seriamente o governo.

Ao final, Machado assiste a grandes mudanças no país, realizadas no Rio de Janeiro. Vê, mas não se tem notícia de seu envolvimento, o fim do Império e o início da República. É um golpe militar que vai desencadear várias revoltas, pois que os saudosistas do Império desejavam o seu retorno. Machado nunca se pronunciou nesse sentido, e assiste, sem nenhum tipo de envolvimento.

A República tem um compromisso com a modernidade. Tenta-se a instalação de indústrias, em pleno governo provisório, cujo ministro da Fazenda, Rui Barbosa, acaba mesmo desencadeando a primeira grande crise da República com o Encilhamento. Fracassada a idéia original da industrialização, será novamente tentada no governo de Floriano Peixoto e, mais uma vez, temos um fracasso.

Evidente, pois a aristocracia cafeeira, que apóia o golpe militar, deseja o poder e vai conseguir com a eleição presidencial de Prudente de Morais. Até 1930 os aristocratas mandam e desmandam no país, a seu bel-prazer.
Mas estamos próximos a 1908 quando teríamos as comemorações do centenário da Abertura dos Portos do Brasil às Nações Amigas, coincidindo com a chegada do príncipe regente, D. João, toda a corte portuguesa e sua mãe, D. Maria I que estava debilitada mentalmente.

A idéia inicial é realizar uma Exposição Internacional no Rio de Janeiro. Para isso várias medidas terão que ser tomadas, objetivando esse fato. O prefeito, Pereira Passos, concebe uma idéia de modernização do Rio de Janeiro e vai buscá-la no projeto executado na cidade de Paris. É aberta uma grande avenida no centro da cidade, com o nome de Avenida Central, atual avenida Rio Branco, onde estão alguns prédios tradicionais, como a Academia de Belas Artes.

No seu início, temos o belíssimo Teatro Municipal e na sua lateral inicial o prédio suntuoso da Biblioteca Nacional. Assim, nesse espaço é aberta uma grande praça, o Passeio Público, que será o novo centro cultural da cidade.

Bondes elétricos são instalados para o transporte de passageiros. Machado de Assis utiliza esses bondes e fará comentários, especialmente referentes ao barulho que eles provocam, mas também a sua praticidade.
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A ESCOLA DO FUTURO, ANTEVISTA POR MACHADO DE ASSIS

Márcio A.F. Souza


Ela não acreditou que Gabriel estivesse lendo um livro, disse que ele odiava ler livros. Acrescentei que era um livro do Machado de Assis e ela fez uma careta dizendo que quando mandavam ela ler Machado de Assis no colégio ela não conseguia e pedia a uma amiga para lhe dizer qual era a trama do livro, e acrescentou que Machado de Assis era um chato insuportável.
(Rubem Fonseca – Alice, Ela e outras mulheres)

Machado de Assis (1839 – 1908), considerado por muitos o maior escritor brasileiro de todos os tempos, algoz dos estudantes colegiais - não por culpa sua, claro - é natural do Rio de Janeiro. Órfão desde menino, teve uma vida simples e humilde. Pouco se conhece de sua infância e adolescência.

Criou a Academia Brasileira de Letras junto com amigos intelectuais; escolheu como patrono o amigo já falecido José de Alencar. Fundou a cadeira de número 23, e com ela tornou-se imortal das Letras. Ocupou a presidência da Casa por mais de dez anos.

Escreveu poemas, crônicas, contos, peças teatrais, romances. Destacou-se entre os maiores contistas e romancistas da Literatura, a partir do ano de 1881; dessa época são os romances Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó (1904), Memorial de Aires (1908); as coletâneas de contos Papéis avulsos (1882), Várias histórias (1896), Histórias sem data (1899); entre outros.

Entende-se por conto uma narrativa relativamente curta, com número menor de personagens, de espaço, de tempo, em relação à novela, ao romance. (Salvo alguns contos, como: “O Alienista”, Machado de Assis; “A arte de andar a pé na cidade do Rio de Janeiro”, Rubem Fonseca). É, por característica, um texto conciso, em que o narrador dá ao leitor pistas ao longo da história contada. Esta história geralmente tem por trás uma segunda história, que o leitor hábil nota durante a leitura.

O “Conto de Escola”, publicado no livro Várias Histórias (1896), narra a história de um menino, Pilar, que aprende na escola algumas maldades e crueldades da vida, como a delação, a corrupção, o abuso do poder.

Certo dia, Pilar acorda e olha pela janela um lindo dia de céu claro, pensa em não ir à escola, mas lembra-se da surra que levara do pai por fazer dois feriados escolares durante a semana letiva; por esta razão vai à escola. Entra com medo do professor e senta-se. Fica a contemplar o papagaio pela janela. Seu colega de classe, Raimundo, filho do “mestre” Policarpo, pede que lhe ensine um ponto da lição de sintaxe, e junto ao pedido mostra-lhe uma moeda. Que tentação!

Pilar, que já havia ensinado antes ao colega, fica seduzido pela idéia de ter uma moeda e ensina-lhe a lição por meio de um pedaço de papel, durante a aula. Tudo bem até então; só que a cegueira causada pelo desejo não o deixa enxergar Curvelo, colega de classe sentado ao fundo da sala. Este delata os dois, Pilar e Raimundo, ao professor.

O mestre profere um enorme sermão aos dois, joga a moeda pela janela e castiga-os com a temida palmatória. Todos ficam calados, principalmente Curvelo, o denunciante. Pilar senta-se e planeja encontrá-lo na rua para tirar satisfação, porém, Curvelo, o maior e mais velho da turma, não é visto na rua; corre de medo.

Pilar não conta em casa o ocorrido. No dia seguinte sai cedo de casa à procura da moeda pela rua. Não a encontra. No meio do caminho (Ah, Drummond!) encontra a companhia do batalhão de fuzileiros com sua respectiva fanfarra. Tentado pelo tambor, vai atrás dele. E a escola?

Pilar é menino inteligente, bom na escola, capaz de aprender rápido a lição e ensinar ao colega. “Na lição de escrita, por exemplo, acabava sempre antes de todos, mas deixava-me estar a recortar narizes no papel ou na tábua”. Mesmo bom aluno tinha medo do “mestre” pela severidade, pelo rigor com que tratava a disciplina em sala de aula; os alunos ficavam quietos, com medo da palmatória. A escola hoje não tem a palmatória, mas têm as notas, as faltas, os telefonemas aos pais.

A escola deveria ser um lugar para trocar conhecimentos, fazer amizades, aprender a respeitar e a ser respeitado, aprender conteúdos vigentes para toda a vida. Mas não, nosso mestre nos ilustra uma escola em que as teorias pedagógicas não existem. Hoje elas existem, e mesmo assim as escolas mantêm à força os alunos na linha. Pois bem, o bom aluno ajuda o mau aluno, e o que recebe em troca é uma sova de palmatória.

O professor entra, senta-se, manda os alunos abrirem seus livros e começarem a fazer a lição. Não ensina. Não explica. Não tira dúvida. Senta e lê o jornal. Ele não conhece a turma, com certeza! “O pior que ele poderia ter, para nós, era a palmatória. E essa lá estava, pendurada do portal da janela, à direita, com os seus cinco olhos do diabo.” Que professor é esse? Que escola é essa onde o aluno não tem coragem de pedir ao professor que explique novamente o conteúdo?

O menino Pilar sente-se tentado ao ver a moeda na mão de Raimundo. “Respondi-lhe que estava caçoando, mas ele jurou que não.” E então parte para reflexões sobre o porquê da moeda, se era para garantir que lhe ensinasse direito, sem má-fé. Em primeira instância, não pensou estar errado em aceitar a moeda, achava justo, “na troca de lição e dinheiro, compra franca, positiva, toma lá, dá cá; tal foi a causa da sensação.”

Observe os termos “compra franca”, “positiva”, “tal foi a causa da sensação”. Não há maldade no pedido e muito menos em aceitar. Não aceita só pela moeda, mas para ajudar o menino. “Se me tem pedido a coisa por favor, alcançá-la-ia do mesmo modo, como de outras vezes”. Pilar foi bom amigo de Raimundo em ensinar a lição, pois sabia o castigo que receberia do pai o colega.

Um menino em sala de aula com dificuldade de aprendizagem, tendo como professor o próprio pai, é obrigado pelo medo de ser castigado a ficar quieto, a recorrer ao colega para aprender um ponto da lição. É certo que é muito difícil um aluno levantar a mão e pedir ao professor que repita a explicação nas escolas, hoje, pois, não é o professor quem censura, quem utiliza a palmatória, e sim as vaias dos colegas.

Descoberto (delatado) o negócio, os dois alunos são chamados à frente para esclarecimentos.

Policarpo bradou de novo que lhe desse a moeda, e eu não resisti mais, meti a mão no bolso, vagarosamente, saquei-a e entreguei-lha. (...) Acabou, pregou-nos outro sermão. Chamou-nos sem-vergonhas, desaforados, e jurou que se repetíssemos o negócio, apanharíamos tal castigo que nos havia de lembrar para todo sempre. E exclamava: Porcalhões! tratantes! faltos de brio!

Interessante notar o tratamento dado pelo professor aos alunos. Poderia ter perguntado o que não havia compreendido seu filho, parabenizar o colega por ter ensinado ao outro, mas não, brigou, insultou, xingou, humilhou os meninos diante da turma. Isso sim é didática do medo, da ameaça, do rebaixamento.

O delator, Curvelo, tremeu de medo, e no fim da aula saiu e não foi visto pelas ruas ao redor da escola. Este era o maior e mais velho da turma; provavelmente, o mais covarde.

Antes do castigo, o menino acreditava não haver maldade no negócio, porém, depois, “a pratinha era bonita e foram eles, Raimundo e Curvelo, que me deram o primeiro conhecimento, um da corrupção, outro da delação”.

Interessante notar que o castigo fez o menino acreditar que tinha mesmo feito algo ruim, contra as normas e valores. Acrescente-se aos conhecimentos do jovem o abuso de poder. O professor tem o poder maior em sala de aula. E algo tem mais poder que ele dentro da sala: a palmatória! Hoje são os diários!

O tempo se encarrega das mudanças!

Quando se pensa em escola, em primeiro lugar, vem à mente amizade, aprendizagem, companheirismo, respeito, troca de informações e de conhecimentos. No entanto, não é isso que nos mostra o “Bruxo da Cosme Velho”.

O texto literário abre portas para discussões a partir de diversos aspectos intrínsecos. Neste caso foi a escola. A maneira como a escola é, o professor como ditador das regras, os alunos abaixando a cabeça e respondendo ao livro. Não há ensinamento.

Não se parte dos clássicos, chega-se aos clássicos!
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O LEITOR DE JORNAIS EM QUINCAS BORBA
Martha Ribeiro Parahyba
Ao tomar às mãos uma obra machadiana sempre chama atenção o tipo de leitura que se tem em mente, pelas inúmeras possibilidades que a obra permite. Entretanto, ao pensar no modo como fazê-la, uma questão de fundo parece sobrepor-se, no que se refere às diferenças quanto ao ato de ler, que se dão em esferas mais amplas do que apenas aquela que, de modo geral, supõe-se, de ler mais devagar ou mais rápido, ler em voz alta ou em silêncio, com mais ou menos cuidado. Há em cada leitor modos de ler cuja singularidade diz muito, não só sobre a compreensão do texto, mas também sobre o território em que circulam tais maneiras de ler.
Um grande número de práticas de leitura consolidou-se no século XIX em decorrência da expansão do número de alfabetizados. Da leitura oral, em público, à silenciosa, no recato do lar, os novos modos de ler adaptaram-se às possibilidades que a população encontrou para vivenciar a experiência da leitura. O número de pessoas alfabetizadas expandiu os horizontes da leitura, criando uma demanda crescente por acesso à informação rápida e diversificada, o que possibilitou o surgimento um novo tipo de leitor, o leitor de jornais. O leitor de jornais constituiu-se em figura muito comum nos romances e uma clara representação do modo do autor compreender a leitura em sua própria época.
Esse território, por onde circula os jornais, nos diz da época, da maneira e de como se dão diferentes possibilidades de leitura. Para cada uma das sessões do periódico um modo de ler privado, e cercado de circunstâncias particulares, possibilita o reconhecimento dos movimentos culturais apenas pela observação de seus gestos. Daí a uma variedade significativa de modos de ler resulta em costumes distintos em relação aos escritos, que nascem e morrem em consonância com tantas outras práticas sociais. No interior dessas práticas culturais, alguns dos costumes ligados aos hábitos da população permitem a reconstituição de cenas íntimas, familiares, muitas já ultrapassadas.
São essas cenas, captadas pelos escritores, que permitem revelar traços de práticas de leituras realizadas, e deixam ver um cenário bastante complexo, que de outra forma poucas chances haveria de serem conhecidas. Essas práticas de leitura, identificadas por Roger Chartier como representação das formas como as pessoas se apropriam dos textos escritos e como lhe atribuem significação em razão de sua experiência de vida e do contexto sociocultural em que vivem, podem também oferecer uma panorama de como a sociedade, em um dado momento se utilizou dos escritos.
É o que se pretende aqui comentar, a presença dos leitores de jornais na obra Quincas Borba, de Machado de Assis, publicada em 1891. As cenas de leitura, reveladas sob o olhar da galhofa machadiana, mostram como os jornais eram lidos, produzidos, considerados, e evidenciam costumes sociais muitas vezes estranhos ao nosso tempo.
Para Chartier, um dos modos de descobrir a pluralidade de usos, coletivos ou individuais acerca da leitura, é por meio das representações que cada autor, a partir de suas próprias referências, individuais e sociais, constrói a figura de leitura desejada. Nas obras do século XIX, essas figuras de leitor podem ser encontradas, e entendidas, como símbolo de um período em que a leitura floresceu com uma significação do desenvolvimento cultural do país. A conquista do saber ler pressupunha a entrada em uma cultura já penetrada e trabalhada pelo escrito.
Desde o final do século XVII já se tem notícia da febre dos jornais não só entre os burgueses, mas também pelo avançado interesse das camadas sociais menos favorecidas. O leitor de jornais, diferentemente dos leitores de livros, introduziu novas formas de se relacionar com o impresso, que modificou a circunspecção das leituras silenciosas, com atitudes inesperadas, ao sabor das inúmeras sessões, ampliando o campo de ação do leitor e oferecendo mais liberdade para usufruir do escrito. Mais livre para ler, o jornal podia ser colocado em qualquer lugar e lido de qualquer maneira.
A atração que os jornais exerceram, alcançaram leitores ansiosos por atualidades, por informações de acontecimentos recentes, políticos e eclesiásticos, literários e econômicos e os leitores reagiram a esses modos de ler, com maneiras singulares. Uma nova moda na leitura, que se expandiu pela Europa, atraindo todas as clamadas e classes da sociedade, muitas vezes até suplantando outros tipos de leitura, significou muito para uma sociedade nascente como a carioca, que pretendia esta a par da moda européia.
Os leitores, em Quincas Borba, oferecem figuras exemplares de uma prática social, cujo efeito mais curioso foi o fato de evidenciar, nas situações cotidianas das personagens, as circunstâncias em que se davam as leituras dos artigos de jornais e os modos como as notícias eram recebidas. Com efeito, Rubião, ao ler os jornais, cuja assinatura ainda pertencia a Quincas Borba, viu a notícia da morte do amigo. Em dois curtos capítulos, o leitor é informado da demora dos jornais em chegar às cidades distantes da Corte e da alteração dos fatos em benefício da imagem do homem que há pouco morrera.
No começo da semana seguinte, recebendo os jornais da Corte (ainda assinaturas do Quincas Borba) leu Rubião esta notícia em um deles:
‘- Faleceu ontem o Senhor Joaquim Borba dos Santos, tendo suportado a moléstia com singular filosofia’(...)
Acabou de sofrer! suspirou Rubião. Em seguida, atentando na notícia, viu que falava de um homem que tinha apreço, consideração, a quem se atribuía uma peleja filosófica. Nenhuma alusão à demência. Ao contrário, o final dizia que ele delirava a última hora, efeito da moléstia (p. 24).

Os periódicos sucediam-se com uma mescla de notícias e informativos econômicos, consolidando-se como uma leitura respeitável, o que significava a expressão de prestígio para a aquisição de informação. Entretanto, as restrições impostas à escolarização feminina em muito reduziu o campo de atuação da mulher, no que se refere à leitura. Muitas das obras literárias chegam a mencionar o desnecessário empenho em ensinar a ler às meninas, apontando mesmo os prejuízos da leitura para as mentes frágeis. Num panorama de pouco estímulo à leitura, a presença freqüente de mulheres leitoras em Quincas Borba, não só surpreende como esclarece as possibilidades em que poderiam acontecer. Um desses momentos em que duas figuras de leitor de jornais se mostram é o momento em que o Palha e Sofia aguardam o almoço, a leitura do jornal, por alguns momentos, torna-se um flagrante do cotidiano, do século passado, dos diferentes modos de ler. Sofia, ao lado do marido, em pé, ouve as notícias resumidas e explicações que esse lhe dá. Ela representa a leitora – ouvinte – ainda que a contragosto, desinteressada do assunto, muito próxima de um estereótipo de leitora bastante difundido.
Banhado, barbeado, meio vestido, Palha lia os jornais, à espera do almoço, quando viu entrar a mulher no gabinete, um tanto pálida.
Está pior?
Sofia respondeu com um gesto dos lábios, que tanto negava como afirmava. Palha acreditou que, pelo dia adiante, passaria o incômodo; a agitação da véspera, o jantar tarde... Depois, pediu que lhe deixasse acabar de ler um artigo relativo a certo negócio da praça. Era uma briga entre dois comerciantes, a propósito de uns saques; na véspera escrevera um deles, hoje vinha a resposta do outro. Resposta completa, disse ele acabando a leitura; e explicou longamente à mulher a questão dos saques, o mecanismo da operação, a situação dos dois adversários, os boatos da praça, tudo com o vocabulário técnico (p. 60).
A publicação de um jornal está diretamente ligada à produção de matérias que atraiam a atenção dos leitores, tal como explica Camacho para Rubião, no capítulo LXI, “Em assinaturas a folha ia bem. O que ele precisava era de material tipográfico e desenvolvimento no texto; ampliar a matéria, pôr-lhe mais noticiário, variedades, tradução de algum romance para o folhetim, movimento do porto, da praça, etc. Tinha anúncios, como viu”(p. 70). As dificuldades para os jornais eram as notícias do cotidiano, atualizando o leitor ansioso por informações diárias. Assim, a notícia do incidente de Rubião, impedindo que um menino não fosse atropelado por uma carruagem desenfreada, dada a Camacho numa conversa informal, transforma-se pela ação do jornalista em manchete da folha Atalaia. Sem distorcer, arruma os fatos de tal maneira que dão ao feito um caráter heróico.
Rubião, durante a leitura dos jornais diários, é visto no aconchego familiar do quarto, ainda na cama, a busca casual dos periódicos, a fim de pôr-se a par das notícias, Na cena em que o seu nome faz parte da manchete, mais do que uma notícia, descreve-se uma prática que se tornou rotineira da vida de milhões de leitores: os jornais caídos ao pé da cama, dos modos de ler aleatoriamente, da leitura aos pulos, do café da manhã ainda com os jornais nas mãos. Dos diferentes significados a atribuir ao cenário que se vai impondo no século XIX e passa a dominar as práticas sociais de toda uma sociedade letrada.
De manhã, na cama, teve um sobressalto. O primeiro jornal que abriu foi A Atalaia. Leu o artigo editorial, uma correspondência, e algumas notícias. De repente, deu com o seu nome.
– Que é isto?
Era o seu próprio nome impresso, rutilante, multiplicado, nada menos que uma notícia do caso da Rua da Ajuda. Depois do sobressalto, aborrecimento. Que diacho de idéia aquela de imprimir um fato particular, contado em confiança? Não quis ler nada; desde que percebeu o que era, deitou a folha ao chão, e pegou outra. Infelizmente, perdera a serenidade, lia por alto, pulava algumas linhas, não entendia outras, ou dava por si no fim de uma coluna sem saber como viera escorregando até ali.
Ao levantar-se, sentou-se na poltrona, ao pé da cama, e pegou da Atalaia. Lançou os olhos pela notícia: era mais de uma coluna. Coluna e tanto para coisa tão diminuta! Pensou consigo. E a fim de ver como é que Camacho enchera o papel, leu tudo, um pouco às pressas, vexado dos adjetivos e da descrição dramática do caso.(...)
Ao café, pegou novamente na folha, para ler outras coisas, nomeações do governo, um assassinato em Garanhuns, meteorologia, até que a vista desastrada foi cair na notícia, e leu-a então com pausa (p. 74).
A visão do leitor de jornais, em Quincas Borba, tem várias e impensáveis funções. O que significava, para Machado de Assis, o leitor de jornais: o brasileiro-leitor que demarcava suas práticas sociais e ocupava seu lugar no tempo?
De toda forma, o objeto impresso significava, para a sociedade brasileira, a presença de um leitor, solitário e silencioso, entre cujos hábitos estava o da leitura, a indicar um longo processo de uma prática de leitura em voz alta e em público para uma leitura essencialmente individual, particular. E com isso, a constituição de novos modos de se comportar com o texto impresso tomaram conta dos leitores, mais íntimo e mais reservado, criando-se não só a possibilidade de se ler mais rápido e textos mais complexos, mas também de formar uma nova categoria de leitores – as mulheres.
Nas páginas de Quincas Borba é possível encontrar algumas das práticas culturais de brasileiros que tentavam reduzir as distâncias de uma sociedade letrada.
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OBSERVAÇÕES, DIVAGAÇÕES, RELIGIOSIDADES: MACHADO DE ASSIS E OUTROS GÊNIOS

José Nami Sobrinho

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro, no morro do Livramento, no dia 21 de julho de 1839. Segundo Drumond de Andrade, é o “Bruxo do Cosme Velho”. Machado de Assis é paradoxo literário, é mistério que a criação nos envia. Outros gênios farão parte do tema, mas aqui, a roda viva girará em torno do “bruxo”.
Embora Machado tenha escrito numa crônica, datada de 05/out./1885, que fora levado em espírito à sala da Federação Espírita Brasileira, para assistir a uma conferência, e que, de volta, vira seu corpo sentado, sua cara rindo, suas pernas cruzando de um lado para outro, e que houve um diálogo, e então, a nova personalidade agora ali presente de posse do seu corpo nada mais era que a personalidade do diabo a descansar um bocadinho.... Embora o diabo permitisse-lhe novamente o reingresso em seu templo de direito – nada mais fica explícito sobre sua verdadeira religião doutrinária. Referências sobre sua mentalidade reencarnacionista, apesar de ter sido sacristão e aprendido seus primeiros passos literários com o padre Silveira Sarmento... sim, mas sobre sua verdadeira religião doutrinária, há um ponto de interrogação no ar, pelo menos aos mais afastados do seu convívio, e uma só certeza – Machado não era ateu como muitos apregoam. Quando ainda absorvia a perda de sua meiga Carolina que o acompanhou durante trinta e cinco anos, há um trecho visível em uma carta endereçada a Joaquim Nabuco: “(...) Aqui me fico por ora na mesma casa, no mesmo aposento, não gastarei muito tempo em recordá-la. Irei vê-la, ela me esperará (...)”; observação nítida de que aqui não havia em Machado aquela disposição de foro íntimo em seguir certos filósofos ateus, ou mesmo alguns escritores ateus e suicidas de seu tempo, como Eça de Queirós ou Antero de Quintal.
Machado ri do poeta Henrich Heine, discípulo do prussiano Hegel, quando Heine levanta uma linha filosófica de que foi o homem quem criou Deus... Ri através do semi-demente Quincas Borba lá no humanitismo do capitulo CXVII do romance Quincas Borba, quando este inventa uma falsa doutrina filosófico-religiosa denominada “O Humanitismo”. Há no primeiro parágrafo até uma gênesis, e no terceiro encontramos o seguinte: “(...) nota que eu não faço do homem um simples veículo de humanitas; não; ele é ao mesmo tempo veículo, cocheiro e passageiro; ele é o próprio humanitas reduzido; daí a necessidade de adorar-se a si próprio (...)”. Ora, não há Deus em “O Humanitismo”, todas são deuses..... Quincas Borba é o maior deles; é o maior homem do mundo por ter formulado tal filosofia (Cap.VI de Quincas Borba). Houve a Gênesis no primeiro parágrafo e “Humanitas maior” desapareceu, foi só um referencial, um parto inicial para gerar humanitas que se dispersaram para todo lado.... Quincas Borba formulou tudo... é o maior homem (deus) do mundo... O termo “Humanitas” é ironia a August Comte com sua religião da humanidade tendo como base razão e filosofia daí a caricatura humanitas....
Há mais duas crônicas interessantes sobre o assunto de algum cunho religioso: uma cujo título é “Ainda sobre Espiritismo” datada de 11/out/1885 portanto, seis dias após a primeira supracitada e outra; denominada “Caso de Bigamia” datada de 23/ set /1894.
Em “Ainda sobre Espiritismo”, Machado continua suas fantasias irônicas, seus sarcasmos propositais em poder ser admitido no grêmio espírita, poder se inspirar em potencias invisíveis (mistificação) e fundar uma igreja filial, obtendo um bom contingente de almas em poucos meses; porém, esbarra no código de posturas da Comarca Municipal de Santo Antonio de Pádua, sujeito a aprovação da assembléia provincial do Rio de Janeiro, em cujo art. 113, ele diz ter encontrado o seguinte: “Fica proibido fingir-se inspirado por potências invisíveis, ou predizer coisas tristes ou alegres”. “Os fiscais de Santo Antonio de Pádua não podem saber quando é que a gente finge, ou é deveras inspirado. Jeremias que lá fosse, e o seu secretário Baruch (influência literária de teor bíblico) podiam dizer pérolas, iriam ambos para a cadeia, porque o art. 113 não explica por onde é que se manifesta a simulação”.
Aqui novamente Machado sai pela tangente, não se compromete e apresenta uma desculpa para não explicar o que para muitos é inexplicável, dizendo nesta crônica: desfiz tudo, a alma, a mala e as algibeiras...
“Em caso de Bigamia”, Machado continua rindo de tudo, vejamos um caso sobre a teoria da transmigração das almas de um corpo para outro, (metempsicose) onde ele ironiza, e com razão, o caso de um burro que enlouqueceu e os destroços que aprontou até achar a morte.
“(...) Ora esta loucura do burro mostra claramente que o infeliz perdera a razão. Que espírito estaria encarnado nesse animal, amigo do homem, seu companheiro, e muitas vezes seu substituto? Talvez um gênio. A prova é que o perdeu. Com quatro pés, não pode entrar onde nós entramos com dois (...)”
Há muitas outras passagens relacionadas a mentalidades reencarnacionistas, ou tentativas de desmitificação religiosa em Memórias Póstumas de Brás Cubas, Dom Casmurro e Quincas Borba, senão, vejamos:
Em suas Memórias Póstumas, Brás Cubas usando de metalinguagem, de início, “Cá do outro mundo”, envia ao leitor em seu prólogo, uma nota, uma espécie de bilhete sobre como será o método empregado na confecção do livro, citando a influência de três outros “grandes” da literatura universal: Stendal, Sterne e Xavier de Maistre.
Stendal (Vermelho e o Negro) precursor do romantismo psicológico, misto de sensualidade e racionalismo. Laurence Sterne (1713 / 1768), autor de Tristan Shandy, onde o herói é construído nos três primeiros volumes e só aparece no capítulo VI. É irônico, criador do caráter digressivo, onde a narrativa é não linear e se afasta da linha central. Quanto a Xavier de Maistre (1763 / 1812) é outro escritor francês de ironia e humor, autor de Viagem à roda do meu quarto.
Em Dom Casmurro no cap. XLVI denominado as pazes, no último parágrafo encontramos algo assim: (...) Capitu alegava a insônia, a dor de cabeça o abatimento do espírito e finalmente, “os seus calundus” (...) Ora, “Calundu” na Quimbanda, no culto Banto, é divindade; é ente sobrenatural que dirige os destinos humanos e, entrando no corpo de uma pessoa, a torna triste, nostálgica, mal humorada...
Há no romance Quincas Borba, nos capítulos XXXIX, XL, XLI e XLIII a cena do jardim, em que Sofia e Rubião estão juntinhos e Rubião se declara. O major Siqueira, amigo do casal Palha, mais indiscreto que nunca, supõe que no mínimo há uma cena de adultério sentimental. Rubião sai dali todo confuso com medo de que a coisa se torne pública. No cap. XLV dá por si na Praça da Constituição. Viera andando à toa. No Cap. XLVII entra num tílburi e manda tocar para Botafogo. Na esquina da Rua dos Ourives, deteve-o um ajuntamento de pessoas e um préstito singular: juiz, padre, soldados, curiosos e um homem trajado de preto lendo a sentença do enforcamento de dois pretos – um assassinato em Mata Porcos. O préstito seguia pela rua dos Ourives, Aljube e Largo da Moura. Rubião não queria ver a execução. Sem reparar, deu consigo no largo da execução. Havia bastante gente. No instante fatal, o réu esperneia, contrai-se e o algoz cavalga de um modo destro e airoso. Rubião dá um grito e não vê mais nada.
Destaco no capítulo XLVII, uma frase interessante que mais adiante irei comentá-la. A frase é esta: “Note-se bem que Rubião nada sabia desse rapaz antigo”... No capítulo XLVIII Rubião está indo para casa, o cocheiro conversa com ele e vem as idéias de mentepsicose: Quem não sabe que cavalo e cachorro são animais que mais gostam da gente? Cachorro parece que ainda gosta mais.... Cachorro trouxe à memória de Rubião o Quincas Borba que lá devia estar em casa, à espera dele. Rubião não esquecera a condição do testamento. Ocorreu-lhe que o Quincas Borba (cachorro) e o Quincas Borba (defunto) poderiam ser a mesma criatura por efeito da entrada da alma do defunto no corpo do cachorro. Uma preta de São João d’El-Rei foi quem lhe meteu na cabeça quando criança essa idéia de transmigração. Dizia ela que a alma cheia de pecados ia para o corpo de um bruto; chegou a jurar que conhecera um escrivão que acabou feito gambá...
No capítulo XLIX Machado escreve que Rubião ganhou até uma particularidade entre os incrédulos, chegava a ser incrédulo... Mas, há dúvidas na mente de Rubião quando olha o cachorro Quincas Borba mirando para ele com o olhar meditativo tal qual o filósofo Quincas quando examinava negócios humanos...
Por fim, Rubião entrou, despiu-se e deitou-se, lembrou das sensações que tivera durante o dia, desde o almoço com os “amigos” Carlos Maria e Freitas, quando aí, recebera o bilhete redigido pelo próprio Palha copiado e assinado por Sofia. Jamais imaginou que aquela redação era do Palha... Sofia! Sofia! Sofia! Beijava a folha de papel... lembrou até aquela última idéia de mentepsicose passando pela cena do enforcado e foi dormir antes das quatro.
Eis a questão: ouço dizer que Rubião foi dormir com medo de que a alma de um dos pretos viesse a reencarnar-lhe: “Rubião nada sabia desse tal rapaz antigo diante das feras”, é referente a Alípio e não a um dos pretos. Alípio a quem se referiu Machado, nasceu em Tagaste, hoje, atual Argélia. Era amigo de Santo Agostinho e também é considerado Santo. É festejado no dia 15 de agosto. Quando moço, tinha tentações em assistir aos jogos violentos das arenas. Rubião era descrente fosse crédulo e entendesse um pouquinho de Candomblé, saberia o seguinte: No verdadeiro Candomblé, segundo os entendidos, chama-se a divindade e não o espírito. Recebe-se a divindade e não o espírito. Recebe-se um passe de Exu para que o Egun (espírito do morto) não venha. Quem trabalha com candomblé, tem receio daquele que morreu recentemente, isto é, fez passagem, principalmente, se foi seu inimigo em vida. O morto pode se vingar se conheceu seus podres...
Candomblé não trabalha com espíritos, não tem nada ver com espiritismo. Quando se evoca os antepassados, não há incorporação. Os Orixás é que fazem a intermediação entre o Deus criador e o homem, porém, permanecem num nível superior. Logo, se um dos pretos enforcados fosse inimigo de Rubião, haveria motivos para que Rubião fosse dormir com medo, ou, no mínimo, procurar um terreiro de Candomblé para receber um passe de Exu...
Lembremo-nos que Umbanda, Quimbanda e Candomblé, são cultos afro-brasileiros todos amparados pela constituição da República Federativa do Brasil, está lá no art. 5º parágrafo VI: é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida na forma da lei a proteção nos locais de culto e suas liturgias. Polêmicas e controvérsias surgem: Que atitudes tomar quando se mesclam cultura de morte e fundamentalismo religioso? Por exemplo, há o caso das mutilações covardes e brutais que põe em risco a saúde, a fertilidade, e a própria vida da mulher em pelo menos trinta países em sua maioria muçulmanos das Áfricas Ocidental e Oriental. E que dizer da pena capital para casos de adultério e mães solteiras desses mesmos países? No Brasil, se é que a Amazônia ainda nos pertence, há o relativismo cultural de algumas tribos infanticidas que praticam verdadeiros genocídios condenando recém-nascidos de mães solteiras ou portadores de deficiências físicas ou mentais à morte. Enterra-os vivos, pisoteia-os até a morte. Tal incumbência, desgraçadamente, cabe às mães ou membros da própria família. A “madame morte” permanece ao lado do Pagé e dá-lhe amplos poderes através do temor e terror brutal.... Maldição dizem eles.... gêmeos, trigêmeos e assim por diante, todos mortos.... o argumento é simples; só os bichos podem ter mais que um filho de uma vez só. Ora, o caso é tão obscuro que o Pagé que tudo sabe sobre cura e mundo oculto dos espíritos, num caso de gêmeos, não consegue desvendar qual deles é o maldito.... que grande farsa cultural religiosa para dar poder e controle ao “chefe”...
A história da Índia se resume na distribuição de castas, multiplicidade de divindades e mentepsicose. Isso tudo, dá amplos poderes às castas das elites. As castas inferiores são intocáveis, não há ascensão social na Índia.
A transmigração das almas tem tanta influência sobre a vida do indiano, que em determinados templos, os ratos recebem tratamentos especiais, pois crêem que ali, estão encarnados seus antepassados. A vaca é tida como mãe-deusa. Sua urina é bebida para purificar a alma... Adoram as cobras que matam 20.000 indianos por ano. Para os Indus a morte é simples passagem... Tudo é ilusão... tudo é maia... Só Brahma o “deus sonhador” é real, mas seu sonho para iludir aos ignorantes é irreal... por isso; as viúvas que vêem queimar os esposos que amavam, lançam-se na pira funeral de seus maridos crendo, que a eles, se unirão em outra existência...
Larson e Césare Cantú catalogaram cenas extravagantes do hinduismo: Em Puri no famoso Festival dos carros, o ídolo de Jagrenate magnificamente vestido é colocado na ocasião da solene procissão de Junho, sobre um grande carro, no qual, vai uma torre de sessenta pés de altura. A torre quando puxada pelos fanáticos, avança com muito custo e com grande estrondo; as rodas gemem debaixo do peso dessa enorme massa deixando na terra profundos sulcos. Alguns fanáticos, considerados mais santos, num impulso suicida; jogam-se debaixo dos carros, que carregam as deidades; outros, limitam-se a fazer esmagar os braços e as pernas. A religião diz que uma libação de sangue agrada ao deus...
Fixemo-nos ao foco principal que é a genialidade de Machado de Assis. Tais digressões expostas servirão como premissas para comentar os excertos de dois testos aqui transcritos: Encontramos no segundo parágrafo de “O Humanitismo” referente ao Bramanismo o seguinte. (...) Explicou-me que, por um lado, o “Humanitismo” ligava-se as “Brahmanismo”, a saber, na distribuição dos homens pelas diferentes partes do corpo de “humanitas”; mas aquilo que na religião indiana tinha apenas uma estreita significação teológica e política, era no humanitismo a grande lei do valor pessoal. Assim, descender do peito ou dos rins de humanitas, isto é, “ser um forte”, não era o mesmo que descender dos cabelos ou da ponta do nariz. Daí a necessidade de cultivar e temperar o músculo. Hércules não foi senão um símbolo antecipado do humanitismo (...)
Observemos agora, segundo o italiano Césare Cantú, no segundo volume de Stória Universale pg. 85, traduzido por Savério Fitipaldio o seguinte: (...) segundo a lenda, Brama gerou primeiro quatro filhos: o primeiro da boca, o segundo do braço direito, o terceiro da coxa direita, o quarto do pé direito. Deles, nasceram as quatro raças, entre as quais Brama proibiu toda a mistura; ele escreveu na testa de todos os homens que devia suceder do nascimento até a morte.
Desse paralelo, notamos que na filosofia de Quincas Borba, apesar de ensandecido, há mais coerência democrática em seu sistema filosófico – religioso que essa magia negra, essa hipnose bárbara e coletiva implantada na Índia. Curiosamente, Machado ironiza a multiplicidade de deuses da Índia e seus contemporâneos filósofos querem retirar Deus Eterno do contesto, para que assim, obtenham mudanças de poderes políticos no mundo.
Os conflitos religiosos de Hegel eram puramente espirituais, não acreditava na imortalidade da alma e queria transformar ciência em religião. Marx absorve a filosofia Hegeliana e a transpõe para o lado social. Surgem os regimes totalitários idéias de negação de Deus é que geraram as duas grandes guerras.
Voltemos às ironias: enquanto no Bramanismo as castas mais elevadas se originam da face de Brahma, os intocáveis, os inferiores, são frutos dos pés. Aqui no humanitas de Machado de Assis, descender dos rins de humanitas isto é, “ser um forte”, não é o mesmo que descender dos cabelos ou da ponta do nariz (ser um fraco) mas, se você nascer fraco, poderá vir a ser forte; é só temperar o músculo (alusão a temperar o aço) neste caso específico, atualmente, segundo o paralelo irônico, é fazer musculação, freqüentar academias para obter um corpo forte, para ai sim, ascender de posição, mesmo nascendo numa casta inferior (fraco) (Hércules não foi senão um símbolo antecipado do humanitismo). Constatamos aqui que Machado estava mais para Buda quando este fez oposição ao sistema de castas da índia... Isso tudo, demonstra que Machado não só era contra a perseguição religiosa em todos os sentidos, mas a qualquer imposição que afetasse a liberdade de expressão e consciência do ser humano.
Quando Igreja e Estado eram aliados Machado fustigou duas folhas católicas do Rio de Janeiro – A cruz e o cruzeiro do sul. Deixou claro que não estava se opondo a Deus, mas a alguns redatores que na visão dele se faziam proprietários de Deus. Machado de Assis (séc. XIX) e Blaise Pascal (séc. XVII) não são contemporâneos, mas retirando-se da época de Pascal, certas aberrações vigentes como: intolerância e fanatismo religioso, que, em nome de Deus e da fé, promovem censura, perseguição, condenação e morte aos adversários; há no sincretismo e mistério religioso de Machado de Assis, quando faz Brás Cubas atravessar paredes para contar sua história, uma certa equivalência no dizer de Pascal, que; a fé é melhor guia que a razão.
Para o físico, matemático e homem das letras clássicas Blaise Pascal a fé não tem limites há um infinito a se desvendar. Já por outro lado, a razão, esta sim, é limitada.
Pascal critica a visão carteziana ao afirmar: “como gosto de ver essa soberba razão humilhada”. Apoiava-se na matemática intuitiva; na matemática transcendental. Não ficava preso à geometria limitada e analítica de René Descartes, mesmo sabendo que Descartes acreditasse na imortalidade da alma, pois, para Descartes, a alma estava escondida dentro da glândula pineal, situada no istmo do mesencéfalo, dentro do cérebro. Há correntes espiritualistas que crêem neste canal de ligação entre o homem e Deus, bastando para tanto, desenvolvê-la.
Tenho em mãos a filosofia da composição feita por Edgar Allan Poe e notadamente, várias justificativas de como foi feito seu poema “O corvo”. Poe começou de trás para frente, assim também como já o fizera, segundo Barnaby Rudge, Godwin, quando escreveu seu Caleb Willians. Machado fez isso tudo mas foi além: Num tempo em que o matemático e astrônomo alemão Carl Friedrich Gauss, intimidado com a velha guarda dos “tacanhos beócios” que acreditavam na natureza sagrada das três dimensões altura, largura e profundidade, ao ponto de manter secreto alguns dos seus mais excelentes trabalhos, Machado com sua lentidão, faz Brás Cubas retroceder da quinta dimensão (quinta?[já há físicos por aí teorizando dez{teoria do Hiper Hespaço do físico americano Michio Kaku}]), e, tal qual um neutrino, quando da explosão de uma estrela, capaz de consumir o tempo (quarta dimensão), vem contar sua história; atravessando Catumbi, Tijuca, Guanabara, Europa, Rio de Janeiro... conta-a lentamente, conta-a com toda fleuma irônica, e; às vezes, pessimista, mas; de um leve senso de humor britânico...
Há vários tons em Machado: Melancólico, nostálgico, fúnebre, religioso, filosófico. Há muito de Shakespeare, muito do undiscoveres country de Hamlet em todos os sentidos.
A lentidão de Machado em seus romances do realismo é oposta à velocidade espantosa de Dostoievski, este; encarna a alma do povo Russo; fotografa mais, aquele; entra na alma do povo brasileiro com suas religiosidades e crenças; penetra sutilmente e vai fundo na alma muitas vezes hipócrita da sociedade Imperial e escravocrata de época – fotografa menos é certo, o tom é branco e preto, mas você pensa muito mais...
Machado tem mais receios em falar de Deus que do diabo... porém, seu temor a Deus é fé... Dostoievski acompanha o misticismo cristão do povo Russo, é incisivo diante dos anti-liberais: “se me provassem que o Cristo está fora da verdade, se é certo que a verdade está fora de Cristo, eu preferiria ficar com o Cristo a ficar com a verdade”. Diante do pelotão de fuzilamento há ordens superiores para que não seja executado é condenado a serviços forçados na Sibéria...
Os dois trazem a bíblia como livro de cabeceira. Os dois são epiléticos... Machado ainda é mestiço o que para os padrões da época, representa um peso social negativo, uma certa marginalidade social; Ora, hoje sabemos que quanto mais mestiço, mais brasileiro somos... mas, Machado ainda é gago... Eugênia em Memórias Póstumas de Brás Cubas é coxa e pobre, assim, para a perpetuação da espécie segundo a seleção natural de Darwin e algumas teorias equivocadas de Herbert Spencer... Machado teria que vir com essa ironia: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”.
Há no romance, uma certa engenhosidade mística nos capítulos LXXXIII e CX envolvendo a trilogia amorosa: Lobo Neves, Virgilia e Brás Cubas.
Lobo Neves entra em casa dizendo que talvez iria ocupar uma presidência da província. Seria nomeado para uma província do norte. Isso causa repugnância em Virgília, pois ela não queria ficar longe de Brás Cubas. A resolução era definitiva. Lobo Neves lembrou o seguinte: prometi que serias marquesa e nem baronesa estas. Lobo Neves convida Brás Cubas para ser seu secretário de governo. Para Brás Cubas, isto seria o cúmulo dos cúmulos, já havia falatório demais, dava muito na vista...
No dia seguinte, Brás Cubas abre uma folha política e lê que por decretos de 13, são nomeados presidente e secretário da província de *** o Lobo Neves e Brás Cubas. Virgília chega daí a pouco. Brás Cubas vacila, não sabe se deve aceitar... Virgília conta-lhe que o marido recusaria a nomeação e pede segredo. A recusa é motivo pueril: O decreto trazia a data de 13, e que esse número significava para ele uma recordação fúnebre. O pai morreu num dia 13, treze dias depois de um jantar que havia treze pessoas. A casa em que morrera a mãe tinha o n.º 13, etc... era um número fatídico. Uma semana depois, Lobo Neves é nomeado presidente de província. Brás Cubas se agarra na esperança de recusa. Torce para que o decreto venha outra vez datado de 13; trouxe porém, a data de 31, e esta simples permutação de algarismo elimina deles a substância diabólica. Portanto, o casal foi separado através de permutação dos algarismos 1 e 3 transformando o número 13 em 31.
Se para Silvio Romero houve um certo rancor ao afirmar que não havia unidade na poesia de Machado, para mim o maior artifício de cálculo literário engendrado pela genialidade de Machado foi sem dúvida tornar Memórias Póstumas e Quincas Borba dois romances irmãos: Quincas Borba e Brás Cubas são amigos. Brás Cubas sente que está velho. Seis meses antes, Quincas Borba parte para Barbacena em Minas Gerais. Quincas Borba em Minas e sua morte é assunto que dará matéria para o romance Quincas Borba. Voltou quatro meses depois com “um resto de consciência” para morrer na casa de Brás Cubas.
Em Minas, o protagonista Rubião, ex-professor e morador de Barbacena do romance Quincas Borba, torna-se enfermeiro particular do filósofo moribundo Quincas Borba.
Com a morte de Quincas Borba, Rubião torna-se herdeiro universal, e tem a incumbência de cuidar do cachorro que também leva o nome de Quincas Borba.
Esse resto de consciência do Quincas Borba filósofo é que Machado pretende reimplantar, reencarnar seja lá o que for no Quincas Borba Cachorro, deixando um transito livre para o Quincas Borba (filósofo) usá-lo como ponte para se encostar no cachorro. Observo o seguinte: enquanto o também clássico e genial Graciliano Ramos humaniza a cadela Baleia em “Vidas Secas” Machado animaliza o semidemente Quincas Borba (filósofo) com o restinho da consciência que sobrou deste para fazer morada no Quincas Borba cachorro...
E então, que caráter religioso e doutrinário devemos dar ao genial Machado de Assis? Quimbanda, Umbanda, Candomblé? Sincretismo religioso? Protestante? Católico Jansenista como Blaise Pascal? Espiritismo Kardecista? Alguma coisa de Voltaire, ao preferir certa ordem benemérita que não se apóia em nenhuma crença em particular, nenhum credo político e religioso? Religioso destituído de Igreja? Você decide...
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MACHADO DE ASSIS, O MELHOR CAMPO DE COMBATE
Clara Angélica S. Cruz

Correndo o risco de poder encalhar na obviedade, tentarei um elogio a mais, no mar da admiração que rodeia Machado de Assis. A minha admiração, e a de todos os leitores do Grande Bruxo da Cosme Velho, advém da sua capacidade para transformar uma língua que já era universal, mas que por ser a língua dos falantes deste outro lado do mar, não poderia de forma nenhuma alcançar as velhas glórias já consagradas na Metrópole. A mesma sorte corria a língua espanhola, usada por “indianos” e as “gentes de pouca cultura” da América de Colombo e de Pero Vaz de Caminha. O destino mudou quando um garoto, aprendiz de Bruxo, antes de mudar-se para a Rua Cosme Velho, observava a vida em volta com olhos de verdadeiro bruxo, e colocava no papel, rabiscado com perfeição, as impressões da sua cidade, da sua gente, para refletir mais tarde sobre as misérias do homem. O resultado está ali, transformados os rabiscos em Crônicas, Poesias, Contos, Romances, Criticas, Obras de Teatro, Epistolário, escritos variados ou de difícil classificação reunidos em Miscelânea. Canteira interminável de onde é possível retirar pedras preciosas, sempre que desafiam todo tempo as limitações dos leitores, porque o poder do Bruxo consiste em se atualizar permanentemente; ou melhor, estar sempre adiantado de seu tempo. Nesses dias de conturbadas idas e vindas das maquinações políticas num nível planetário, com guerras a ponto de espatifar o que ainda resta, o pensamento de Machado de Assis adquire esse difícil ar de atualidade.
Correm tempos de presidentes que se congregam em torno de entusiasmos esportivos, imaginando poder consertar questões políticas; e de reuniões de cúpulas presidenciais para debater os problemas do mundo, que mais parecem reuniões esportivas. Idas e vindas, também, das políticas de nossas castigadas nações latino-americanas que suportam agressões à terra, ao meio ambiente, ao homem e às estruturas que gerenciam o poder do dinheiro, trazendo em seu bojo toda a desestabilização social que gera o inconformismo e o protesto, matriz dos abusos e vantagens injustas, tanto dos que governam como dos que são governados. Micros e macros cosmos que exalam bafos rarefeitos que nos envolvem como cidadãos em nossos pequenos ou grandes municípios, e também como cidadãos de um universo que se expressa fatalmente em duas línguas: a Portuguesa e a Espanhola; dores e sensabores do universo bilíngüe da nossa América Latina. Dores e sensabores que já Machado retratava nas Crônicas do Rio, de 1885, das quais é difícil escolher uma só. O dia 8 de julho desse ano, Machado publicava: “ O que é política”, na coluna Balas de estalo, uma verdadeira lição de política às avessas, de fina ironia social; dela, extraímos o final:
“ ...Terencio o Corneille, tudo vem a dar neste velho adágio, que diz que quem não tem cão caça com gato. É oportunismo, confesso; mas prefiro-lhe o aparte de um deputado, no discurso de Sr. Rodrigues Alves, quando este tachava um presidente de interventor, não porque recomendasse candidatos, mas porque fez favores a amigos destes. ‘Queria que os fizesse aos amigos de V. Ex.?’. Perguntou um colega. Tal qual a política do boticário: não comprar na botica da esquina.”
É bom conferir o texto na íntegra para se deliciar com uma galeria de jogos inteligentes entre autor e leitor desavisado, num espetáculo do melhor deboche político. Este fragmento foi retirado das Obras Completas de Machado de Assis, Volume III editado pela Aguilar. A escolha de uma crônica apenas ficou muito difícil, por isso, esta outra foi selecionada pelo seu valor de contemporaneidade, onde o “antes” e o “agora” se fundem perante a contemplação da miséria humana, que não aprende nunca. Machado publica em setembro de 1892, em sua coluna “A Semana”, para a Gazeta de Noticias, do Rio de Janeiro. Um ano depois, em 1893, aparece a mesma crônica, publicada em Páginas recolhidas.
“Nem sempre respondo por papéis velhos: mas aqui está um que parece autêntico; e, se o não é, vale pelo texto, que é substancial. É um pedaço do evangelho do Diabo, justamente um sermão da montanha, à maneira de São Mateus. Não se pavorem as almas católicas. Já Santo Agostinho dizia que ‘a igreja do Diabo imita a igreja de Deus’. Daí a semelhança entre os dois evangelhos. Lá vai o do Diabo.
1. E vendo o Diabo a grande multidão de povo, subiu a um monte, por nome Corcovado, e, depois de se ter sentado, vieram a ele os discípulos.
2. E ele abrindo a boca, ensinou dizendo as palavras seguintes.
(...)
9. Vós sois o sal do money market. E se o sal perder a força, com que outra coisa se há de salgar?
( ... )
12. Não acrediteis em sociedades arrebentadas. Em verdade vos digo que todas se concertam, e se não for com remendo da mesma cor, será com remendo de outra cor.

13. Ouviste que foi dito aos homens: Amai-vos uns aos outros. Pois digo-vos: Comei-vos uns aos outros; melhor é comer que ser comido; o lombo alheio é muito mais nutritivo que o próprio.
14. Também foi dito aos homens: Não matareis a vosso irmão, nem a vosso inimigo, para que não sejais castigados. Eu digo-vos que não preciso matar a vosso irmão para ganhardes o reino da terra; basta arrancar-lhe a última camisa.”
(Sermão do Diabo, setembro de 1893).
Experimentar a “bruxaria” machadiana das crônicas é experimentar doses mínimas indicadas para não “adoecer” de brasilidade quando lidos os Romances. O sermão do Diabo permite ler um Machado que não só conhece a questão social, com os requintes de um moderno sociólogo, como também sabe do que está falando no patamar religioso. Prova de que conhece as Sagradas Escrituras e o fruto dessa pessoal leitura é a síntese teológica que faz em A paixão de Jesus que aparece em abril de 1904, publicada nas páginas que foram catalogadas como Miscelânea, na citada edição da Aguilar, onde ocupa as pp. 1020-1023. O Machado que faz ao diabo pregar para os mais “expertos” é também, o escritor preocupado com a sorte dos povos de América Latina e ao mesmo tempo, nos dá uma amostra a mais, das tantas que sua obra oferece, da sua generosidade intelectual. Atitude dobradamente valiosa, se se tem em conta a natural inclinação de Machado a exercer a arte da ironia, do deboche, da observação minuciosa a que não escapa nenhum detalhe; pelo contrário, seus olhos enxergavam além da realidade, e mesmo assim, no texto escolhido para finalizar este trabalho, consegue achar elogios para política dos argentinos, de 1868, na pessoa de uma controvertida figura política, quem, não por muito discutida, resulta menos valiosa aos olhos da história: Domingo Faustino Sarmiento foi o cidadão que desde seu autodidatismo, colocou o País na trilha do progresso.
Hoje, não sei se a condição de autodidata pode ser considerada positiva ou negativa, já que os Mestres Maiores das letras, tanto para América luso-falante, como para América hispano-falante, foram autodidatas. Nem Joaquim Maria Machado de Assis, nem Jorge Luis Borges passaram pela Universidade e ambos são os referentes máximos do pensamento e da literatura dos povos da América, para todo o mundo. Daí, que, ao me referir a Sarmiento autodidata, presidente e autor das leis que fizeram da Argentina uma nação sem analfabetos, desde as últimas décadas do século XIX e por algum tempo, um dos países mais cultos da América Latina, fique pensando nesses homens que não sentaram em nenhuma carteira universitária e foram, sem dúvidas, artífices da cultura de seus países. Que teriam sido se tivessem passado pelas aulas de alguma universidade? Teriam sido melhores? Um outro interrogante empurrou ao primeiro: a Universidade gera uma verdadeira discussão critica? ou são as condições pessoais as responsáveis para que apareçam homens como os anteriormente referidos?
As respostas ficam pairando no ar esperando que alguém aceite o desafio. Voltando a O futuro dos argentinos, crônica publicada na Seção Balas de estalo, no dia 9 de julho de 1888, data pátria dos argentinos, em seu discurso Machado não só elogia Sarmiento, como também o General Mitre a quem lembra como fundador do jornal mais importante do País, até hoje: o jornal La Nación. Ficamos como sempre, impressionados, e como sempre,também, descobrindo novos ângulos de admiração do autor de Memórias Póstumas de Brás Cubas. Neste caso: d’O futuro dos argentinos as palavras se transformam e operam com a força das armas usadas para o melhor combate. Machado consegue pela mágica de seu discurso, que vocábulos como “opressão”, “violência,” “desanimo,” “tirania odiosa” “caudilhagem”, sejam vencidos por seus oponentes: “esplendor”, “progresso”, “liberdade”, “ordem”.
O parágrafo de Machado que fecha o nosso trabalho é um exemplo de inteligente integração, imaginada não na solução dos bons negócios de compra e venda, e sim, na troca de opiniões, de pensamentos, de discursos abertos na democracia para o progresso de todos os povos. O texto finaliza com a beleza literária e de pensamento que só um Machado de Assis poderia lograr: “...tão confiados somos de que não há já entre nós melhor campo de combate.”
“Agora, no dia que os argentinos celebram a sua festa constitucional, lembro-me daqueles tempos, e comparo-os com estes, quando, em vez de soldados que os vão a auxiliar a derrocar uma tirania odiosa, mandamos-lhes uma simples comissão de Jornalistas, uma embaixada da opinião à opinião; tão confiados somos de que não há já entre nós melhor campo de combate. Oxalá caminhem sempre o Império e a República, de mãos dadas, prósperos e amigos”.

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O QUE PODE O SENTIMENTO: A SUPERAÇÃO DA FINITUDE EM M. DE A.
Humberto Guido
Quaisquer que sejam os costumes novos e ligações de família, e por maior que tenha sido a ausência, o lugar onde alguém passou os primeiros anos há de dizer à memória e ao coração uma linguagem particular (Conselheiro Aires).

M. de A. − Machado de Assis e, também, Memorial de Aires − a coincidência suscitada pela abreviatura não é obra do acaso. A personagem ocupa o lugar do autor para relatar os momentos derradeiros da existência deste último, sem a pretensão de polir e dar transparência à opacidade do vivido. A cumplicidade do autor com a personagem é tamanha que beira a heresia: “Deus, quando quer ser Dante, é maior que Dante”, palavras recolhidas por Aires em seu diário; elas dão expressão ao sentimento de Machado de Assis em face da velhice: o criador ainda é maior que a criação; mesmo que a posteridade venha a cultuar apenas a obra, é preciso o cuidado para que não se olvide o autor. É esta a finalidade do Memorial de Aires: impedir a separação entre a obra e o autor, como se o destino do vivido fosse a finitude, ao passo que a obra ficaria para a posteridade como entidade impessoal. Nada disso, é a vida que dá à obra a imortalidade.
Somente a construção lírica poderia fazer do diário um romance. Autor e personagem estão unidos pela memória que se encarrega de resgatar a vida e produzir a narrativa. A obra é o espelho da existência, o duplo que capta o movimento vital para imortalizá-lo. O ficcional e o real são distinções que não têm lugar na arte machadiana; basta perceber o jogo com as palavras feito com sagacidade pelo “Bruxo da Cosme Velho”: Aires, quando se lê do final para o começo revela a flexão do verbo no futuro do pretérito “seria”; o resultado, então, evidencia o intento: seria memória. Tal como no teatro antigo, Machado de Assis faz do texto a máscara que encobre o vivido. Não há ficção no romance, não há realismo na memória. Há cumplicidade também entre a escrita e vida, do movimento de ambas fica preservada a veracidade dos sentimentos, os únicos que não são consumidos pela finitude.
A estrutura da obra é simples: um solteirão ocupa o seu tempo de aposentado envolvendo-se com as peripécias de um casal idoso, Aguiar e dona Carmo (Machado de Assis e Carolina Novais?!), que não tendo filhos querem unir dois jovens – Tristão e Fidélia − com o propósito de tê-los próximos, feito filhos, para lhes assistirem nos últimos dias. A trama cotidiana registrada no diário ultrapassa a vulgaridade das cenas comuns, permeadas pelas angústias e expectativas suscitadas pela vida em sociedade. O Memorial como reescrita escava os acontecimentos e desvela a beleza do convívio humano, até mesmo em seus momentos dilacerantes. Se o romance fosse apenas autobiográfico, de tão óbvio não tocaria a emoção do leitor; na mesma proporção, se o diário fosse o mero registro do cotidiano de seu autor, de tão limitado não venceria o tempo. Aires, o alter-ego machadiano (Aires/Assis), não fala de si, ele empresta as suas memórias para dar perenidade aos sentimentos humanos, fazendo da vida de Machado de Assis o motivo da arte literária do autor.
A forma e o conteúdo, dois aspectos que aterrorizam a maioria dos escritores, não são obstáculos para a criação artística machadiana. A opção pelo diário transgrediu o gosto mediano acostumado com os folhetins melancólicos; ao proceder dessa maneira, o autor conseguiu harmonizar a forma–diário ao conteúdo-autobiográfico. A união da forma e do conteúdo enaltece o cotidiano com a superação do individualismo, tendo na vida a celebração da humanidade. Esses motivos delinearam a primeira parte da obra: a continuação da humanidade, ou, os filhos. A pessoa de Machado de Assis parece estar fixada pelas últimas palavras de outro memorial, o de Brás Cubas e aquelas palavras finais: "Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria". Então, por que falar de filhos na última obra? Porque a conclusão das memórias de Brás Cubas é o interdito, resta expressar o que não foi dito.
Antes considerar o que os filhos representariam, cabe elucidar a premissa da leitura da obra de arte; não é uma leitura desinteressada, um mero passatempo ou entretenimento fútil, conseguido com a subliteratura. A obra literária requer a participação do leitor, é ele que complementa o espaço de interação deixado pelo autor; a leitura exige cumplicidade do leitor, portanto, o bom livro demanda o bom leitor; logo, Machado de Assis é um clássico da literatura porque os melhores leitores o elegeram. A qualidade essencial do clássico é a simplicidade, esta virtude, além de dar identidade à obra, a preserva da força corrosiva do tempo, que incapaz de apagar a obra clássica, paradoxalmente, cumpre a tarefa útil de limpar a cultura dos modismos literários. Machado de Assis tinha consciência do valor e da destinação da sua obra, a sua convicção ficou imortalizada por intermédio das palavras de Aires: “Tudo serão modas neste mundo, exceto as estrelas e eu, que sou o mesmo antigo sujeito”.
A leitura sugerida aqui não tem a pretensão de esgotar o conteúdo das páginas machadianas, tampouco quer penetrar na subjetividade do autor. O exercício da leitura que permitiu a elaboração deste ensaio seguiu as exortações de Machado de Assis para que o leitor o auxiliasse a encontrar a melhor expressão para aquilo que as palavras sozinhas não conseguem traduzir: a pureza dos sentimentos. O estilo inconfundível do autor do Memorial está em toda a obra; dentre elas, uma é emblemática, quando Aires se reporta à satisfação de dona Carmo em imaginar a possível união de Tristão e Fidélia. A senhora idosa deixou escapar um sorriso – situação corriqueira, quase sem importância para quem é desprovido de humanidade. Não para Aires/Assis: “Não ponho aqui o sorriso porque foi uma mistura de desejo, de esperança e de saudade, e eu não sei descrever nem pintar. Mas foi, foi isso mesmo que aí digo, se as três palavras podem dar idéia da mistura, ou se a mistura não era ainda maior”. A obra está aberta, não existe o pragmatismo das frases de efeito, todas as expressões convidam o leitor a participar do processo interminável que faz circular o propósito edificante da obra de arte. O sentido íntimo do comportamento não está em uma ou mais palavras, está na “mistura”; desejo, esperança e saudade, por elas próprias não se chegaria à impressão causada pelo sorriso tímido de dona Carmo. Na mistura das três palavras, é possível se aproximar do sorriso singular da amiga de Aires; a responsabilidade pela mistura neste momento é do leitor; esta ação pressupõe a troca afetiva entre a obra do autor e as vivências do leitor.
A falta dos filhos. Aires, quando dá voz ao artista Machado de Assis, não se interessa por crianças; mas, no momento em que o alter-ego do artista o obriga a transpor o limiar da realidade para encarnar o homem de família, ele chega a desejar os filhos que não teve. Brás Cubas e Aires não são capazes de demover Machado de Assis do desejo de humanidade; é Aires a dizer: “Diferença de vocações; o casal Aguiar morre por filhos, eu nunca pensei neles, nem lhes sinto a falta, apesar de só. Alguns há que os quiseram, que os tiveram e não souberam guardá-los”; quem seriam esses “alguns”? Difícil responder. Pode ser o próprio casal sem a máscara literária, reencarnados em Joaquim e Carolina; ou, então, as linhas do Memorial fazem as vezes da crítica social à negligência dos genitores de todas as épocas. Mas o que importa destacar é a confissão feita por intermédio da pena de Aires: “o casal Aguiar [Assis, por que não?] morre por filhos”. A segunda parte da obra é ocupada com os planos de dona Carmo para unir Tristão – o afilhado – e a jovem viúva, Fidélia.
Na ausência dos filhos, resta a vida conjugal. O amor celebrado nas páginas do Memorial não é mero ornamento estético; o amor é o tributo do velho escritor à amada que faleceu pouco antes da publicação da obra. A morte é a situação que ronda o artista, tendo-lhe levado a esposa e pouco faltando para consumar-lhe a existência. Mas, a obra vence a finitude, vence também a frustração pela falta dos filhos. O Memorial superou a morte e imortalizou o amor do casal unido pela arte literária; mais uma vez é Aires/Assis a relatar: “Queriam-se, sempre se quiseram muito, apesar dos ciúmes que tinham um do outro, ou por isso mesmo”. O desfecho do Memorial é a evocação da juventude: “a mocidade tem o direito de viver e amar, e separa-se alegremente do extinto e do caduco”; as palavras emprestadas de Aires querem informar que os filhos, quando moços, seguem rumos próprios; por isso, mesmo que desejados, os filhos não livrariam o casal da situação dilacerante da morte. Somente o puro sentimento – o amor – preservado pela arte literária, é capaz de vencer a finitude.
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RELAÇÕES DE JOAQUIM COMIGO E OUTROS LEITORES
Antônio Gouveia
Minhas colegas de graduação sempre faziam referência, em nosso convívio, à intimidade com que eu tratava os autores que estudávamos ou comentávamos. O fato é que num certo sentido elas tinham razão. Dentro de mim, dos autores que eu lia, sentia uma aproximação muito maior do que a de simplesmente leitor distante no espaço e no tempo. Os textos, mas, sobretudo, as intenções artísticas dos autores – tão condenadas por alguns, uma expressão-lazarenta nas disciplinas literárias – me fizeram ter um parentesco espiritual fortíssimo com alguns deles, muito maior do que aquele existente com parentes verdadeiros. Neste sentido, recordo meus encontros com Joaquim Maria.
Eu ia ainda fazer doze anos quando tive de ler Dom Casmurro no meu primeiro ano ginasial – Colégio Cardeal Câmara em Bangu, no Rio. Recordo do misto de vaidade e orgulho quando pedi em casa para meus pais comprarem o livro. Li por ler, mas me lembro que desde então fiquei com a impressão de algo sombrio. Era uma história sem emoções fortes dos faroestes nos seriados de tv, que eu adorava; não havia ambientes marcantes, somente uma impressão de fundo de quintal de subúrbio. Claro que na época eu não conseguia chegar às concepções camufladas no texto, tanto em matéria existencial, como artístico-literária. O que eu li na época era o mínimo que havia na obra – a narração pura e simples. Hoje olhando para trás vejo que eu tinha um contato sem qualquer tipo de consciência, a não ser o de precisar ler para fazer um trabalho na disciplina ginasial de Língua Portuguesa.
Exatamente dez anos depois, quando fui, junto com meu colega João Montes, a um hotel em Santa Teresa, no qual morava Antônio Carlos Villaça, misto de jornalista e crítico, memorialista também, para combinar com ele uma homenagem, que faríamos, na Faculdade de Letras da UFRJ, que eu cursava então no terceiro ano, comemorando a passagem dos seus 50 anos de idade. Num dado momento da conversa entusiasmada, Villaça virou para João e observou que do nariz para cima ele via muita semelhança entre Joaquim Maria e eu. Imaginem que surpresa agradável começar a ser comparado com o autor de O alienista pela aparência física, afinal se eu já me sentia muito íntimo na visão do mundo dos autores, ter uma semelhança física com um dos que viviam dentro do meu mundo interior, foi um momento sencillo, como dizem os que falam espanhol; momento daqueles que eu procuro encerrar ou desviar imediatamente com outro assunto para mudar o rumo da conversa. Bastam-me os segundos em que o assunto foi ventilado, não quero mais do que isso. São segundos sublimes que vivem o resto da vida me alimentando, fertilizando os campos da alma. Segundos como se fossem doces, iguarias, que a gente saboreia com a língua do espírito, lambendo os beiços da boca nos ouvidos que engole essas preciosidades que os outros nos preparam um pouco culinariamente.
Mais dez anos depois, eu estava cursando o doutorado, e vou encontrar, não simplesmente Joaquim Maria, mas o autor que servia aos chamados cientistas da literatura – e na época eu fingia ser um deles –, no doutorado, quando cursei a disciplina Estudo Monográfico de Literatura Brasileira “Machado de Assis e a consciência da forma: 1880/1980”, ministrado pela profª Sônia Brayner, que escreveu alguns trabalhos sobre o bruxo do Cosme Velho. Ela trabalhava aprofundando estes estudos anteriores, sobretudo aquele que fez em Labirinto do espaço romanesco, revelando que a ficção machadiana tinha tido as crônicas como uma espécie de laboratório. A tese dela era a de que o Machado cronista preparou o Machado contista e romancista.
Meu trabalho final desse curso intitulou-se “Um aspecto da prosa ficcional machadiana”, no qual fiz uma detalhada coleta dos trechos, na narrativa de ficção, em que os narradores de Joaquim Maria se dirigem aos leitores ou criava, no texto, um clima de total intimidade com aqueles que eles supunham estarem lendo-os num dado momento ao folhear periódicos do Rio de Janeiro do século XIX. Embora este seja um recurso antigo de alguns narradores, o fato é que os de Machado de Assis adotaram-no como parte importante do seu estilo de uma maneira tão constante e presente que se perde esta dimensão, afinal não podemos esquecer que, quando começou a escrever, ele publicava no Rio de Janeiro textos que eram divulgados em jornais e revistas da cidade, textos que seriam lidos no dia seguinte, na mesma semana, nas próximas semanas, no próximo mês, por leitores e leitoras, com as quais ele sentiria intimidade e deveria ter um contato muito mais íntimo do que podemos presumir a uma distância tão grande como a que estamos daquela época em que a literatura era o mundo virtual de então, em que havia uma convivência entre autores, narradores e leitores que não se limitava à leitura que hoje fazemos daqueles textos.
Só ficaram fora do meu estudo o romance Quincas Borba e os textos publicados em periódicos entre 1880 e 1908. Portanto, li muita coisa para fazer o trabalho. E li boa parte nos lugares originais em que saiu publicado. Durante o segundo semestre de 1988 ia quase que diariamente à Biblioteca Nacional, na seção de Obras Raras, ler os textos no original no Jornal das Famílias, entre outros títulos menos constantes. Junto com os contos e romances, eu li o mesmo que leram as famílias cariocas e fluminenses entre 1858 e 1880, como anúncios e reportagens, receitas e matérias abordando, sobretudo, os assuntos do universo feminino e doméstico, com ênfase para o vestuário e a moda.
Na minha pesquisa, sobre as relações de Machado com seus leitores, pude descobrir uma maneira diferente de explicar a divisão da obra de Joaquim Maria. Sabemos que a crítica e a analítica machadiana têm a tendência a dizer que ele foi um até Memórias Póstumas e depois outro escritor. Ou então de ver a obra como um gradativo aperfeiçoamento, atribuindo alguns aspectos do maduro escritor como surgidos ou propostos pelo autor em suas últimas obras. O primeiro argumento parece ter seguido a aparência lógica, enquanto o segundo, a lógica aparente. Contra estas duas tendências, preferiríamos doravante falar em alçamento. O alçamento machadiano relaciona-se com passar de um veículo de criação e divulgação a outro de acordo com uma ou outra situação receptiva. A criação nele foi afetada sempre pela recepção. Isto quer dizer mais: Joaquim Maria foi sempre o mesmo prosador do começo ao fim, porém atordoado pelo grau de intimidade com leitores do veículo de divulgação dos seus textos. Machado de Assis será aquele que se auto-formulou de acordo com a sua situação receptiva.
Desde os seus primórdios, Machado de Assis encaminha sua prosa ficcional em duas direções de enredos: graciosos e sérios. Os sérios são aqueles que aproximam situações e personagens da normalidade e do bom senso cotidiano, com todos seus interesses e sentimentos freqüentes; e os graciosos, como sendo aqueles em que situações e personagens apresentam tipicidades, folclorismos, absurdos, humor, exagero, complicações, picaresco etc.
Aproximando estas categorias provisórias das mais conhecidas, pensamos que a seriedade se assemelha ao drama, à tragédia, à novela, mas tudo cheio de amenidade, serenidade, sensatez. E que a graciosidade lembra a comédia, o bufão, o burlesco, o pícaro, a paródia, o simbólico, a analogia, a imitação deformadora, enfim.
A divulgação de seus contos em periódicos misturou enredos graciosos e sérios, mas sua auto-formulação, nas suas coletâneas de contos e romances dos anos 70, passa, predominantemente, enredos sérios.
Para o público dos periódicos, M. de Assis trabalha a seriedade e a graciosidade, diria, sem que uma prevalecesse sobre a outra. Para o público dos romances, ou melhor, dos livros dos anos 70, ele trabalha essencialmente a seriedade. Mas quem lê os textos do Joaquim Maria que foram originalmente compostos para saírem em periódicos vê a diferença gritante. Aliás, os três romances compostos em periódicos marcam essa diferença para os demais.
A pesquisa sobre o comportamento de narradores machadianos em relação aos narratários me mostrou que o traço da graciosidade surge em Machado de se sentir numa situação mais informal, mais íntima, com os leitores e as leitoras de periódicos. Ficou-me claro e estabelecido que a crítica erudita da sua época e as posteriores conhecem-no como artesão da seriedade. Para muitas dessas críticas eruditas contemporâneas e futuras, a publicação de Memórias póstumas de Brás Cubas representaria uma surpresa, uma viravolta, uma nova fase, quando, o que houve na verdade foi o alçamento da graciosidade, que permanecia até então no domínio periódico e contista, para o domínio livresco e romanesco. Era a continuidade num outro patamar. E esta frase combina e dá razão tanto aos partidários do Machado aperfeiçoador gradativo, quanto aos partidários do Machado de Assis cindido em dois épocas pré- e pós-Memórias.
O que, no processo criativo de Joaquim Maria era apenas o alçamento ao romance e ao livro de uma linha antiga de enredo e temas, as várias críticas e analíticas machadianas pensaram como se fosse um ineditismo. Agora, depois da leitura desses contos mais antigos, somos obrigados a reformular alguns pontos de vista.
Animado por seu êxito de recepção ou público, com o deslumbramento das críticas eruditas diante do seu Memórias póstumas de Brás Cubas, Machado passa a reforçar sua inspiração marcadamente pela graciosidade, com o acréscimo potencializado do semi-simbolismo, uma tese que contraporíamos à simbolista de John Gledson, a qual por estar sendo pensada não discutirei aqui.
É óbvio que estas reflexões improvisadas são passíveis de discussão, porém, uma conclusão é definitiva: a literatura em periódicos e a literatura em livros não significaram a mesma coisa para Machado de Assis, constatação que fazemos a partir das suas relações com narradores e narratários.
Até onde fiquei sabendo, o trabalho anterior, que mais se relaciona às modestas intenções que me animaram, é o que tomamos conhecimento na coletânea Ensaios machadianos de Joaquim Mattoso Câmara Junior, intitulado “Machado de Assis e as referências ao leitor”.
Entrando em sua questão, aduz J. M. Câmara Jr. o fato de que Machado de Assis não “foi adepto do novo processo”. Sua “técnica, tão inconfundivelmente própria desenvolvida nos romances e contos da sua maturidade, parte da fidelidade” à maneira mais antiga. Acrescentando ainda, o renomado pesquisador brasileiro, que M. de Assis tinha “para fortalecê-lo neste rumo, a sua preferência pela forma autobiográfica de narração e o gosto do humor, que especialmente se coaduna com apóstrofes sencerimoniosas ao leitor.”
Sobre o que vai aí no último parágrafo, temos opinião diversa em dois pontos, depois da nossa pesquisa. O primeiro é o de que a referida técnica já se faz presente na sua prosa ficcional nos primórdios da carreira. Esta técnica, bastante freqüente no princípio, depois equilibrada, depois diminuindo, atingindo seu menos uso em 1878, depois recrudescendo e se tornando usual a partir dos anos 80. Não é nem um pouco um traço da maturidade, como quis Mattoso.
O segundo é o de que não é a “preferência pela forma autobiográfica” o que faz com que Machado de Assis a maneje, pois houve uso significativo também nas narrativas na terceira pessoa. O manejo, daquilo que poderíamos chamar técnica da narratariedade, se prenderia, primeiro, à intimidade que sentia frente aos leitores e leitoras dos periódicos, segundo, às suas constantes preocupações de “fidelidade histórica”, querendo se fazer mais de cronista do que de ficcionista, e sendo assim as crônicas não seriam só o laboratório, como sustenta S. Brayner, mas a variante não-ficcional de uma cronicidade, que marcaria também, profundamente, sua ficção e que seria um dos pilares ou raízes da poética machadiana.
Mattoso Câmara pesquisou essencialmente os “modos de tratamento” em três romances Memórias póstumas de Brás Cubas, Dom Casmurro e Quinca Borba, perseguindo neles “as soluções estilísticas” dadas por Machado de Assis, combinando formalidades e informalidades dos “processos de tratamento” do português do Rio de Janeiro. Vejam Vocês, meus leitores e leitoras, três romances apenas, e que apareceram após duas décadas de uso intenso do recurso aos diálogos de narradores com narratários. Sem se quer passar perto dessa minha insinuação, no fim do seu texto, Mattoso faz uma auto-crítica: “Evidentemente, a minha análise é omissa e perfunctória, mas ouso crer que terá posto em certo relevo fatos estilísticos dignos de atenção”. E depois disso cita Bento Santiago, o do Dom Casmurro, provavelmente se dirigindo ao leitor da obra: “Assim preencho as lacunas alheias; assim podes também preencher as minhas”. A idéia vem de Bentinho, passa por Mattoso, fica comigo e eu entrego a vocês, gentis leitores de minhas solitárias, alegres, festivas linhas, ao comemorar os cem anos do soturno e triste dia em que tivemos de enterrar o corpo, e, com ele, o cérebro genial do mulato culto e talentoso morador das Laranjeiras, o bairro do tricolor carioca, nos pés do Cristo, onde se canta a plenos pulmões, nos momentos difíceis, em jogos que nem o anjo Nélson Rodrigues consegue ajudar: “abenção, João de Deus, nosso povo te abraça...“; prece do povo a outro filho de Deus, do Deus que nos deu o fluminense Joaquim Maria Machado de Assis.
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A VIDA DE QUEM NÃO MORRE

Ildo Carbonera

O que importa é a expressão geral do meio doméstico, e essa aí fica indicada – vulgaridade de caracteres, amor das aparências rutilantes, do arruído, frouxidão da vontade, domínio do capricho, e o mais. Dessa terra e desse estrume é que nasceu esta flor.

Machado de Assis, MPBC


... brasileiro, pai pintor mulato, mãe lavadeira, órfão em menino, gago, epiléptico, tímido, reservado, vendia doces feitos pela madrasta, sacristão, freqüentou apenas a escola primária, autodidata, não realizou estudos regulares... Fez apenas uma viagem, fora do RJ, a Nova Friburgo, para umas férias, ou para cuidar da saúde... Para sobreviver, começou a trabalhar ainda menino.

No livro inédito, 234 posições pós-modernas, está declarado: Hoje, 31 de março de 2008, releio três contos de Machado de Assis, “O dicionário”, “Três tesouros perdidos” e “A causa secreta”. Para minha alegria, reencontro-o espetacularmente novo e surpreendente. Assim, antes de me convidarem para palestras, congressos, conferências e aulas, permitam-me um bom tempo de releitura, reflexões e silêncio, está bem?
Diante de um romance, conto, crônica, novela ou poema, duas perguntas simples podem proporcionar grandes descobertas: a) Esse sujeito (ficcionista ou poeta) está escondendo alguma coisa, o que será? b) Esse sujeito quer revelar algo, o que será? O maior teórico do mundo sabe que cada texto literário (salvas as diferenças) é único, singular, diferente. Logo, ou a Teoria resolve todos os problemas da Literatura, ou cada texto tem suas leis, segredos, implicações e abrangências. “Fazer o texto falar” ou “mostrar como ele funciona” não remete à teoria dos “achismos”, da libertinagem, nem da liberdade de expressão e interpretação generalistas.
Eu queria saber onde encontrar as expressões “aparências rutilantes”, “vontade sem ação” e “a grande dor das coisas passadas”. As duas primeiras, na ficção de Machado de Assis, e a outra, parte da crônica O mistério da poesia, de Rubem Braga. Fui ao cyber-café e escrevi: Machado de Assis aparências rutilantes, e logo apareceu a localização exata: Memórias póstumas de Brás Cubas; escrevi Machado de Assis vontade sem ação, e logo surgiu a localização exata: Memorial de Aires; escrevi Rubem Braga o mistério da poesia, e logo despontou a crônica inteirinha, onde estava o verso de Camões (a ser enviado para o professor Luís Augusto Fischer). Para quem lê e ama a Literatura, um trabalho assim parece cômodo, banal e fútil. Mas pode tornar-se um divertimento bastante agradável e lucrativo, quando bem orientado.
Por que a releitura, a reflexão e o silêncio? Por mais que eu tenha lido a obra ficcional de Machado de Assis – de Contos Fluminenses a Memorial de Aires, estudada superficialmente nos ensaios Machado de Assis e a Escola Realista, Desgraças que fazem rir e A emboscada machadiana, a razão e o bom senso informam que será preciso reler a obra machadiana, rever e reconsiderar as informações até agora reunidas, elaboradas e apresentadas, na sala de aula, nas crônicas e naqueles ensaios, mesmo um sendo a dissertação de mestrado.
Na releitura da obra do autor de Dom Casmurro, não há como evitar as novidades, as surpresas e os espantos. De nada adiantará tentarmos revelar tudo numa opção didática, teórica, pedagógica, conceitual; um trabalho assim tende para as trevas e não para a luz, para o desperdício e não para o confronto; estabeleceria a desordem, mataria o debate. Eu sei que no Brasil os “diálogos sobre o nada” reproduzem-se diária e assustadoramente!
Como explicar as mudanças e as atualizações ocorridas na obra de um autor, ao longo do tempo, se as palavras, os acentos, a pontuação, as frases, os parágrafos e os capítulos continuam originais? Nas obras dos grandes escritores, onde ficam escondidas as verdades subliminares, subjacentes? De que estratégias utiliza-se um autor para manter seu leitor sob a mira, constante e insistentemente? Que mecanismos interferem no leitor para que ele aceite a mudança, o novo olhar, a nova visão da obra, de si mesmo e do mundo?
Os sentidos das “palavras estranhas” continuam os mesmos, no dicionário, mas não resolvem os problemas de uma obra literária. O trabalho de tradução literal das palavras desconhecidas pode ser realizado tranqüilamente por uma criança, em seus primeiros dias de pesquisador(a). Por que uma criança, um jovem pesquisador e alguém que não lê quase nada não conseguem adentrar sorrateira e vorazmente na obra de um autor como Machado de Assis? Que elementos estão presentes aí, à espera de grandes leitores, apenas? Grandes leitores, não aqueles que dominam as leis poéticas.
A vida de quem não morre fala explícita e unicamente da Arte, da Literatura. Não há razões que me convençam tratar-se da vida de políticos, autoridades eclesiásticas, heróis da resistência, líderes de revoluções supremas, de discursos em defesa da paz total, da democracia infinita, das revoluções incontestáveis, da justiça absoluta, dos direitos soberanos, do socialismo completo, do comunismo universal... Machado de Assis não freqüentou nenhum curso regular. Foi Presidente, sim, mas da ABL e não da República. Aqueles tempos eram tempos românticos, nos corações e nas mentes, não mais na prosa e no verso.
Esses que vivem em congressos, mesas-redondas, seminários, revistas de caráter científico e demais eventos acadêmicos, científicos e oficiais discursando, debatendo, em brigas, arranhões e histerias, sempre envoltos numa mesma tecla - Capitu traiu ou não traiu? Riobaldo não é meio gay? – esses estão envergonhando, fossilizando, depredando os Estudos Literários. Que feio ficar falando sobre Machado de Assis, sem ler novamente sua obra, sem rever conceitos, sem ter lido quase nada além de livros didáticos, orelhas, resumos e apostilas para pré-vestibulandos! Deve ser muito mais cômodo “dar notas que criar leitores”...
Que pena ouvir jovens afirmarem categoricamente que odeiam a Literatura e a Língua Portuguesa! A culpa pode ser mais da didática, dos livros didáticos, das aulas didáticas, do terrorismo das provas, do estudo através de resumos e cópias fragmentárias, que dos próprios ficcionistas e poetas. Quem sabe?
O mundo da literatura ainda é bonito! Como ser aluno de Letras e não ler nem gostar de Machado de Assis? Como formar-se em Letras para ensinar a ler e a escrever, se odeia ler e não sabe escrever? Como dar aulas de Literatura sem conhecer sequer um conto machadiano, de cor e salteado? Como mostrar que a Literatura é bonita através de teorias, regras e pinceladas abstratas? Como não gostar da Literatura sem perder a alegria e a esperança?
Como não querer dar um safanão naquele rapaz, depois de ler o conto O caso Barreto, não sentir pena de Rubião, não desconfiar de Bentinho, não sentir desejos nos entremeios de Uns braços, não rir ao ler As bodas de Luis Duarte, não temer a figura de Camacho, não exclamar oh coitado! depois de conhecer a história de Deolindo, não prever o futuro dos gêmeos que viviam mamando, não acreditar que o menino é realmente o pai do homem, não amar os olhos de Capitu?
As perguntas acima apresentadas, pequenos cortes verticais pelo improviso, não significam quase nada, caso quiséssemos observar a obra de Machado de Assis, atenta e intimamente. Para cada linha, parágrafo, flagrante ou instante, haveria uma pergunta, depois outra e mais outra, e uma nova pergunta, sucessivamente. Como conseguem viver em constantes debates, apresentando sempre as mesmas descobertas, usando os mesmos fragmentos, inspirados e hostilizados por dúvidas eternas, mas secundárias e redundantes? Abertas, só por que ouviram falar da obra de Umberto Eco? A tal da “obra aberta” tornou-se co-irmã da Democracia, ao abrir a guarda para cada figura falante! No Brasil, só falta a Ana Maria Braga levar para o seu programa a Angélica (ou a Eliana, Luciano H, Adriane G, Sônia A, Lena K, Luciana G, Ivete S, Marta S, Daniela C ou M, Mônica V, Serginho G, Kaká, Faustão, Galvão do Vale, Maria da Graça M, Latino) e lá ficarem falando sobre Machado de Assis, Literatura, Beleza, Arte, Sensibilidade, Liberdade...
Como debater com colegas professores que aceitam cômoda e covardemente o fato de livros de auto-ajuda abocanharem a maior parte do bolo mercadológico brasileiro e dos anseios das nossas crianças e jovens, espalhados e perdidos pelas escolas brasileiras? Num futuro muito próximo, os conferencistas e especialistas da Educação incluirão nas pautas dos congressos, simpósios e similares discussões acaloradas e intermináveis sobre Machado de Assis X Paulo Coelho... Quem é o maior? Sem bons e dedicados condutores, a charrete da Educação já está despencando ladeira abaixo...
Nós não deveríamos escrever para sermos lidos, famosos, badalados, idolatrados, ricos. A História sempre foi implacável com os homens. Através da leitura, de grandes escritores, como Machado de Assis, há a possibilidade de me tornar uma pessoa melhor, um espírito mais apurado e elevado, uma mente polida, arejada e livre. Não posso perdê-la! Para a felicidade de quem ama as Artes, a Literatura e a Liberdade, as perversas e devastadoras ações humanas praticadas diariamente contra rios, lagos, mares e nascentes jamais descobrirão o caminho que leva à fonte inesgotável concebida por Machado de Assis.
Desde menino, o autor de Várias Histórias trabalhou pela própria sobrevivência. O sobrado da Cosme Velho foi demolido, dando lugar a um “espigão” moderno. As autoridades mais zelosas e escrupulosas colocaram por lá uma placa: Aqui morou Machado de Assis. A sensação é a mesma, quando vemos na escola uma placa batizada assim: Sala de leitura Manuel Bandeira. De um lado, a vida e a obra do criador de Capitu, e de outro, os Direitos Humanos, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Conselho Tutelar... Nós tínhamos outro caminho, mirávamos outro destino, merecíamos outra sorte! O País fez sua escolha: uma pena!
Machado de Assis não passou ao largo da questão da Escravidão, para a infelicidade dos baderneiros, panfletários, azedos, incontestáveis e intocáveis críticos que não lêem. Eu disse: os que não lêem! Ele não cedeu a nenhum achaque que acenava para o “branquecimento” ou elitização de seu berço, de seus princípios, ou de suas idéias. Não há a Verdade, mas o Paradoxo e a Verossimilhança. O autor de Quincas Borba foi traído pelos professores e críticos que não amam a Literatura, não gostam de ler, de dar aulas, nem de participar de debates acalorados, ininterruptos e inesgotáveis. Muitos docentes fazem doutorado e pós-doc para serem conferencistas e não para dar aulas, melhores e mais cativantes.
Você já pensou na voz dos artistas, escritores, célebres heróis e vilões que morreram antes da invenção de qualquer aparelho gravador? Como era a voz de Machado de Assis? Parecida à do Conselheiro Aires? E a de Galileu, Judas, Mozart, Aníbal, Sófocles, Maria Madalena, Caim, Cleópatra, Átila, Camões, Bruegel - o velho pintor, Kate Chopin, Emily Dickinson, Caifás, Francisco de Assis, Julia Lopes de Almeida, Van Gogh... Como era a voz de Capitu? Como seria a de minha irmã morta recém-nascida? Como era a de meu irmão morto antes dos três anos?
O caminho a ser seguido pelo leitor deve imitar aquele seguido pelo Autor, num processo de aprimoramento dos meios expressivos, conquistando a singularidade na universalidade – Das crônicas singelas e cotidianas aos romances diabólicos e imortais. Há dezenas de textos machadianos que podem ser lidos por crianças, na sua tenra e promissora idade. Professores, leiam Machado de Assis! Leiam Machado de Assis constante e insistentemente! Não fechem tantas portas e janelas já abertas por esse brasileiro tão espetacular do século XIX! Apresentem Machado de Assis às crianças brasileiras, agora!
A vida de quem não morre é apenas um brinde a todos os artistas, poetas e ficcionistas (cronistas, contistas e romancistas) que deixaram suas vidas, idéias, impressões, dúvidas, angústias, pesadelos, desejos, sonhos, em livros; livros que ficam tão bonitos nas mãos de quem gosta de ler, ama a esperança e espreita a liberdade, mesmo em vozes roucas e solitárias, provenientes de restos e escombros pós-modernos. Belas flores, do estrume, Brás Cubas?

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Priscila Yamany Medeiros Nasci no dia 08 de novembro de 1988, em São Miguel do Iguaçu. Meus pais se mudaram para o Paraguai; moramos lá pouco tempo, e viemos para Foz do Iguaçu, no dia em que completei um ano. Morei em vários bairros, em muitas casas. Estudei, durante a pré-escola no SESI, no primário na Escola Municipal João XXIII, durante o ensino fundamental, primeiro no Colégio Estadual Dom Pedro II e, a partir da 8ª série, no Ulysses Guimarães. Entrei na faculdade com 18 anos e hoje, com 19, estou no segundo ano de Letras Português-Inglês e trabalho como estagiária na mesma universidade, a UNIOESTE. No futuro, além de professora, pretendo tornar –me escritora, me envolvendo com a literatura e com o teatro, que são as minhas paixões. (priscilayamany@gmail.com)

Robson Fagundes dos Santos 20/06/1985 (Foz do Iguaçu/PR), acadêmico do 2º ano de Letras – Unioeste/Foz (schumbert_landler@hotmail.com)

Flaviana Demenech Nasceu em Medianeira (03/08/1989), vive em Santa Terezinha do Itaipu, cursa o segundo ano de Pedagogia na Unioeste/Foz do Iguaçu; trabalha na biblioteca da Instituição, faz iniciação cientifica a respeito das obras de Vygotski (flavi_sti@hotmail.com)

Celso Garcia Paula Junior Nasceu em 1980 na cidade de Foz do Iguaçu onde reside atualmente. Formado em Letras Português-Inglês pela UNIOESTE, em 2006, é acadêmico do curso de Letras Português-Espanhol pela mesma Universidade e pós-graduando da mesma instituição. Em seus escritos, busca externalizar sua admiração por sua incomparável musa inspiradora: a Literatura. È coordenador do grupo de literatura UTI - Unidade de Tratamento Intelectual (paulacel1@yahoo.com.br)
Carmen Barudi (que também atende por “Carmencita”) Nasceu em Foz do Iguaçu, no dia 23/02/83; é licenciada em Letras Português-Espanhol, pela Unioeste; revelação de Foz do Iguaçu, Prêmio Cataratas 2001, Categoria Poesia, uma das fundadoras e Presidente do Grupo Gauche de Literatura, grupo este que “nasceu” em 2006, Aguarda a publicação do seu primeiro livro de poemas, “Vozes da minha janela”. (cbarudi@hotmail.com)
Thiago Benitez, Nasceu no dia 07 de abril de 1988, em Foz do Iguaçu; sua mãe, Evangelista Benitez, viveu seus primeiros anos no Paraguai e seu pai, José Carneiro de Melo, é cearense; estudou no Colégio Estadual Três Fronteiras; em 2007, ingressou na Unioeste, para cursar a graduação de Letras Português/Espanhol; já no primeiro ano, começou a escrever poesias e ganhou o Concurso de Poesias no 1º Encontro Internacional de Letras, realizado na própria Unioeste. (thiago_benitez@hotmail.com)
Maria Carbonera Boschin Aposentada, fez parcos cursos regulares, ama plantas e flores, leitora leiga e apaixonada por Machado de Assis; na companhia do Guêguê, foi arrebatada por um outro homem, o que estava esperando por ela nas páginas espetaculares de livros como Dom Casmurro. Trabalha em Porto Alegre, mãe do Leonardo (médico ortopedista), Ricardo (médico anestesista) e Frederico (mestrando em Direito Internacional, Lisboa), avó do Rafael e Gustavo; ainda vai escrever um livro.

Beto Petry Escritor (lançou alguns livros de poemas e outros de diversos gêneros estão “no prelo”), compositor, Agente Educacional do PDE do Paraná, professor de Língua e Literatura da SEED, NRE de Foz do Iguaçu, Ensino Médio no Colégio Estadual Euclides da Cunha/ Matelândia/PR. Vencedor de vários prêmios de Literatura, entre eles o Prêmio Cataratas e Viagem Nestlé pela Literatura - 2001, pela Fundação Cultural Nestlé de SP/SP. (betopetry@brturbo.com.br)

José Afonso de Oliveira Nasceu em Santos/SP, em 18 de maio de 1949, especialista em Sociologia e em Educação Ambiental; é professor em Foz do Iguaçu, (afonsofoz@terra.com.br)

Márcio AF. Souza Nasceu em Belo Horizonte, no dia 11 de novembro de 1982. Em 1989, muda-se para Foz do Iguaçu (PR), com a família. Em 2003, ingressa no curso de Letras, na Unioeste/Foz do Iguaçu. Apresenta um trabalho acadêmico na UEM, no ano de 2004, intitulado “Letras que viram Poemas”. Em 2007, retorna a Belo Horizonte e transfere o curso para o UNI-BH. Entre 2003 e 2006, trabalhou como professor/ estagiário, professor particular de Língua Portuguesa, em Foz do Iguaçu. Escreve poemas, músicas, crônicas. Aguardam lançamento, “Ô Pai...” e “Conversa Fiada” - Crônicas (marcioafsouza@yahoo.com.br)
Martha Ribeiro Parahyba Professora de Literatura Brasileira, do Curso de Letras, da Uioeste; Mestre em Literatura Brasileira, pela Universidade de Brasília; Doutora em Educação, pela Unesp (martha.parahyba@hotmail.com).
José Nami Sobrinho Nascido em Arapongas - Paraná 02/02/53; professor de tênis, CREF 001483/PR; classificado no I Concurso de Poesias, Conto e Crônicas de Cruz Alta; em 1995, classificado entre os cinco primeiros no concurso de Contos e Poesias das Cataratas - Poesia Fábrica de Futuro; Revelação 2000 – “O prefeito” – Foz do Iguaçu – Prêmio Cataratas; Prêmio Cataratas 2006 – 1º lugar – Conto “Trajetória”; colaborador de revistas e jornais da cidade (nara_nami@hotmail.com).

Clara A.S.Cruz 25 de agosto 1937, Buenos Aires; Graduada em Letras; em 1967, no segundo semestre de Literatura Inglesa, foi aluna de Jorge Luis Borges; mestre em Literatura Portuguesa e doutora em Literatura Hispano-Americana - Unesp/Assis (claragustina@hotmail.com).

Humberto Guido Nasceu em Santo Antonio do Jardim e viveu os primeiros anos em Espírito Santo do Pinhal, cidades do interior do estado de São Paulo. Em 1988, concluiu o curso de graduação em Filosofia na Pontifícia Universidade Católica de Campinas, na década seguinte obteve o título de doutor em Educação na Universidade Estadual de Campinas (1999); recentemente concluiu o estágio de Pós-Doutorado em Filosofia na Universidade de São Paulo (2007-2008). Desde 1993, atua na docência e na pesquisa, inicialmente no Campus de Foz do Iguaçu/Unioeste; a partir de 1997, na Universidade Federal de Uberlândia. A sua produção acadêmica deu oportunidade para a publicação de vários artigos voltados para o estudo crítico da obra filosófica de Giambattista Vico (1668-1744), a quem dedicou também o livro Giambattista Vico: a filosofia e a educação da humanidade - Vozes, 2004; nos últimos anos escreveu alguns ensaios aproximando a Filosofia e a Literatura graças às incursões nas obras de Carlos Drummond de Andrade, Pedro Nava, Hilda Hilst e Machado de Assis. A sua última publicação é o livro voltado para o público infanto-juvenil: A arte de aprender. Metodologia do trabalho escolar para a educação básica -Vozes, 2008 (guido@ufu.br)
Antônio Gouveia pernambucano vivente no Paraná, é professor da Unicentro, Guarapuava.

Ildo Carbonera Nasceu na Linha Guabiroba, Sananduva/RS, em 1955, professor de Letras da Unioeste/Foz do Iguaçu; doutorando em Literatura Brasileira na UFRGS (2005-2008); ex-músico, compositor, autor de alguns livros, como A emboscada machadiana, Os animais não têm mais para onde ir, Alguém viu meu avô? e Como é um rio? Neste ano, lançamento do livro de crônicas Olha pra mim, o primeiro, de quatro, da série Eu era assim; depois virão 234 posições pós-modernas, As cidades e os asilos e Velhos textos presentes - I e II (ildocarbonera@gmail.com)